
1. O problema do pensamento é que ele não é material, não é físico. O pensamento é a emergência dos processos da computação viva cerebral sobre si mesma. Logo, ele não é uma "coisa", como as outras, uma coisa física. Enquadra-se mais no conceito de recursividade. Não constitui, com os outros seres de matéria, um ser de matéria - trata-se propriamente de um ser de organização, como os turbilhões, que não são nem a resistência ao fluxo de energia nem o próprio fluxo de energia, mas um sistema que emerge do encontro exato entre fluxo e resistência, não sendo nem um nem outro. Assim, o pensamento não é o cérebro - mas um sistema que emerge dos sistemas em que se constitui o cérebro.
2. Essa condição fez do pensamento alguma coisa tida como essencialmente diferente do corpo. Daí, dessa diferença, para o conceito de alma, fantasma, espectro, foi um pulo. Muito provavelmente - minha aposta - uma herança oriental, esse conceito formalizou-se em Platão, e ganhou o Ocidente. A noção de "alma", e uma alma essencialmente diferente do corpo, distante dele, inclusive na origem, tornou-se tão forte que se chegou a traduzir a expressão hebraica "garganta viva" para "alma vivente". Pronto: o Ocidente platonizou-se.
3. No século XIX, ao menos Nietzsche insurgiu-se contra a idéia. Apostaria que não vem dele a intuição, mas das ciências biológicas - as pesquisas em torno da Teoria da Evolução, por exemplo, comuns e famosas na época. Mas Nietzsche afirmou que a consciência era a última etapa da evolução orgânica. Dois mil e quinhentos anos depois de Platão, o platonismo é, aí, sepultado. Daí, para as Ciências Cognitivas, mais modernas, era/foi um "pulo" natural.
4. Pois bem. O mundo físico é a casa e a origem do pensamento. Salta-se do mundo físico para o mundo vivo e, daí, para o pensamento e a consciência. Ainda não se tratou suficientemente disso. Ainda se discute a distância entre a consciência e o real, como se ambos fossem de dimensões e essências diferentes - de mundos diferentes. O mito platônico ainda ocupa nossas consciências, quando o assunto é a "consciência". Mito por mito, vale mais remontar ao aristotélico, e considerar a metáfora mitológica do logos divino que está impregnado em tudo e todos - princípio de inteligibilidade do real... Ora, é o próprio real que está em tudo e em todos: inclusive em nosso pensamento, não apenas como "morada", mas como fundamento.
5. Deve-se abandonar, sim, a idéia ingênua de um modo divino de o pensamento humano apoderar-se do "real". Se há modos divinos, reservam-se aos deuses. Aos homens, o pensamento. Todavia, o pensamento é a atualmente última etapa do cômputo vivo, da capacidade de o ser vivo mapear eficiente, efetiva e eficazmente o ecossistema no qual vive e está inserido. Não há diferença substancial entre a capacidade da amaba mapear seu meio, para daí nutrir-se, e a capacidade humana de observar nebulosas planetárias. Em última análise, trata-se de níveis diferentes de sofisticação da mesma capacidade - "dialogar" com o mundo físico.
6. Logo, penso que as discussões em torno da "verdade" como metáfora estão deslocadas, bem como são anacrônicas. Deslocadas, porque se trata de pensar no novo com os olhos velhos - se não há verdade divina, só pode haver falsas verdades, logo, verdades metafóricas... Anacrônicas, porque o século XIX já deu lugar ao XX e, agora, adentramos o XXI. Deixemos que os velhos homens permaneçam na arapuca de pensar o novo com os códigos antigos. Trabalho perdido, mas pode-se viver bem disso, inclusive. Aos novos homens, pensar o novo com categorias novas. No fundo, as que estiveram sempre aí... o tempo todo!
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
2. Essa condição fez do pensamento alguma coisa tida como essencialmente diferente do corpo. Daí, dessa diferença, para o conceito de alma, fantasma, espectro, foi um pulo. Muito provavelmente - minha aposta - uma herança oriental, esse conceito formalizou-se em Platão, e ganhou o Ocidente. A noção de "alma", e uma alma essencialmente diferente do corpo, distante dele, inclusive na origem, tornou-se tão forte que se chegou a traduzir a expressão hebraica "garganta viva" para "alma vivente". Pronto: o Ocidente platonizou-se.
3. No século XIX, ao menos Nietzsche insurgiu-se contra a idéia. Apostaria que não vem dele a intuição, mas das ciências biológicas - as pesquisas em torno da Teoria da Evolução, por exemplo, comuns e famosas na época. Mas Nietzsche afirmou que a consciência era a última etapa da evolução orgânica. Dois mil e quinhentos anos depois de Platão, o platonismo é, aí, sepultado. Daí, para as Ciências Cognitivas, mais modernas, era/foi um "pulo" natural.
4. Pois bem. O mundo físico é a casa e a origem do pensamento. Salta-se do mundo físico para o mundo vivo e, daí, para o pensamento e a consciência. Ainda não se tratou suficientemente disso. Ainda se discute a distância entre a consciência e o real, como se ambos fossem de dimensões e essências diferentes - de mundos diferentes. O mito platônico ainda ocupa nossas consciências, quando o assunto é a "consciência". Mito por mito, vale mais remontar ao aristotélico, e considerar a metáfora mitológica do logos divino que está impregnado em tudo e todos - princípio de inteligibilidade do real... Ora, é o próprio real que está em tudo e em todos: inclusive em nosso pensamento, não apenas como "morada", mas como fundamento.
5. Deve-se abandonar, sim, a idéia ingênua de um modo divino de o pensamento humano apoderar-se do "real". Se há modos divinos, reservam-se aos deuses. Aos homens, o pensamento. Todavia, o pensamento é a atualmente última etapa do cômputo vivo, da capacidade de o ser vivo mapear eficiente, efetiva e eficazmente o ecossistema no qual vive e está inserido. Não há diferença substancial entre a capacidade da amaba mapear seu meio, para daí nutrir-se, e a capacidade humana de observar nebulosas planetárias. Em última análise, trata-se de níveis diferentes de sofisticação da mesma capacidade - "dialogar" com o mundo físico.
6. Logo, penso que as discussões em torno da "verdade" como metáfora estão deslocadas, bem como são anacrônicas. Deslocadas, porque se trata de pensar no novo com os olhos velhos - se não há verdade divina, só pode haver falsas verdades, logo, verdades metafóricas... Anacrônicas, porque o século XIX já deu lugar ao XX e, agora, adentramos o XXI. Deixemos que os velhos homens permaneçam na arapuca de pensar o novo com os códigos antigos. Trabalho perdido, mas pode-se viver bem disso, inclusive. Aos novos homens, pensar o novo com categorias novas. No fundo, as que estiveram sempre aí... o tempo todo!
OSVALDO LUIZ RIBEIRO