1. Sim, sim - é mais uma implicância minha, dentre as muitas, com a "pós-modernidade", mais precisamente naquele seu quesito da não-fundacionalidade do "conhecimento", proposição estabelecida axiomaticamente por meio de decisão lingüístico-mitológica comunitário-arbitrária - bem, se não há fundamento, não foi com base em "fatos" que se determinou o consenso, quero concluir... Assim se chegaria a curar a AIDS! Quem vota? Eu, eu, eu, pronto, axiomatizada a cura da AIDS... Cura de que, mesmo?...
2. Ironia à parte, quero refletir um pouco sobre uma informação de Edgar Morin - dada em O Método 3 - o conhecimento do conhecimento, cujo propósito é re-fundar o conhecimento na matéria viva, logo, no corpo, antes que num conceito platônico de ectoplasma incorpóreo, anímico, teológico, mitológico - qualquer que seja ele. O fantasma do conhecimento não-sensorial, não corporal, não-biológico, é tão assustador e eficiente que, ontem ainda, possuía a mente de Descartes - "penso, logo, existo...". "Pensa"? Quê? Tu? Sem tuas mitocôndrias?
3. Eis a informação, extraída do capítulo "2. A animaidade do conhecimnto" de O Método 3:
3.1 "Nosso tecido nervoso, como nossa pele, diferencia-se a partir de uma região da membrana externa do embrião ou do ectoderma. Significa que se formou, filogeneticamente, a partir das interações com o mundo exterior. Efetivamente a formação dos sistemas nervosos, ao longo das diversas evoluções animais, é inseparável das ações e reações no interior de um meio ambiente, e os desenvolvimentos cerebrais são inseparáveis da locomoção rápida, da busca, do ataque e da defesa, ligados à procura do alimento protéico, originária da incapacidade animal de captar a energia solar" (p. 63).
3.2 Uma nota 17, apensa ao texto, remete ao seguinte esclarecimento, mais técnico: "as primeiras divisões do ovo depois da fecundação transformaram-no numa espécie de esfera (blástula) que se transformará rapidamente num embrião (gástrula) atravessado por um 'tubo digestivo primitivo' e recoberto de uma camada de células (ectoderma) que o delimita física e fisiologicamente do seu meio. É a partir da região ântero-dorsal desse ectoderma que começa, no vertebrado, a formação de uma calha rapidamente fechada num tubo (tubo neural), num primeiro esboço dos centros encefálicos e medulares" (p. 264).
4. Essa é uma informação carregada de implicações para a Epistemologia Cognitiva - diante do que o não-fundacionalismo não tem a menor sustentação teórica. A membrana da qual se origina tanto a pele quanto o sistema nervoso humano - inclua-se, não se vá esquecer, aí, o cérebro! - é a parte responsável pela delimitação do ovo, da célula, da blástula, com o meio externo/ambiente. Essa membrana, portanto, de um lado, promove a diferenciação do ser vivo, separando-o fisicamente do meio, e, de outro, proporcionando à célula viva os mecanismos e instrumentos de interagir com esse meio - a "computação viva", incluídas aí a alimentação, a excreção, a locomoção, a respiração etc. (para um exemplo de "interação" da membrana na função alimentar [fagocitose], cf. Perseguição em alta velocidade).
5. A membrana celular está diretamente relacionada, assim, ao, movimento do ser vivo em direção ao meio externo, seja a sua própria locomoção nele, seja a sua interação sensorial operada nele. Ir lá fora e trazer para aqui dentro - digamos assim. Isso já requer capacidade de "computação" - capacidade química de identificação do meio e de tratamento da informação aí disponível. É de comer?
6. Nos animais superiores, contudo, especialmente nos vetebrados, a computação viva torna-se cada vez mais complexa, de modo que se torna necessária uma cada vez mais complexa estrutura - seja de captação dos insumos do meio, seja de sua prospecção (sentidos e aparelho locomotor/coletador), bem como, obviamente, de operação das rotinas de tratamento dessas informações - "computação" viva.
7. No Homo sapiens, a especialização cerebral é incomparável. O que era "computação" (e permanece sendo "computação"), evolui para a "cogitação" (consciência, pensamento, linguagem). Ora, o pensamento, a consciência, a linguagem - são desdobramentos/emergências "naturais" daquele mesmo tecido nervoso que, por sua vez, desdobrara-se daquela mesma membrana blastular. Isso sginficia que o pensamento, conquanto possa voar até o Sol - como Ícaro! - tem a função primária de tratar o meio ambiente - o real! 0- com o objetivo primáro de... manter-me vivo!
8. Ora, o fundamento da vida é a sua instalação eficiente no meio ecossistêmico. A membrana blastular dá ao ovo (assim como a membrana celular dá à célula) a capacidade de se individuar do meio, e de emergir como sujeito vivo - conquanto não sujeito de si. O pensamento humano, a sua faculdade cognitiva, está diretamente ligada àquela função necessária da computação do meio, logo, seu fundamento encontra-se lá fora, no real. Ao contrário, mas muito ao contrário do que postulava Platão, que cnsiderava a matéria e os sentidos ineficientes para o "conhecimento", o próprio conhecimento humano é uma emergência da estrutura bio-orgânica de tratamento vivo do real.
9. A despeito da rotina hermenêutica que intermedia o pensamento humano e o real, somente se pode desconsiderar o real como fundamento da validade heurística e epistemológica desse pensamento ao custo da desmembranização do homem, de seu desenvelopamento, e, com isso, sua dissolvição - seja num solipsismo estético, seja num misticismo lingüístico. De fato, o homem que decide pensar descoladamente do real, aliena-se. Se, de fato, de verdade, o fizer, morre. Cpmo nenhum não-fundacionalista morre de não-fundacionalismo (Rorty não morreu por seu não-fundacionalista, se é que morreu, se é que existiu! Aliás, qual a diferença entre Rorty e o Gasparzinho?), segue-se que não existe nenhum verdadeiro não-fundacionalista, e que os discursos não-fundacionalistas são isso, diversão de meia dúzia e política de outro tanto. Na hora h, quando a vida reclama, curvam-se, inexoravelmente, à condição primária de toda célula e de toda blástula- agarram-se à vida. Se não enganfinharem o real, e vida, engaalfinha-os o real, na morte, de qualquer jeito...
10. O que sugere que o não-fundacionalismo gravita entre alguma coisa políica e lúdica: uma zombaria, para atazanar a vida de quem os leva a sério - eu, por exemplo -, ou estratégia para conseguir, por meio desse artifício prestidigital, vantagens que, na vida concreta, na interface com o real, não detêm nem de outro modo deteriam. Razões inconfessáveis? Ou meramente equívoco platônico - nesse caso, consideravelmente anacrônico?
"A consciência é a última fase da evolução do sistema orgânico, por consqüência também aquilo que há de menos acabado e de menos forte neste sistema" (NIETZSCHE, A Gaia Ciência, Aforismo 11).
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