segunda-feira, 13 de abril de 2009

(2009/166) Religião sob o filtro crítico-científico


1. O leitor que freqüenta assiduamente Peroratio há de, eventualmente, pegar-se surpreendido de, às vezes, falar-se sobre religião e, às vezes, de ciência. É que os três redatores do blog são, ao mesmo tempo, "religiosos" e "crítico-científicos". Eu, por exemplo, que agora escrevo esse post, encontro-me numa fase que, sob o olhar tradicional da religião tradicional, é mais crítico-científica do que religiosa. Não é de todo equivocado o diagnóstico, ainda que, sob os critérios em que eventualmente ele seja desenvolvido, torne-se falso.

2. É que eu cheguei à conclusão que não há qualquer razão legítima - isto é, em face da minha própria consciência - para que a religião não se deixe passar pelo crivo crítico-científico. Não vejo qualquer razão - em face de minha própria consciência - para que a religião permaneça empregando não apenas argumentos mitológicos para a sua legitimação, mas permaneça no próprio universo mitológico.

3. Eu lamento profundamente que não apenas religiosos, mas aparentes pesquisadores (são, aí, religiosos tradicionais praticando pesquisa controlada pela tradição?) não apenas defendam o discurso pseudo-epistemológico da religião, mas ainda relativizem, quando não desprezam, a perspectiva crítico-científica.

4. É desalentador, porque se nem os pesquisadores, interessados em religião, conseguem superar a mitologia discursiva das religiões, como esperar que os sacerdotes o façam, justo eles que se beneficiam diretamente daquele paradigma? E esperar como que a massa o faça, justo ela, que teme e treme, não tanto de Deus, mas de seus representantes?

5. Eu gostaria de acreditar na possibilidade histórica da transformação da religião, de sua conversão honesta, enquanto religião, aos critérios epistemológicos do saber crítico-científico. A religião transformar-se-ia. Nunca mais seria a mesma, nem elas, nem os religiosos.

6. Se ela acabaria? Duvido. Nem gostaria. O que acabaria, imagino, é a tendência da massa a deixar-se manipular por promessas alienantes, que toleramos às massas, com condescendência, num gesto de superioridade intelectual aristocrática, dói confessá-lo?, cínica. Mas não vejo por que a religião desapareceria enquanto, por exemplo, uma estética consciente, uma política consciente, alimentadas ambas, com sobriedade, por uma perspectiva crítico-científica que permitiria lucidez às práticas religiosas.

7. Fiquemos combinados, então. Quando, aqui, se escrever sobre religião, pretende-se que se lhe faça passar necessariamente pelo crivo da crítica científica, sem, contudo, necessariamente, desintegrá-la, mas, por outro lado, necessariamente, forçando-a a uma transformação compatível com o regime do saber emancipado das ciências - auto-conhecimento religioso não é auto-conhecimento promovido pelo mito da religião, mas auto-conhecimento que o religioso tem de si, na condição de religioso, sob a perspectiva crítico-científica.


OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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