1. Não, não se trata do nome de um robô de jogos de PC ou de filmes de ficção científica, conquanto o termo sirva para designar uma grandeza de que muito poucas pessoas no planeta têm ciência. Trata-se do gene responsável pela faculdade "humana" da linguagem. Há pessoas - raras - no planeta que têm distúrbios sérios de linguagem, porque têm defeitos congênitos nesse gene. Por conta do defeito, o cérebro não consegue proporcionar meios eletro-mecânico-hormonais para a articulação da idéia-linguagem-fala.
2. Desde essa informação, gostaria de abrir três frentes. A primeira, "quentíssima", e ainda muito embrionária, demandando, ainda, muitas pesquisas, é aquela aberta também muito recentemente pelo Instituto Max Planck, em Leipzig, Alemanha. Descobriu-se a presença desse gene - da linguagem - em um osso/fóssil de Neardenthal (como resultado da tentativa de mapeamento do genoma da espécie - cf. a comparação entre um esqueleto Neardenthal e o de um espécime Homo sapiens na figura à direita). Ora, essa descoberta traz conseqüências muito importantes para a antropologia evolutiva, porque, nos termos em que se expressa a Dra. Johannes Krause, "não há qualquer razão para pensar que os homens de Neandertal não podiam falar". Imaginava-me, e, agora, parece que a hipótese deverá ser brevemente descartada, que a capacidade de linguagem, logo, de "fala", era atributo do homem moderno - Homo sapiens. Pelo jeito, não, não era. [para hipótese de transferência de também outros genes do Neardenthal para o Homo sapiens, cf. aqui; para estudos a respeito da capacidade de articulação da fala do Neardenthal, cf. aqui/aqui].
3. Explica-se que a espécie Neardenthal possa ter desenvolvido a capacidade da fala/linguagem devido a sua estratégia de caça, necessariamente coletiva, o que demandava a necessidade de comunicação para distribuição de tarefas, papéis e táticas. Estuda-se a hipótese da miscigenação entre a espécie Homo sapiens e os Neardenthais (relações sexuais), o que teria acarretado a transferência do gene de uma espécie para a outra - cogita-se: do Neardenthal para o Homo sapiens. Seja como for, ainda é cedo para qualquer afirmação categórica, parece que o reinado soberano do Homo sapiens está com os dias contados.
4. A segunda frente que desejo abrir é na direção da discussão acerca da linguagem. Ora, tem-se insistentemente, nas últimas décadas, desde pelo menos Heidegger, proposto uma "estrutura" metafísica da linguagem, como se ela fosse uma espécie de "ser" que se manifestasse no "homem" - a "linguagem" falaria no homem, por assim dizer. Na prática, uma ontologia de recorte platônico-estruturalista (em Heidegger isso soa paradoxal!), pousada, agora, não mais na metafísica mitológica, mas na metafísica da linguagem. Ora, FOXP2 parece colocar os nossos pés, de novo, no chão - só há linguagem humana (e, agora se começa a descobrir, também [pelo menos!] Neardhental), porque há um gene que permite a articulação de faculdades motoras/elétricas/hormonais no cérebro humano, as quais capacitam-no para a articulação de idéias/conceitos expressos lingüisticamente. Assim como as mitocôndrias reduzem o "cogito ergo sum" de Descartes a uma atitivade biológica e secundária, FOXP2 reduz a linguagem - enquanto capacidade humana - à condição de emergência biológica. Não há platonismo que resista à pesquisa não-disjuntiva.
5. Finalmente, retrucar, numa terceira frente, relacionada à anterior, que não é o gene quem controla a linguagem - como Richard Dawkins poderia ser tentado a argumentar (cf. A Escalada do Monte Improvável). FOXP2 tão-somente faculta - e isso não é pouco! - a linguagem. Ela potencializa a espécie. Ela equipa a espécie. O uso do equipamento, da faculdade, da potência, contudo, demanda cultura, demanda história, demanda sociedade, demanda construções noológicas, cosmovisões, valores, conceitos, coordenadas, símbolos, e nada disso é geneticamente controlado - é culturalmente construído. De modo que não se pode escolher ou entre o gene ou entre a cultura: um sem o outro não tem expressão. Reduzir o ser humana ou ao gene ou à cultura é um retorno injutificável ao princípio disjuntivo matéria/pensamento.
6. A disjunção corpo e alma, matéria e espírito, sistematizada por Platão há dois mil e quinhentos anos, assumida por judeus-alexandrinos e cristãos há mais ou menos dois mil anos, revivida recentemente num cartesianismo em dores de parto, começou a ruir no século XIX (cf. o aforisma 11 de A Gaia Ciência, de Nietzsche) e levou o golpe fatal com o surgimento das pesquisas cognitivas mais recentes. Até mesmo a linguagem vai sendo tomada aos anjos, e entregue ao corpo humano. Mais cedo ou mais tarde estaremos definitivamente entregues a esse novo paradigma cultural que, inequivocamente, proporcionará uma transformação planetária sem precedentes - para todos os fins, é o corpo quem pensa, é o corpo quem fala, é o corpo quem vive. E nisso não estávamos sós, nem fomos os primeiros...
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
2. Desde essa informação, gostaria de abrir três frentes. A primeira, "quentíssima", e ainda muito embrionária, demandando, ainda, muitas pesquisas, é aquela aberta também muito recentemente pelo Instituto Max Planck, em Leipzig, Alemanha. Descobriu-se a presença desse gene - da linguagem - em um osso/fóssil de Neardenthal (como resultado da tentativa de mapeamento do genoma da espécie - cf. a comparação entre um esqueleto Neardenthal e o de um espécime Homo sapiens na figura à direita). Ora, essa descoberta traz conseqüências muito importantes para a antropologia evolutiva, porque, nos termos em que se expressa a Dra. Johannes Krause, "não há qualquer razão para pensar que os homens de Neandertal não podiam falar". Imaginava-me, e, agora, parece que a hipótese deverá ser brevemente descartada, que a capacidade de linguagem, logo, de "fala", era atributo do homem moderno - Homo sapiens. Pelo jeito, não, não era. [para hipótese de transferência de também outros genes do Neardenthal para o Homo sapiens, cf. aqui; para estudos a respeito da capacidade de articulação da fala do Neardenthal, cf. aqui/aqui].
3. Explica-se que a espécie Neardenthal possa ter desenvolvido a capacidade da fala/linguagem devido a sua estratégia de caça, necessariamente coletiva, o que demandava a necessidade de comunicação para distribuição de tarefas, papéis e táticas. Estuda-se a hipótese da miscigenação entre a espécie Homo sapiens e os Neardenthais (relações sexuais), o que teria acarretado a transferência do gene de uma espécie para a outra - cogita-se: do Neardenthal para o Homo sapiens. Seja como for, ainda é cedo para qualquer afirmação categórica, parece que o reinado soberano do Homo sapiens está com os dias contados.
4. A segunda frente que desejo abrir é na direção da discussão acerca da linguagem. Ora, tem-se insistentemente, nas últimas décadas, desde pelo menos Heidegger, proposto uma "estrutura" metafísica da linguagem, como se ela fosse uma espécie de "ser" que se manifestasse no "homem" - a "linguagem" falaria no homem, por assim dizer. Na prática, uma ontologia de recorte platônico-estruturalista (em Heidegger isso soa paradoxal!), pousada, agora, não mais na metafísica mitológica, mas na metafísica da linguagem. Ora, FOXP2 parece colocar os nossos pés, de novo, no chão - só há linguagem humana (e, agora se começa a descobrir, também [pelo menos!] Neardhental), porque há um gene que permite a articulação de faculdades motoras/elétricas/hormonais no cérebro humano, as quais capacitam-no para a articulação de idéias/conceitos expressos lingüisticamente. Assim como as mitocôndrias reduzem o "cogito ergo sum" de Descartes a uma atitivade biológica e secundária, FOXP2 reduz a linguagem - enquanto capacidade humana - à condição de emergência biológica. Não há platonismo que resista à pesquisa não-disjuntiva.
5. Finalmente, retrucar, numa terceira frente, relacionada à anterior, que não é o gene quem controla a linguagem - como Richard Dawkins poderia ser tentado a argumentar (cf. A Escalada do Monte Improvável). FOXP2 tão-somente faculta - e isso não é pouco! - a linguagem. Ela potencializa a espécie. Ela equipa a espécie. O uso do equipamento, da faculdade, da potência, contudo, demanda cultura, demanda história, demanda sociedade, demanda construções noológicas, cosmovisões, valores, conceitos, coordenadas, símbolos, e nada disso é geneticamente controlado - é culturalmente construído. De modo que não se pode escolher ou entre o gene ou entre a cultura: um sem o outro não tem expressão. Reduzir o ser humana ou ao gene ou à cultura é um retorno injutificável ao princípio disjuntivo matéria/pensamento.
6. A disjunção corpo e alma, matéria e espírito, sistematizada por Platão há dois mil e quinhentos anos, assumida por judeus-alexandrinos e cristãos há mais ou menos dois mil anos, revivida recentemente num cartesianismo em dores de parto, começou a ruir no século XIX (cf. o aforisma 11 de A Gaia Ciência, de Nietzsche) e levou o golpe fatal com o surgimento das pesquisas cognitivas mais recentes. Até mesmo a linguagem vai sendo tomada aos anjos, e entregue ao corpo humano. Mais cedo ou mais tarde estaremos definitivamente entregues a esse novo paradigma cultural que, inequivocamente, proporcionará uma transformação planetária sem precedentes - para todos os fins, é o corpo quem pensa, é o corpo quem fala, é o corpo quem vive. E nisso não estávamos sós, nem fomos os primeiros...
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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