quarta-feira, 18 de maio de 2011

(2011/294) De Marcel Detienne, uma "pista" para entender, desde Weber, o uso do termo "racionalidade" como discurso intersubjetivo



1. Até onde pude ir - até agora - Weber é o promotor do tratamento da "racionalidade" como a dimensão do discurso intersubjetivo. Logo, fica de fora o "real", e, mesmo quando ele entra aí, entra na forma de "discurso intersubjetivo sobre o real" - ou seja, faz que entra, mas não então nunca... Se desejam "fonte", digamos que baste ir ao Raymond Aron, em As Etapas do Pensamento Sociológico.

2. Eu não tenho nenhuma simpatia por essa definição de racionalidade. Meu coração bate forte naquela tradição crítico-racionalista, e, hoje, em Morin, onde, a despeito de uma profunda consideração pela intersubjetividade, começa sua coleção pela Física e, depois, pela Biologia, para, passando, aí sim, pelas Idéias e pelo Conhecimento, chegar, então, ao Homem - filho do real e das idéias: mas vindo de lá, do real, de onde também elas vêem.

3. Pois bem: quis a vida que eu fosse aportar num ambiente onde a definição de racionalidade como discurso intersubjetivo supere toda e qualquer tentativa de trazer de volta a conversa para o mundo real, para o ecossistema. Sendo assim, identificando um "problema", ponho-me a caminho da pesquisa pelo entendimento dessa situação. Por que tanta diferença entre duas definiçções da mesma palavra: racionalidade...

4. E acho que achei uma pista em Detienne, historiador que, eu sei, é difícil de acompanhar, porque, além de irônico, considera que sempre sabemos do que ele está falando - o que nem sempre é o caso: mas, se você está interessado, que corra atrás... Em Os Gregos e Nós, eis suas palavras:
"Por sua nova função, que é fundamentalmente política, em relação à agora, o logos, palavra e linguagem, torna-se um objeto autônomo, submetido às suas próprias leis. Dois grandes caminhos se abrirão à reflexão sobre a linguagem. De um lado, o logos, como instrumento das relações sociais: como age sobre outro? Retória e sofística analisarão as técnicas de persuasão, desenvolverão a análise gramastical e estilística do novo instrumento. Ao passo que a outra via, explorada pela filosofia, abre-se sobre o logos como meio de conhecimento do real: é a palavra o real, todo o real? E o que ocorre com a realidade expressa pelos númewros, a que os matemáticos e geômetras descobrem?" (Marcel Detienne, Os Gregos e Nós - uma antropologia comparada da Grécia antiga, Loyola, p. 79).
5. Aí me parece estar a chave para a compreensão de onde caímos, nesse século XX - estamos diante do desdobramento - ainda? - daquelas duas vias. A ironia é que, hoje, é a Filosofia a campeã da via que, antes, era da Retórica. É hoje a Filosofia a usar o termo "racionalidade" não como um olhar sobre o real, mas como um olhar sobre os discursos intersubjetivos - é aí que se busca a "verdade", a "racionalidade": na linguagem, na comunidade. Aí, até a religião é "racional".

6. Quando emprego o termo "racionalidade", não estou preocupado em como ela age sobre outros - e age, eu sei. Mas, para meu interesse, "racionalidade" é aquela dimensão de debruçamento sobre o real: não é nem deve ser - e se se comporta como, trai-se, falsifica-se - política: deve ser pesquisa, radical compromisso com o real, ainda que, saibamos, na luta inexorável contra a alucinação da "razão".



OSVALDO LUIZ RIBEIRO

Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Sobre ombros de gigantes


 

Arquivos de Peroratio