sexta-feira, 27 de março de 2009

(2009/116) Iluminismo, Éden e autonomia


1. Haroldo, na esteira de sua postagem, penso que a ponte que você fez entre Éden e Iluminismo seja provavelmente perfeita. A meu ver, a tradução corrente "conhecimento do bem e do mal" está equivocadamente contaminada pela "moralina" teológica, como se o "pecado", contra o qual o texto, sacerdotal (dato-o no século V, no mesmo momento da invenção/promulgação do "sacrifício substitutivo" no Templo de Jerusalém), se insurje fosse da ordem da "moral" - para mim, a tradução deve ser "conhecimento do (que é) bom e do (que é) mau", ou seja, a capacidade de a própria pessoa, por si mesma, decidir o que é bom ou mau, o que lhe convém ou não, o que lhe interessa ou não, o que ela quer e o que ela não quer - numa palavra, ser comos os deuses!. Ora, essa atitude é tudo quanto um sacerdote não pode, sob nenhuma circunstância, aceitar. Como disse Menocchio, em O Queijo e os Vermes, eles não querem que nós saibamos...

2. Nesse sentido, não me encanta tanto o Iluminismo por conta de seu compreensível, mas, ainda assim, equivocado (e já corrigido [cf. Morin]) "endeusamento" da razão, quanto por sua ênfase justamente nessa ousadia, nessa coragem, nessa autonomia.

3. É muito pertinente observarmos que, lá, no Éden, porque homem e mulher querem (segundo minha hipótese histórico-social) autonomia em face de "Yahweh" (não sejamos ingênuos, em face do Templo!), e, por isso, são expulsos da presença de Yahweh, ali, naquele furacão avassalador que foi o século XIX (que começa em Kant!) são os homens e as mulheres quem expulsam "Deus" (não sejamos levianos - a Igreja e a Coroa), conforme bem descreveu Zaratustra. A sociedade republicana, pós-iluminista e pós-romântica é a sociedade que, depois de dois mil e quinhentos anos, assume a coragem de mandar às favas a autoridade falaciosa de homens e mulheres que se pretendem acima dos demais - e para isso se servem do mito. Nesse sentido, não acredito que um Empirismo e um Iluminismo resolvessem, por si sós, a questão, sem uma Revolução Francesa, porque, com ou sem violência, era imperioso - ainda o é - que "o último rei seja enforcado nas tripas do último padre".

4. Nesse senido, Haroldo, Karl Barth, o Vaticano I e o movimento The Fundamentals, nos Estados Unidos da América, todos esses, contemporâneos entre si, fenômenos de reação contra aquela autonomia irrefreável, constituem a encarnação reacionária dos querubins que guardam a entrada do Éden - a teologia quer o Mundo, menos a autonomia humana.

5. Obrigado por mais essa postagem.


OSVALDO LUIZ RIBEIRO

Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Sobre ombros de gigantes


 

Arquivos de Peroratio