sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

(2015/078) Um caso - duas lições

Há dez ou doze anos atrás, era eu coordenador do curso de teologia no STBSB, no Rio, e Israel Belo era Diretor. No dia da formatura, na hora da formatura, chega um ônibus lotado de um povo de São Paulo - formando, pais, gente da igreja, um mundo...

O nome dele não está na lista de aptos... Não pode se formar.

O pai, coitado, entra em desespero. Quer "bater" no Diretor. A culpa é sempre dos outros...

Israel não lidava com nada disso. Era eu. Mas ele é a Instituição. Não, seu filho não pode se formar. Por quê? Chamam-me. Osvaldo, que houve? Quem é o aluno, Israel? Fulano. Ah, sim, lamento, mas deve, "só", 42 disciplinas.

O quê?

Deve 42 disciplinas.

O pai dá um ataque. Impossível. Erro da Instituição, é Brasil e coisas do gênero. Israel, calmo por fora, um vulcão por dentro, me olha: Osvaldo, segura a informação? Pode apostar sua vida, Israel. Pai, sinto muito, diz Israel, seu filho não pode se formar.

Não se formou.

Não quero falar do caso. Um daqueles que na superfície são modelares, mas, por dentro, frangalhos, aparências, medos horrorosos, dor...

Mas eu me lembro daquele momento da relação entre Israel e eu. Eu sabia da responsabilidade que eu tinha e de como o Diretor está na mão das informações dos subordinados. Ele não tinha como saber - só tinha como confiar em mim. Mas eu tinha como saber. Eu não havia terceirizado a tarefa - eu a havia feito. Eu sabia.

Trabalhar eu penso que é isso: assumir responsabilidade, fazer direito, não falhar com quem depende de você.

Naquele dia, dormi feliz.

No dia seguinte, quando descobri os problemas daquela família, fiquei triste. Uma semana depois, quando refiz todo o levantamento e mostrei aos pais que o aluno não havia concluído praticamente metade das disciplinas, tive de conversar sério com pai e mãe. Por que o menino preferiu, sabendo no que ia dar, deixar o ônibus lotar de gente da igreja, percorrer 800 quilômetros e ir na direção da desgraça pública, a contar para os pais a real situação?

As relações humanas são simples. Como os humanos lidam com elas é que é um poço sem fundo, um risco interminável de problemas.











OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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