1. Aula de Pós-Graduação (lato senso) em Ensino Religioso. A disciplina foi montada por terceiros - eu só fui indicado para lecionar. Há uma disciplina "par", anterior: Religião, Modernidade e Desencantamento. Essa é Religião, Pós-Modernidade e Re-encantamento.
2. Sendo bem sintético.
3. Não houve desencantamento algum. A religião não desapareceu de nenhum lugar do planeta nos últimos cento e cinquenta anos, digam os livros o que quiserem dizer. Não sumiu no Brasil - na América do Sul, nem na África, nem na Ásia, nem na Oceania.
4. Tese de livro. Só de livro. Na Europa, houve? Não. No norte, houve alguma alteração da percepção religiosa, mas não houve "desencantamento". Houve bolsões em que o discurso do desencantamento circulou - mas eram bolsões universitários e seus satélites.
5. O que houve foi a crítica acadêmica da religião. Marx, Freud e, o maior de todos, Feuerbach. Religião é ópio e neurose. A academia, a-religiosa e com certa aversão à religião, tratou a religião como epifenômeno - uma espuma sobre as águas. Não está li: se disse - só o ópio e a neurose.
6. De fato. Concordo que seja ópio e neurose. Mas não significa que não esteja lá. Esteve, está e estará por imprevisíveis séculos.
7. Mas a academia desconsiderou a religião. A Europa, principalmente. Logo, é como disse o Antonio Carlos Magalhães do Jornal Nacional: se não passa no JN, não existe, não aconteceu. Se a academia não enxerga a religião, não existe a religião: o mundo desencantou-se.
8. Isso foi repetido seiscentas e doze vezes. A leitura que a modernidade fez da religião - e a leitura me parece adequada - substitui, todavia, a própria realidade.
9. Aí, a modernidade foi ferida. Escreveram-se dezoito mil e treze livros de Pós-Modernidade: a nova vedete da literatura "especializada". A Pós-Modernidade matou a Modernidade - matou nada, mas onde a palavra "pós-modernidade" é proferida, a modernidade é enfiada na gaveta.
10. Enfiada a modernidade na gaveta pelo mantra da pós-modernidade, os olhos voltaram a ver o que sempre esteve aí. Mas como se dizer isso de um jeito menos desairoso? Dizer que a religião... voltou.
11. Voltou coisa é nenhuma. O que nunca foi embora não pode voltar. Esteve aí, o tempo todo, como diz a Pitty: eu estava aqui o tempo todo só você não viu...
12. Não é por outra razão que os teólogos confessionais que escrevem como se fossem acadêmicos louvam a pós-modernidade...
13. Por quê? Porque a pós-modernidade destruiu toda a separação lúcida e sã entre conhecimento, fé, opinião, tudo é racionalidade, agora: um teólogo da Universal é a mesma coisa que um físico nuclear - chamem os dois para um congresso!
14. Nesse estado deplorável de coisas, a religião recupera seu discurso, que não pode mais ser criticado pela modernidade, porque a modernidade foi assassinada pela pós-modernidade. Falar em alienação, neurose, ópio, só sendo velho, anacrônico e gagá...
15. Minha opinião é que isso é uma desgraça civilizatória.
16. Bem entendido - não me refiro ao retorno da religião, porque ela nunca se foi. Me refiro à permanência do auto-discurso da religião sobre si mesma e a defesa que ela pode fazer, apelando para a pós-modernidade que lhe dá o "direito" de ir à praça pública e pedir a palavra sobre tudo e qualquer coisa, quando ela não sabe é coisa alguma, porque não é ciência.
17. Logo se vê que aceito - e mantenho - a distinção moderna entre saber, sentir e querer, entre heurística, estética e política. A Pós-modernidade, não. Astrologia, Astronomia e Teologia são todos discursos equivalentes, como Alquimia e Química!
18. Fazer o quê?
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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