sexta-feira, 6 de abril de 2012

(2012/365) Da idealização de pessoas, de sua instrumentalização

1. Há algum tempo tenho pensando sobre isso: a idealização de pessoas.

2. Idealizam-se pessoas. É um risco. E comum. Não é só o que ocorre, mas é mais comum do que se pode imaginar.

3. Onde quer que se trabalhe com pessoas, onde as pessoas são "fim", há o risco de serem idealizadas.

4. Idealizam-se "ovelhas" de igreja, alunos, moradores de comunidades, de rua, índios, favelados e por aí vai.

5. Quando ocorre a idealização, dá-se a desmaterialização da pessoa. Quem pratica a idealização não lida mais com o sujeito de carne e osso, mas lida com a sua própria idealização. Quando olha para a pessoa de carne e osso, toma-o por aquela idealização que criou e que acalenta.

6. Isso abre as portas daquele armário terrível: a instrumentalização. Porque a idealização da pessoa tem a ver com o projeto em que se está engajado: de igreja, de ação social, de educação.

7. O projeto toma o lugar da pessoa, já idealizada, de sorte que o "agente" passa a esforçar-se para que a sua idealização acomode-se a seu projeto, à sua "utopia".

8. Trata-se de uma instrumentalização eventualmente "para o bem". É o que o agente pensa. É assim que ele esconde de si mesmo a manipulação que pratica, a de-subjetivação do indivíduo. O sujeito para a ser uma peça de lego, e a coisa toda transforma-se num jogo de montar, que o agente opera em seu sonho de intervenção social, de transformação.

9. É um risco.

10. Também pelo fato de que o sujeito sob a ação do agente encontra-se, de alguma forma, num andar abaixo. O agente entende que o sujeito sob sua ação não pode, por ele mesmo, construir sua própria utopia, seu próprio caminho - e, assim, mais uma vez, esconde-se sob os olhos do agente a sua manipulação.

11. Há algo de verdadeiro aí. Se faltam informações, se falta formação, a condição do sujeito de auto-determinação está prejudicada. Óbvio. É a crítica de Saviani a Paulo Freire. Não se pode imaginar que do nada o sujeito construa a sua utopia - ele precisa de tijolos e de aprender a técnica de pôr uns sobre os outros - daí que há muita validade teórica na crítica da educação histórico-crítica de Saviani, eu penso.

12. Todavia, a libertação e a educação desse sujeito não podem se dar em separado - deve ser uma educação, uma intervenção social que, ao mesmo tempo, forme, informe e promova as condições de liberdade.

13. Não é tarefa fácil.

14. Nem suprime os riscos.



OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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