1. Sinto, nesse momento, uma necessidade profunda de ser grato àqueles que, a despeito de mim, de meu jeito, sentem-se, de algum modo, amigos e próximos, ou, quem sabe, desejosos de tanto. Agradeço-os, sinceramente. Onde quer que estejam. [Aqui, transformo, e penso que meu coração de fato já mudou, nesses minutos, transformo um sentimento de afronta pessoal, acintosa, telemática, em impulso positivo].
2. Não sou um amigo fácil. A rigor, não sou aquilo a que se poderia socialmente classificar de amigo. Sou fechado dentro de mim mesmo - mas isso é resíduo da infância. Sou severamente crítico - isso é posição epistemológica, quase patológica. Sou alguém que coloca o discurso das pessoas - escrito, proposto, publicado - acima das relações políticas e pequeno-burguesa das trocas econômicas. Faço muito mais inimizade, gero muito mais desprezo, muito mais inveja, muito mais asco, do que os correlatos contrários. Alguns, engolem e fingem civilidade. Outros, na primeira oportunidade, revidam a seu estilo.
3. Poucos são os amigos que se ligam a mim. Mas eu ainda sei piorar as coisas. Não os bajulo. Não passo a mão na cabeça. Não negocio suas amizades. Não os freqüento. Amar-me-ão, independente de mim, ou não me hão de amar. Talvez essa atitude minha seja um desajuste social. Mas isso, esse, sou eu. Há algo de muito ruim nesse eu, mas é isso que faz de mim, "eu", para o bem e para o mal.
4. Mudar, que seria? Fazer vista grossa às incoerências que se escreve e publica? Não denunciar, naquilo que me diz respeito, a absoluta falta de consciência de fundamentos que pulula o contemporâneo? Deixar-me ser posto ao lado, como um igual? Mas não sou igual! Não aceito a regra de cada qual dizer o que quiser, sem pagar o preço pelo que diz - eu pago alto preço por isso. Quando não se produzem afrontas explícitas, encenam-se relações de superfície, fingidas, que se desmaterializam logo ali na frente. Colho, evangelicamente, de "evangélicos", o que planto... Não tenho o direito de sofrer com isso.
5. Todavia, sofro, é verdade. O sentido de pertença ao grupo - ah, e há quem goste de fazer-me saber que sou excluído! - faz parte da "alma" humana. Mas os critérios de relações humanas está tão frouxo que o preço a pagar pelo apaziguamento da alma é o suicídio dos critérios epistemológicos. Eu sei - tenho de escolher entre paz de alma e critério epistemológico, entre privar de abraços e tapinhas no ombro, entre estar in e ser beijado no corredor, ou escrever para o futuro, ou, para, no presente, para aqueles que, de algum modo, pressentem uma improcedência de estilo nas relações. Seria preciso não ter carne e coração para não sofrer. Mas, a despeito de minha couraça crítica, pulsa, aqui, um coração que sofre.
6. Sabei: escolho o sofrimento.
6. Por isso, no conjunto, a manutenção de poucos, pouquíssimos, raros, interlocutores, é um lenitivo. É mesm o um gesto de carinho gratuito.
7. Obrigado.
https://www.facebook.com/osvaldo.l.ribeiro/posts/927660097314561
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
2. Não sou um amigo fácil. A rigor, não sou aquilo a que se poderia socialmente classificar de amigo. Sou fechado dentro de mim mesmo - mas isso é resíduo da infância. Sou severamente crítico - isso é posição epistemológica, quase patológica. Sou alguém que coloca o discurso das pessoas - escrito, proposto, publicado - acima das relações políticas e pequeno-burguesa das trocas econômicas. Faço muito mais inimizade, gero muito mais desprezo, muito mais inveja, muito mais asco, do que os correlatos contrários. Alguns, engolem e fingem civilidade. Outros, na primeira oportunidade, revidam a seu estilo.
3. Poucos são os amigos que se ligam a mim. Mas eu ainda sei piorar as coisas. Não os bajulo. Não passo a mão na cabeça. Não negocio suas amizades. Não os freqüento. Amar-me-ão, independente de mim, ou não me hão de amar. Talvez essa atitude minha seja um desajuste social. Mas isso, esse, sou eu. Há algo de muito ruim nesse eu, mas é isso que faz de mim, "eu", para o bem e para o mal.
4. Mudar, que seria? Fazer vista grossa às incoerências que se escreve e publica? Não denunciar, naquilo que me diz respeito, a absoluta falta de consciência de fundamentos que pulula o contemporâneo? Deixar-me ser posto ao lado, como um igual? Mas não sou igual! Não aceito a regra de cada qual dizer o que quiser, sem pagar o preço pelo que diz - eu pago alto preço por isso. Quando não se produzem afrontas explícitas, encenam-se relações de superfície, fingidas, que se desmaterializam logo ali na frente. Colho, evangelicamente, de "evangélicos", o que planto... Não tenho o direito de sofrer com isso.
5. Todavia, sofro, é verdade. O sentido de pertença ao grupo - ah, e há quem goste de fazer-me saber que sou excluído! - faz parte da "alma" humana. Mas os critérios de relações humanas está tão frouxo que o preço a pagar pelo apaziguamento da alma é o suicídio dos critérios epistemológicos. Eu sei - tenho de escolher entre paz de alma e critério epistemológico, entre privar de abraços e tapinhas no ombro, entre estar in e ser beijado no corredor, ou escrever para o futuro, ou, para, no presente, para aqueles que, de algum modo, pressentem uma improcedência de estilo nas relações. Seria preciso não ter carne e coração para não sofrer. Mas, a despeito de minha couraça crítica, pulsa, aqui, um coração que sofre.
6. Sabei: escolho o sofrimento.
6. Por isso, no conjunto, a manutenção de poucos, pouquíssimos, raros, interlocutores, é um lenitivo. É mesm o um gesto de carinho gratuito.
7. Obrigado.
https://www.facebook.com/osvaldo.l.ribeiro/posts/927660097314561
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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2 comentários:
Sobre a amizade, Fernando Pessoa disse...
Em prosa:
Tive um certo talento para a amizade, mas nunca tive
amigos, quer porque eles me faltassem, quer porque a amizade
que eu concebera fora um erro dos meus sonhos. Vivi
sempre isolado, e cada vez mais isolado, quanto mais dei por
mim.
Em verso:
Porque há em nós, por mais que consigamos
Ser nós mesmos a sós sem nostalgia,
Um desejo de termos companhia —
O amigo como esse que a falar amamos.
Não poderia recitar Pessoa - Pessoa não tinha Bel. Eu tenho - quer dizer: ela me tem...
A amizade, então, não me falta, num nível que, pressinto, é para poucos, porque é de extrema nudez e transparência.
Falava no post de amigos em outro nível, camaradas, de caminhada. Esses são raríssimos. A esses poucos, de dedos das mãos, hei de ser grato, até o dia em que se forem, e, ainda assim, a memória os guardará com gratidão.
Mas não arredarei pé, até enquanto forças houver em mim, de ser seltivo - e muito, porque não vale uma companhia de casca, cigarra agarrada em tronco. Isso nem pessoa é...
Um abraço,
Felipe
Osvaldo.
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