terça-feira, 23 de junho de 2020

(2020/057) Da teologia que se faz em comunidade

Da teologia que se faz - e, segundo se diz, só se pode fazer em comunidade, tenho a dizer o seguinte.

1. Esse tipo de teologia é política, e apenas isso. É alguma coisa entre autoajuda, animação de auditório e placebo. Autoajuda porque teologia só funciona psicologicamente por autossugestão. Animação de auditório porque o grande circo das comunidades se justifica pela total desarticulação política das massas. E é placebo porque a fé é placebo, com o agravante de que os operadores do circo sabem disso. Tanto sabem que, se apertados, falarão de terapia, benefícios psicológicos, conforto, essas coisas...

2. Esse tipo de teologia é, além disso, baseada em autoridade. Todo mundo sabe que, em comunidades, a "verdade" é imposta de cima para baixo, sustentada na retórica do deus articulado na doutrina, e que as lideranças se impõem sobre as pessoas, tudo sendo encenado como submissão ao deus. Logo, não existe teologia comunitária, mas o assenhoramento do comunidade pelos teólogos.

3. Teologia, como coisa séria, de pesquisa e estudo, se faz é em gabinete. Seu material não é a vida, mas a história e os livros, as teorias e as teses. Se a população não sabe disso e não sabe fazer isso, a teologia que fará é da pior qualidade possível, o papel tristíssimo de ser levada a considerar que sabe o que não sabe. 

Não é por outra razão que concordo com alguém que disse que no Brasil não há nem se faz teologia. 

Uma teologia que efetivamente tivesse lugar na comunidade e prestasse seria aquela que fosse levada a cabo por uma comunidade em que cada membro estivesse informado em gabinete, dominasse a história da teologia, os livros, as teses, os autores, na qual cada membro estivesse em pé de igualdade para avaliar, criticar, ponderar, superar, e não esse circo de púlpito, no qual o mais bem intencionado é um manipulador do sagrado, em que o cenário é a mais profunda ignorância popular, ignorância tanto mais criminosa quanto diplomado for o pregador.






OSVALDO LUIZ RIBEIRO

Um comentário:

Tetê Caldas disse...



Seu texto De Como Fazemos Deus Ser a Imagem dos Nossos Interesses dialoga com este de maneira inteligente e lúcida!

Deus é pintado da forma como interessa a quem o pinta. Sempre será assim - sempre. O Deus dos sacerdotes é sacerdotal. Deus e as manias de Deus. Deus e as vontades de Deus, suas normas. Não escrevi esse texto para conclamar as pessoas a terem de Deus a "ideia correta", porque não há uma "ideia correta" sobre Deus, já que sempre - sem exceção - todos nós sempre pintaremos Deus do nosso jeito. E, uma vez que não há como sair dessa situação - quero dizer: pensar em Deus é sempre inventar um modo de pensar nele, sempre a partir de nossos gostos, sempre projetando-nos nele -, restaria darmo-nos conta de que é preciso pensar "Deus" de tal forma que seja bom para todos os homens, mulheres e crianças do planeta: construir juntos uma ideia tão plural que já não haja mais ingenuidade em nenhum de nós, a tentar enganar-se e aos outros com a ideia de um "Deus" acima da construção histórica.

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