Não há questão mais fundamental, mais radical do que essa: você é elitista ou não é elitista.
Pensemos na religião, por exemplo. Hoje, está na moda disputar a massa. A massa, dizem os weberianos e que tais, são exatamente isso - massa. Deve-se modelar a massa, bater a massa. fermentar a massa, assar a massa, usar a massa.
Quando você pergunta se isso não é, afinal, manipulação, as reações caminham para o nível do argumento prático: se a esquerda não fizer, a extrema direita faz.
Pois, para mim, a questão é essa: você é elitista ou não? Se você é elitista, então tudo bem. Para você faz sentido assumir que a massa é irremediavelmente um corpo impossível de esclarecimento e educação. Para lidar com ela, você instrumentaliza teses eficientes na garantia de permitir que ela seja usada para seus propósitos, seja à direita, seja à esquerda - e é nesse lugar que os dois sinais se anulam...
Mas se você não é elitista, então considera que não se pode, sob nenhuma justificativa, considerar que a massa esteja aquém ou além da possibilidade de esclarecimento, desalienação, emancipação. Para você, a massa é apenas o resultado de um programa de alienação programática do povo, e você não vai participar da instrumentalização dessa ferramenta criminosa.
Eu não sou elitista nem posso cogitar ser. Logo, tenho horror da instrumentalização da massa, e tenho horror tanto do que a direita quanto a esquerda fazem nesse campo. Não se justifica fazer o bem, desumanizando aqueles que se quer salvar...
Posso, todavia estar errado. Os seres humanos são primatas. Todos os primatas do planeta são comandados por um macho alfa, e todos os machos dominam sobre as fêmeas. Se os homens são primatas, então são elitistas.
Entendo o argumento. Mas o supero. Sou primata, mas Homo sapiens. Eu sei que sou, quem sou, o que quero, o que não quero. E não quero ser macho alfa, nem que um macho alfa me controle. Não quero dominar fêmeas e sei que as fêmeas humanas não querem ser dominadas.
Assim, sei que carrego dentro de mim o impulso biológico elitista de minha família e espécie. Mas renego-o. Ergui-me da lama e desci das árvores. Caminho erguido. Caminho entre iguais.
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
2 comentários:
Incrível me ver engolido pela ignorância, pelos mesmos erros: que sei sobre os sentimentos, o que sei sobre a razão!? O fôlego diário vem de leituras como neste site para me desintoxicar do mentiroso que sou: "viver é perigoso" Grande Sertão: Veredas. Como você bem dizia, ser amigo da Verdade e não de Platão. Com é necessário saber viver...!
Gostei demais!
Estou lendo, vagarosamente, Sapiens, do Harari, e tem muita coisa lá que se liga a assuntos que vc tem escrito aqui nestes dias de pandemia. Vou refletir a respeito. Obrigado. Um abraço!
Postar um comentário