domingo, 5 de abril de 2015

(2015/387) Três notas sobre o escravo, o crente e a ideologia da escravidão

Maria Rita Kehl diz que não havia ideologia de escravidão "para o escravo". O escravo sabia que seu corpo lhe fora roubado, que sua vida lhe fora roubada, que o trabalho era, para ele, horror e terror. A ideologia da escravidão servia apenas par a sociedade naturalizá-la, acostumar-se a ela...

Pensando nisso, observo que o religioso de estirpe cristã (mas, em tese, não só ele) está e não está submetido a uma ideologia da escravidão.

Três observações:

a) não está, porque ele assume e sabe que seu corpo não lhe pertence, pertence a Deus, que sua vida não lhe pertence, pertence a Deus - ele é um escravo e sabe disso. Nesse sentido, sua experiência é similar a do escravo...

b) não, não está, porque, sabendo que é escravo, tanto quanto o escravo ele tenta fugir - sim, de Deus. Ele peca escondido, ele burla as regras, ele foge da senzala, e o capitão do mato, que é o que sua própria consciência, espera que o pecado seja satisfeito, o gozo, experimentado e, na culpa que se segue, o recolhe de volta à senzala de Deus.

c) mas, sim, ele está submetido sim a uma ideologia da escravidão - e, nesse sentido, bem diferente da ideologia da escravidão estrita: ele não percebe que é escravo do clero, do padre, do pastor, do bispo, do papa. Ele acha que é escravo de Deus. Nisso, ele é um tolo. A ideologia está em que mentem-lhe, dizendo que ele é escravo de Deus, quando, a rigor, ele é escravo de um sistema de controle social.











OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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