Li errado Nietzsche durante toda a minha vida. Não errava exatamente o que ele estava dizendo, mas errava integralmente o sentido do que ele estava dizendo. Pior: meu erro era alimentado pela leitura que o século XX fez dele. Quanbdo eu lia os bons filósofos, justificava a minha leitura errada, porque a deles estava igualmente errada.
Porque eu lia errado? Porque não conhecia o fundo histórico de seus textos, seus diários, os livros que lia, as cartas que trocou. Só conhecia as palavras. E com elas a gente faz o que quiser. Com o discurso da pessoa, não. Mas com as palavras escritas, faz-se o que se desejar. E eu fiz. Eu e os filósofos que eu lia. Fazíamos de Nietzsche um escritor de que nos orgulharíamos.
Até que bateu-me de frente uma Scania carregada... Era Domenico Losurdo. A princípio, julguei que fosse historiador. Um primor de trabalho, ele fez, e tanto, que pensei que fosse historiador. Mas é filósofo. Só não quis manejar Nietzsche de acordo com seu interesse pessoal, mas quis conhecê-lo. E como! Desmontou toda a minha leitura, toda. Não ficou nada de pé. E sem a retórica filosófica - no fundo, a mesma técnica dos púlpitos. Domenico Losurdo não diz uma frase sem apresentar a evidência, mais do que os argumentos...
Acho que o mesmo ocorre com os leitores da Bíblia. Leem errado. Totalmente errado. E, quando vão às igrejas, reforça-se o seu erro ainda mais. E erram porque, além da dificuldade colossal que têm com textos, não conhecem praticamente nada dos textos, da Bíblia, do tempo, do mundo. Nada. Tratam o texto como um espelho doutrinário e, mais recentemente, mágico-narcisista.
Há Domenicos Losurdos à vontade para corrigir esse modo deficiente, errado, pervertido, de ler a Bíblia. Mas, diferentemente de meu caso, que desejava ardentemente conhecer a história, parece que os crentes desejam mesmo é a sensação hipnótica de ler como leem... Logo, não há cura prevista e possível.
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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