1. Não é nenhuma declaração bombástica, nenhuma novidade, nenhuma revelação neo-carismática - trata-se apenas de uma percepção - eventualmente, de uma constatação: a formação pastoral vai de mal a pior. Mas eu acho que o problema não é tanto a formação pastoral - é a avacalhação completa que a "função" pastoral sofreu no mundo evangélico brasileiro (quiçá no mundo?). O que os seminários têm formado reflete essa avacalhação: trabalhando para modeos absolutamente lamentáveis de pastoral, a deformação só pode ser geral, porque a demanda se dá consoante (de)formação, o (des)modelo... E, amigos, palavras mágicas, gestos entusiásticos, discursos fabricados, esgares como que espirituais - nada disso vai solucionar a profunda, profundíssima crise em que nos metemos.
2. Por mim eu nem usava mais o nome "pastor" - entenda: não é que eu seja, e não sou, pastor, e desgostaria de usar o título que me fora imposto: trata-se do próprio nome "pastor". Para mim, um nome perdido, como "padre". Perdeu-se completamente o carisma... Todavia, já que tenho que usar os nomes, deixem-me dizer o que penso a respeito, já que estarei ainda mais intima e oficialmente ligado à formação pastoral nos próximos meses.
3. Pastor não é pregador. Toneladas de livros de Homilética não fazem um pastor. Pregador não é necessariamente pastor. A retórica, a arte da pregação, da fala pública, é até arte maldosa: não se comprova o fato na política? O que se faz nos interiores, nos "intestinos" das Assembléias e congêneres? Nada mais que burlar a boa fé por meio da boa retórica - a política transformou-se em deboche. E a Homilética nada mais é que instrumento - não faz nem o caráter nem o perfil do pastor. Se gosto de um pastor que, ao mesmo tempo, seja bom pregador? Naturalmente. Mas pastor não é pregador.
4. Pastor não é administrador. Desgraça evangélica, vaidade, medo, tara, sei lá o que, que pastor tenha de ser "presidente"... Política? Maldição... Pague-se um bom administrador, e há muitos realmente. Nunca me tornei um pastor e, devo confessar, a possibilidade de um dia vir a me tornar um é quase zero - porque não gosto suficientemente de pessoas para me tornar um "pastor" (conquanto a grana cairia bem, não?) -, mas, se algum dia tivesse sido, minha exigência seria: não serei administrador da Igreja, nem presidente - só pastor. E o que fará, pastor? Cuidar das famílias, das crianças, dos idosos, dos casais, dos jovens, das pessoas. Só isso, nada mais do que isso. Contrate a Igreja um administrador e decida quem será o presidente. Eu, não.
5. Pastor não é animador de auditório. Mas virou. Ridículo. "Parole, parole, parole". Pantomimas, afetações, palavras, gestos, emocionalismo... Está na moda, não? Cultos que se tornam "show", servos que se tornaram "showman". L-a-m-e-n-t-á-v-e-l.
6. Ora, se pastor não é nem pregador - "anunciador do Evangelho!" -, nem administrador/presidente, nem animador de auditório, é o quê? Numa palavra - cura d'almas. Cuidador de gente. Só - e mais nada. O restante é estorvo, se se interpõe ao essencial. É até conveniente, eventualmente, mas apenas se se adequa às reais tarefas do pastor: cuidar de pessoas.
7. Quando não se está atento a isso, promovem-se "vocações" distorcidas: postulantes a pregadores, que pensam que pregação é arte de monólogo; postulantes a donos de curral, que acham que o foco pastoral é a criação de um redil organizado; postulantes a Ivete-em-trio-elétrico, bufões animadores de carnaval evangélico - outro modo de se descrever liturgias auto-proclamadas "contemporâneas", como se o contamporâneo fosse o mau gosto...
8. Nesse sentido, eu perguntaria: há espaço para vocações pastorais? Sim, há - não se vendem toneladas e toneladas de livros de auto-ajuda? Já pararam pra pensar porque evangélicos são consumidores formidáveis dessa boboseira? Ora, se faltam pastores, vai de baboseira mesmo...
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
2. Por mim eu nem usava mais o nome "pastor" - entenda: não é que eu seja, e não sou, pastor, e desgostaria de usar o título que me fora imposto: trata-se do próprio nome "pastor". Para mim, um nome perdido, como "padre". Perdeu-se completamente o carisma... Todavia, já que tenho que usar os nomes, deixem-me dizer o que penso a respeito, já que estarei ainda mais intima e oficialmente ligado à formação pastoral nos próximos meses.
3. Pastor não é pregador. Toneladas de livros de Homilética não fazem um pastor. Pregador não é necessariamente pastor. A retórica, a arte da pregação, da fala pública, é até arte maldosa: não se comprova o fato na política? O que se faz nos interiores, nos "intestinos" das Assembléias e congêneres? Nada mais que burlar a boa fé por meio da boa retórica - a política transformou-se em deboche. E a Homilética nada mais é que instrumento - não faz nem o caráter nem o perfil do pastor. Se gosto de um pastor que, ao mesmo tempo, seja bom pregador? Naturalmente. Mas pastor não é pregador.
4. Pastor não é administrador. Desgraça evangélica, vaidade, medo, tara, sei lá o que, que pastor tenha de ser "presidente"... Política? Maldição... Pague-se um bom administrador, e há muitos realmente. Nunca me tornei um pastor e, devo confessar, a possibilidade de um dia vir a me tornar um é quase zero - porque não gosto suficientemente de pessoas para me tornar um "pastor" (conquanto a grana cairia bem, não?) -, mas, se algum dia tivesse sido, minha exigência seria: não serei administrador da Igreja, nem presidente - só pastor. E o que fará, pastor? Cuidar das famílias, das crianças, dos idosos, dos casais, dos jovens, das pessoas. Só isso, nada mais do que isso. Contrate a Igreja um administrador e decida quem será o presidente. Eu, não.
5. Pastor não é animador de auditório. Mas virou. Ridículo. "Parole, parole, parole". Pantomimas, afetações, palavras, gestos, emocionalismo... Está na moda, não? Cultos que se tornam "show", servos que se tornaram "showman". L-a-m-e-n-t-á-v-e-l.
6. Ora, se pastor não é nem pregador - "anunciador do Evangelho!" -, nem administrador/presidente, nem animador de auditório, é o quê? Numa palavra - cura d'almas. Cuidador de gente. Só - e mais nada. O restante é estorvo, se se interpõe ao essencial. É até conveniente, eventualmente, mas apenas se se adequa às reais tarefas do pastor: cuidar de pessoas.
7. Quando não se está atento a isso, promovem-se "vocações" distorcidas: postulantes a pregadores, que pensam que pregação é arte de monólogo; postulantes a donos de curral, que acham que o foco pastoral é a criação de um redil organizado; postulantes a Ivete-em-trio-elétrico, bufões animadores de carnaval evangélico - outro modo de se descrever liturgias auto-proclamadas "contemporâneas", como se o contamporâneo fosse o mau gosto...
8. Nesse sentido, eu perguntaria: há espaço para vocações pastorais? Sim, há - não se vendem toneladas e toneladas de livros de auto-ajuda? Já pararam pra pensar porque evangélicos são consumidores formidáveis dessa boboseira? Ora, se faltam pastores, vai de baboseira mesmo...
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
11 comentários:
O texto é muito bom, mas é muito longe da realidade. Nós, seminaristas, aprendemos isso no seminário. Mas, e as igrejas? Se um pastor disser que vai só cuidar de pessoas e mandar a igreja arrumar outro pra ser presidente e administrador, vão chamá-lo de preguiçoso e folgado. A cada dia que passa fico mais decepcionado, pois vejo as igrejas com um programa pronto do que elas querem fazer e então convidam um "pastor" para ser apenas o animador de auditório. "Já decidimos, agora a gente joga o pastor lá na frente para conduzir. E ai dele se não conduzir direito!" E se o pastor não concordar? Ele pode sair. Por isso que a cada dia mais, o pessoal está percebendo que a única alternativa é o cara ter uma profissão e pastorear através dela. Um professor, no intervalo, senta no degrau da escada ao lado de um aluno e ouve o seu desabafo. Depois, ele usa o conhecimento limitado que adquiriu no seminário para tentar abrir outras possibilidades para o aluno. Já assistiu "Escritores da Liberdade"? Aquela sim é uma verdadeira pastora. Quem dera metade dos caras que colocam o "pr" antes do nome tivessem coragem de fazer o que aquela mulher fez. Acho muita pretensão dizer que a função de um pastor é curar a alma. Ele pode, quem sabe, ajudar a mostrar um caminho. Algo que a pessoa, sozinha, não havia enxergado antes. Mas só a pessoa poderá encontrar a cura para a sua ferida.
Não suporto mais receber recadinho no meu Orkut convidando para programações vazias de igrejas. Parece o antigo e saudoso "Topa Tudo por Dinheiro". É festa a fantasia, comida e agora tem até campeonato de vídeo-game. O pastor é o cara que organiza e anima tudo isso. Mas tem que divulgar para dizer para os outros que a sua programação deu 100 pessoas presentes. Mesmo que estas cem pessoas entrem e saiam da mesma forma, com o mesmo vazio e a mesma ferida na alma.
Melhor que este alerta, apenas o não publicado O Pastor dos meus Sonhos...
Um abraço, Mestre!
É ... Osvaldo....
A coisa é muito, muitíssimo séria.
A imensa maioria de pastores que conheço faz tudo aquilo que você apontou que não seria função de pastor e não fazem o que deveriam fazer.
E parece que as perspectivas para o futuro não são nada boas. Pelo que vejo o futuro nos dará cada vez mais administradores/pregadores/animadores de auditório. E cada vez mais milagreiros que falam com anjos, que incorporam anjos (já viu isso?), que incorporam profetas do passado e por aí vai...
Resta-nos resistir.
João, você me pôs a pensar, quando adverte quanto ao fato da pretensão de ser um pastor um cura d'almas... Sim, é preciso refletir sobre isso. Eu diria o seguinte: na comunidade "cristã", há almas de todo tipo - almas que precisam de Carl Rogers, que precisam apenas ser ensinadas a se curarem. E há os, de fato, que precisam de cura, porque lhes faltam, desde a infância, estruturas. Há momentos de Rogers, e há momentos de praticar a cura mesmo. Temos de refletir sobre isso. Há gente ferida - é necessário cuidar dessa gente.
Quanto à expectativa das igrejas, de fato, se a comunidade já caiu na neo-modernidade de massa, há, sim, o risco de ela enxergar-se como um auditório a ser animado: o Evangelho faz isso via TV! Mas até isso precisa ser corrigido, e, nesse sentido, a educação é uma das tarefas do cura d'almas...
Então! Mas eu acho pretensão demais alguém dizer que tem a capacidade de curar as inúmeras almas feridas que estão em uma igreja. A cura é operada entre Deus e a pessoa e o pastor pode e deve ser, na minha opinião, no máximo, um agente facilitador. O pastor deve ser aquele que irá facilitar o caminho para que a pessoa encontre em Deus a cura para a sua alma. Senão, penso eu, o suposto pastor cai na síndrome de messias.
Com certeza esse é o ponto, e educação deu lugar à catequese, à inculcação. No momento em que perdemos a educação libertária e liberta da igreja agregamos os valores conteudistas de nossas escolas seculares. Escolas atuais não mais formam pensadores, igrejas atuais não mais formam cristãos.
Talvez agora eu entenda o medo quase hollywoodiano das igrejas atuais quando postas defronte os escritos de "Von Harnnack", parafraseando "Gunkel", parafraseando "Weinel"...
"Embora testemunhem que as palavras de Jesus eram consideradas em alta estima e reverência, não representavam a característica principal do cristianismo primitivo. A principal característica era a relação pessoal íntima, movida pelo Espírito Santo de Deus, dos indivíduos com o próprio Deus. (...) Substancialmente conclui que as expressões "receber" o "Espírito Santo" e "agir por meio Dele", significam tal independência e simultaneidade da vida e do sentimento religiosos, em união com Deus, que não poderiam resultar da estrita submissão da autoridade de Jesus. (...) As forças elementares do temperamento religioso, controladas pelos sistemas doutrinários e as cerimônias do culto público eram novamente libertadas. (...) A comunidade cristã primitiva acreditava que Jesus era seu Senhor. Expressava absoluta devoção e confiança Nele como o Príncipe da Vida. Não havia sacerdotes nem mediadores,porque os cristãos entravam, individualmente, em imediata relação com Deus."
É, ler Harnnack na atual perspectiva pastoral é no mínimo uma afronta. Mas, não sei porque cargas d'água, adoro essa leitura...
João, é aqui que a gente marca nossas, digamos, diferenças teológicas. Se é Deus quem cura, então que trabalhe ele mesmo, entende? Penso que são as relações interpessoais, as viagens para dentro de nós, a nossa abertura, nossas superações de recalques e traumas, é isso que produz cura. Naturalmente que a isso se deve somar o ambiente - o simples fato de minha conversão, em 1984, me deu forças para vencer tentações que, até então, haviam sido vencedoras. A religião é um bom consultório, conquanto, tambem, manicômio... Podemos construir um discurso "teológico" a dizer que isso é Deus quem faz, está bem, que seja, mas, "ele" só fará se tiver quem opere: "ele" pode até ser "escondido", quando falamos das curas, mas os agentes humanos, sem eles, não há cura possível... Não penso que as operações de aconselhamento sejam rituais dispensáveis - e o seriam, se, a rigor, são pura encenação, já que é Deus quem cura, entende? Não estamos falando de doenças físicas (catapora, por exemplo). Falo de traumas psicológicos - "pecados" - dores... Essas coisas, somos nós mesmos a nos curarmos, por meio de relações terapêuticas. Não?
Harnack, Harnack... O terror do sacerdócio, mas, a rigor, um termo de negociação. Depois de Harnack, só Vattimo mesmo...
Agora ficou melhor explicado.
Concordo plenamente.
Não sou exegeta. Bem que queria sê-lo, mas não consigo aprender grego e hebraico. Mas, de qualquer forma, penso que era mais ou menos isso o que o autor de Tiago tinha em mente quando mandou a gente confessar nossos pecados uns aos outros.
Desde o início que eu sabia que estamos falando de doenças emocionais. A Igreja e um pastor podem ser agentes de cura. Infelizmente, a maioria tem sido o contrário. A filha do meu pastor faz estágio de medicina em uma clínica psiquiátrica em Goiânia. Ela disse que o que mais tem lá é crente que ficou doido em igreja. Triste isso.
Por isso, penso que o pastor tem que ter muita humildade, tato e sabedoria para poder ser um agente de cura. Se ele for achando que tem a resposta pronta para solucionar o problema, ele acaba por criar um problema ainda maior na pessoa. Por isso que eu disse que é pretensão demais querer curar as almas.
Isso me entristece mais ainda aqui na nossa casa, sabe? O slogan é PREPARANDO VIDAS PARA SERVIR. Chega aqui e a formação é EXCLUSIVAMENTE ACADÊMICA. Essa incoerência não dá. Até agora, NÃO APRENDI NADA SOBRE PESSOAS. NADA!!!
Vim para um lugar que prometia preparar-me para servir e saio daqui totalmente despreparado. Aprendi metodologia exegética do Antigo Testamento, mas no que isso vai me ajudar a cuidar das pessoas e ser um agente de cura?
João, Peroratio não será um fórum para discutirmos essa questão, que, a rigor, é séria, mas de fácil solução. Acredite - é muito, muito fácil resolver isso. Na Colina, agora, com Davidson, penso termos as condições para tal. Mas deixemos para o fórum apropriado, está bem? Aqui, falemos de pastoral, metamos o pau, sonhemos, façamos nossos exercícios de utopia - mas deixemos a questão concreta daquela instituição para as discussões lá, para o que te convido desde já...
Agora chega de discutir isso. Como você deve ter percebido nos meus últimos e-mail's, ultimamente estou mais preocupado com outra discussão!
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