sábado, 17 de maio de 2014

(2014/440) Deus está em todas as religiões?

Como quem acabara de descobrir a coisa mais bela e acolhedora de toda a Teologia, no corredor, depois da aula, pressuroso e serelepe, um aluno interrompe meu destino e me revela: "Professor, então, o teólogo Fulano de Tal disse que todas as religiões são válidas, porque Deus está em todas elas, em cada uma delas"...

Eu, 30 anos de crente, 22 anos de Teologia, conhecendo bem o povo crente e a espécie teológica, já adivinhava o que vinha. E, de fato, acertei na mosca. Provoquei ainda mais a sua animção de neófito crédulo - duas vezes crédulo: "É? E o que mais ele disse?"...

"Ah, ele disse que Deus está em todas as religiões, mas não com a mesma percepção por parte dos povos religiosos, porque alguns ainda o percebem de modo incompleto, imperfeito, como se a imagem estivesse embaçada..."...

"Hum, entendi..."...

"É. Com o tempo, ele disse, os povos chegarão à compreensão de Deus. Mas o importante é que ele já está lá, em cada religião e cultura..."...

Não, meu caro e encantado aluno: o importante é que o Deus que já está lá, imperfeito em sua apreensão pelo povo, é o mesmo Deus que nosso teólogo crente tem, e o tem na sua perfeição de entendimento. 

(...)

Seu novo teólogo é um embusteiro, meu querido. O que ele está fazendo é trocar seis por meio dúzia. Diferente do que você pensa, ele não respeita as religiões: ele é ainda o velho missionário pavorosamente arrogante e presunçoso de sua verdade. O que ele mudou é a retórica: Deus já está lá, mas, para de uma forma ainda incompleta. Por isso, na aparência, nos discursos, nas práticas, as religiões são diferentes da nossa, a verdadeira, onde Deus está inteiramente, perfeitamente. Mas, quando elas evoluírem, quando se aperfeiçoarem, quando melhorarem seu grau de compreensão da verdade, então o Deus que lá já está, que é o nosso, aparecerá para eles perfeitamente, tanto quanto perfeitamente aparece para nós, e a religião deles, imperfeita, ficará perfeita, como a nossa, e será igual à nossa...

"Mas, professor, não é melhor um pensamento desses do que um pensamento que as demonize?"...

Não deixa de ter razão, esse seu argumento. Aplique-o ao racismo e teste a sua profundidade ética...

"Como assim, professor?"...

Muito simples: ensine os racistas a tolerarem os pretos. Diga a eles que, no fundo, eles são brancos. É que são imperfeitamente brancos. Mas, quando evoluírem, serão brancos, como nós, louros, como nós e chegarão, os melhores, até a ter olhos azuis...





OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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