1. Edvar Gimenes escreveu um post no facebook sobre "missões" cristãs. Reagi. Ele regaiu à minha reação e eu trepliquei. No conjunto, uma boa oportunidade para reflexão: para nós dois e para todos e qualquer um.
2. Minha reação:
Edvar, você deve imaginar que o ideário de missão e evangelização me é absolutamente desconfortável. Permita-me uma breve provocação: se a Evangelização, como você diz no final de seu texto, dá-se por crédito à mensagem do amor de Deus, vincular esse amor a uma mensagem doutrinal, a uma comunidade de fé, a uma instituição ou a uma cultura, não é trocar uma coisa pela outra?
Penso que o problema maior desse tipo de argumentação que, na prática, vejo sempre e reiteradamente contrariado pela prática, é que, no fundo, se toma uma fé, uma religião, uma denominação, uma igreja - e se vincula ideologicamente o amor de Deus, a mensagem do amor de Deus a essa grandeza.
Tudo bem, se o que acreditamos é nisso. Mas não podemos dizer ma coisa - amor de Deus - quando estamos, de fato, querendo outra: a catequização doutrinária (em amplo sentido, que seja) do povo.
3. Réplica de Edvar:Essa, ambos sabemos, não é uma questão nova. Mas se faz nova, porque nunca resolvida de fato.
Osvaldo, talvez porque criticar também seja uma forma de manifestar afeto, como escreveu Roberto Shinyashiki, em Carícia Essencial, não havia pensado em seu desconforto com o ideário de missão e evangelização, mesmo lendo regularmente o que você escreve (até porque você tem sido um dos poucos que tem me instigado e me desafiado a pensar em nosso meio). Acredito que você desenvolve um importante papel de ajudar-nos a elucidar questões teóricas com fortes repercussões práticas, seja lá quais forem os motivos do seu coração.
Entendo como sendo um grande desafio, talvez o maior, distinguir a mensagem do amor de Deus da mensagem doutrinal ou de uma comunidade de fé ou de uma instituição ou de uma cultura, como você disse. Porém, separar, penso ser desnecessário, até onde consigo enxergar e compreender, primeiro, porque esses elementos também podem e devem ser usados a serviço do amor e, segundo, porque o purismo é uma possibilidade somente no campo teórico que deve ser reconhecido, mas não almejado. A vida mesmo é uma profunda mistura. Daí estarmos sempre pensando, para distinguir uma coisa de outra e nos orientar por aquilo que julgamos ser o melhor pra si e pra todos.
Concordo, portanto, que na prática sempre há uma vinculação entre amor e os elementos citados por você, mas a distinção precisa ser feita para que tenhamos consciência do que deve prevalecer e nos empenharmos em sua direção.
Se alguém diz uma coisa querendo outra, isso é um problema ético de má-fé de quem assim age, mas entendo que o fato de haver que assim age não deve servir de desestímulo para continuarmos discernindo e perseguindo o ideal de ter o amor como motivo de nossa ação evangelizadora.
Assim tenho pensado até aqui, mas sempre aberto a repensar!
4. Minha tréplica:
Edvar Gimenes de Oliveira, é um caso que, a meu juízo, só pode ser abraçado em aproximação crítica na "longa duração". Há um problema estrutural na Teologia cristã. Um problema que decorre de: a) estar baseado em discurso teológico-político monárquico (AT pré-exílico); b) majoritariamente fundamentado em ideologia sacerdotal de altíssimo grau de aviltamento do camponês judaíta (AT pós-exílico) e c) finalmente, carregado da Institucionalização romana - e com isso quero me referir a Constantino/Teodósio I, e não ao Vaticano -, o que dá à estrutura doutrinária e política do Cristianismo uma carga constitutiva maximamente e potencialmente pervertida. O seu olhar sobre o homem é, acima de tudo, de condenação.
É verdade que há rasgos de compaixão e amor. O próprio Jesus, se podemos aceitar algumas das tradições do NT, fora um ferrenho crítico de todas as variáveis que apontei acima. Mas à toa. Morto, foi incorporado na teologia sacerdotal e de modo tão eficiente que, a despeito de João, o Evangelho, guardar memória traditiva de que el não condena, Paulo dá as cartas.
Há, pois, uma ambiguidade no Cristianismo, que faz com que o amor seja acessório, secundário e condicionado. A própria circunstância da pregação o revela: primeiro, o inferno, o diabo, depois, Jesus - o Cristo.
No meio do caminho a Justiça (Anselmo) superou o Amor.
Assim, a missão pode até dar-se por um impulso de amor - não duvido. Mas, quando ela se faz, se faz por meio da estrutura teológica que dá a estrutura ao sistema cristão: e, então, o Amor é, novamente, pisado pela Justiça. Vencem, de novo, sobre o mesmo Jesus, os sacerdotes de Jerusalém.
Grosso modo é a leitura que faço, dada aqui em forma de esboço. Muito teria que escrever, dizer, fundamentar, mostrar. Mas, para bom entendedor, pingo é letra...
Fico grato por suas palavras de consideração e estima, e lisonjeado com o fato de ler meus textos. São a expressão da alma. Bons ou ruins, certos ou errados - e me esforço para estar certo, sempre - são a expressão da minha alma.
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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