terça-feira, 30 de novembro de 2010

(2010/602) Transparência e Poder - antagonismo insuperável?


1. O Poder - um "certo tipo" de Poder - detesta a transparência. O Poder tem alergia à transparência. Sente urticária: seu corpo é tomado por placas vermelhas, que purgam líquidos mal-cheirosos, se exposto à transparência. No micro e no macro. Não importa tanto a amplitude desse Poder, seu tamanho, a circunferência de sua bocarra.

2. Há Poder(e)[zinhos], vejam vocês, que ficam atemorizados diante de um... blog. Sim, um blog institucional qualquer. Mesmo um que você crie como um "veículo de comunicação direta" entre a administração e o corpo da Instituição. Não pode! Fecha!

3. E há aqueles casos que revelam justamente a razão pela qual o Poder (e os Poder(e)[zinhos]) abominam a transparência. Veja o caso do WikiLeaks. No último vazamento da correspondência oficial entre as embaixadas estadunidenses e a Casa Branca (Secret US Embassy Cables), vejam vocês, há a informação, dada diretamente pelo embaixador dos EUA no Brasil, de que, num almoço com o "nosso" Ministro da Defesa, Nelson Jobim, ele teria recebido, deste, as seguintes informações: 1) o Itamaraty é anti-americano, 2) o "Guimarães" (Ministro Samuel Pinheiro Guimarães, da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República), odeia os EUA, e 3) o Evo Morales, Presidente da Bolívia, segundo teria contado para Lula, que, então, contou para o Jobim (que, agora, passa a informação ao Norte), teria um "grave tumor" na cabeça (cf. PHA; mais detalhes com o Leandro Fortes). Como classificar essa "conversa"?

4. O Poder - no caso, Jobim, - adoraria que essa conversa ficasse entre ele, informante, e o embaixador - e, claro, a alta administração dos Estados Unidos da América. Mas aí, o WikiLeaks vaza a informação. Absurdo, não acham? No entanto, Jobim nega que tenha dito ao embaixador o que o embaixador disse que ele disse. Seja como for, esse episódio ilustra bem a razão pela qual a transparência é evitada e até censurada pelo Poder - e pelos Poder(e)[zinhos]: porque há homens, no poder, que jogam um arriscado jogo de "traição" aos valores institucionais, de escamoteações, de apropriação do bem-comum, que, em lugar de estarem a serviço de, querem servir-se de. Nesses casos, as informações devem ser controladas, escondidas, principalmente a fala de gabinete, aquela, secreta, em que os benefícios próprios, os movimentos premeditados, na surdina, são planejados e discutidos, ainda que em detrimento da comunidade, da Instituição, do país.

5. Não se quer apenas servir-se do Poder - quer-se fazê-lo anonimamente. E, por isso, a ojeriza à transparência.

6. Todavia, é ela, a transparência, a única forma de se evitar a politicagem, as negociações, quaisquer que sejam, escusas e espúrias, a venda de "informações". Há custo, se há transparência, mas é custo público, rateado por todos, assim como os benefícios, igualmente rateados. Quando não há transparência, o custo é distribuído abaixo do pescoço, e os benefícios reservam-se do pescolço para cima.

7. Não vai demorar muito para fecharem, de algum jeito, o WikiLeaks, nem que seja pela porta dos fundos.





OSVALDO LUIZ RIBEIRO

PS. No Twitcam de hoje, Nassif alega que não se pode tratar esse caso do Jobim como "vazamento", alegando que se trata de uma conversa informal, e que, dar ao caso o tratamento que os blogs estão dando, é agir como a Veja faz no casos dos "grampos". Discordo do Nassif. Não se trata de uma conversa de bar, mas de um almoço entre o Ministro da Defesa da República Federativa do Brasil e o embaixador dos Estados Unidos da América - no qual o Ministro faz "comentários" (que ele julgava "sigilosos") politicamente negativos do Itamaraty (Itamaraty, Nassif!), do Guimarães e do Evo Morales, nesse caso a partir de informação dada pelo próprio Presidente da República. Ora, Nassif - menos, né?

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