1. Tudo tem dois lados. Na postagem anterior, ainda que superficialmente, refleti sobre a felicidade - foi quase uma ode ao "vamos pôr a felicidade aqui e agora". Aparentemente, muito bonitinho e bem comportado, politica e eticamente correto... No entanto...
2. Hegel, Kant e, claro, Nietzsche já sabiam que, a despeito do bem das coisas boas, das virtudes privadas, são os "vícios" privados os responsáveis pelo avanço da espécie (a inveja, a ambição, a vaidade) - a ponto de Kant dizer que, se de um lado, os homens, individualmente, gostam da concórdia, a Natureza, essa gosta é de discórdia mesmo, porque é por meio dela que a espécie avança.
3. É verdade. Até na pesquisa. Se você não se depara com um "problema", o pensamento pára: para o que vale a metáfora do sapato - se é um bom sapato, você nem nota, porque ele está lá, adequadamnte comportado, mas, se ele aperta o calcanhar, e um calo se auncia, pronto, o mundo é apenas aquele sapato, aquele calo... Como espinha de adolescente: o Universo inteiro sabe e vê apenas isso...
4. Não são as boas sensações as que nos fazem avançar - pelo contrário: a satisfação do amor, a felicidade, a conformação, o que tudo isso proporciona a nós é uma interminável onda de estagnação no aqui e no agora. Se avançamos, se corremos para a frente, é porque estamos com sede, queremos alguma coisa, precisamos desesperadamente disso - e vamos atrás... Se a felicidade é a cenoura a atrair o burro, a infelicidade é a lança a chuchar a vaca... Uma nos puxa, a outra, empurra.
5. É como com reclamação de alunos. Eu, invariavelmente lhes digo que, se não for mais um dos intermináveis chiliques de alunos, se a preocupação for justa, séria, profunda, a coisa não vai parar ali, naquela verborragia escandalosa. Mas, se, ao contrário, a verborragia não passa de catarse psicológica, não vale a pena eu, professor, gastar meus ouvidos, conquanto as orelhas estejam aí para isso.
6. Voltando ao "negativo necessário", talvez a questão da felicidade seja, afinal, a mesma do céu. Inventaram de nos fazer crer num céu que é só nuvens azuis e rosas, cânticos religiosos intermináveis, uma paz imorredoura, uma beatitude eterna... Bem, se a Terra foi feita para os homens, o céu, não. Porque ninguém agüentará um lugar desses, pela mesma razão de que a tentativa cristã se fazer de todos os dias e de todos os lugares dias e lugares do Senhor deu no que deu - secularismo, porque esqueceram, se aprenderam (e na condição de cristãos, cristãos aprendem alguma coisa?), que o "sagrado" é o outro lado do "profano", sem discussão, e, se você suprime um, suprime outro, de modo que, se faz desaparecer o sagrado, o profano some, e se faz sumir o profano, o sagrado some. Ora, se houver acerto nesse raciocínio, um céu todo-beatitudes imediatamente deixará de ser... céu, como a Europa cristã imediatamente tornou-se republicana e laica, o que, para muitos "cristãos" é o saguão do inferno....
7. O que talvez signifique que o problema da Telogia (cristã?) seja o homem e a mulher, e desfazer a sua condição humana seja, afinal, a intenção de fundo dessa história de dois mil e quinhentos anos, numa fixação da cena de um enfurecidíssimo Yahweh a arrepender-se de os ter feito, e tanto, a ponto de afogar a todos: porque uma "raça" que aturaria a mornidão eterna não pode ser humana (mais). O próprio Apocalipse fala sobre ser frio ou quente, mas, quanto a ser morno... argh... Ou seja: um trabalho dos infernos de criar a humanidade e a expor ao "pecado", para, no fim da história, no céu, arrancar dela a única coisa que é exatamente a sua definição - sua condição humana...
8. Talvez seja melhor sermos infelizes. Talvez isso nos mantenha vivos. Talvez isso até justifique a necessidade dos deuses, não? Não diria sermos absolutamente infelizes - mas mantermos lugares doloridos no peito, e a disposição do analgésico sempre mais distante da mão do que o comprimento do braço. Isso nos manterá vivos. Porque não faz sentido sermos felizes, e, no fim das contas, estarmos mortos...
OSVADO LUIZ RIBEIRO
2. Hegel, Kant e, claro, Nietzsche já sabiam que, a despeito do bem das coisas boas, das virtudes privadas, são os "vícios" privados os responsáveis pelo avanço da espécie (a inveja, a ambição, a vaidade) - a ponto de Kant dizer que, se de um lado, os homens, individualmente, gostam da concórdia, a Natureza, essa gosta é de discórdia mesmo, porque é por meio dela que a espécie avança.
3. É verdade. Até na pesquisa. Se você não se depara com um "problema", o pensamento pára: para o que vale a metáfora do sapato - se é um bom sapato, você nem nota, porque ele está lá, adequadamnte comportado, mas, se ele aperta o calcanhar, e um calo se auncia, pronto, o mundo é apenas aquele sapato, aquele calo... Como espinha de adolescente: o Universo inteiro sabe e vê apenas isso...
4. Não são as boas sensações as que nos fazem avançar - pelo contrário: a satisfação do amor, a felicidade, a conformação, o que tudo isso proporciona a nós é uma interminável onda de estagnação no aqui e no agora. Se avançamos, se corremos para a frente, é porque estamos com sede, queremos alguma coisa, precisamos desesperadamente disso - e vamos atrás... Se a felicidade é a cenoura a atrair o burro, a infelicidade é a lança a chuchar a vaca... Uma nos puxa, a outra, empurra.
5. É como com reclamação de alunos. Eu, invariavelmente lhes digo que, se não for mais um dos intermináveis chiliques de alunos, se a preocupação for justa, séria, profunda, a coisa não vai parar ali, naquela verborragia escandalosa. Mas, se, ao contrário, a verborragia não passa de catarse psicológica, não vale a pena eu, professor, gastar meus ouvidos, conquanto as orelhas estejam aí para isso.
6. Voltando ao "negativo necessário", talvez a questão da felicidade seja, afinal, a mesma do céu. Inventaram de nos fazer crer num céu que é só nuvens azuis e rosas, cânticos religiosos intermináveis, uma paz imorredoura, uma beatitude eterna... Bem, se a Terra foi feita para os homens, o céu, não. Porque ninguém agüentará um lugar desses, pela mesma razão de que a tentativa cristã se fazer de todos os dias e de todos os lugares dias e lugares do Senhor deu no que deu - secularismo, porque esqueceram, se aprenderam (e na condição de cristãos, cristãos aprendem alguma coisa?), que o "sagrado" é o outro lado do "profano", sem discussão, e, se você suprime um, suprime outro, de modo que, se faz desaparecer o sagrado, o profano some, e se faz sumir o profano, o sagrado some. Ora, se houver acerto nesse raciocínio, um céu todo-beatitudes imediatamente deixará de ser... céu, como a Europa cristã imediatamente tornou-se republicana e laica, o que, para muitos "cristãos" é o saguão do inferno....
7. O que talvez signifique que o problema da Telogia (cristã?) seja o homem e a mulher, e desfazer a sua condição humana seja, afinal, a intenção de fundo dessa história de dois mil e quinhentos anos, numa fixação da cena de um enfurecidíssimo Yahweh a arrepender-se de os ter feito, e tanto, a ponto de afogar a todos: porque uma "raça" que aturaria a mornidão eterna não pode ser humana (mais). O próprio Apocalipse fala sobre ser frio ou quente, mas, quanto a ser morno... argh... Ou seja: um trabalho dos infernos de criar a humanidade e a expor ao "pecado", para, no fim da história, no céu, arrancar dela a única coisa que é exatamente a sua definição - sua condição humana...
8. Talvez seja melhor sermos infelizes. Talvez isso nos mantenha vivos. Talvez isso até justifique a necessidade dos deuses, não? Não diria sermos absolutamente infelizes - mas mantermos lugares doloridos no peito, e a disposição do analgésico sempre mais distante da mão do que o comprimento do braço. Isso nos manterá vivos. Porque não faz sentido sermos felizes, e, no fim das contas, estarmos mortos...
OSVADO LUIZ RIBEIRO
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