1. Ah, não fosse trágico, seria divertidíssimo. Não fosse dramático, eu combraria entrada, digamos, uns R$ 50,00, para o mundo assistir a essa pantomima circence: uma extraordinariamente grande massa de liberais e idólatras, acusando a Deus e o mundo de... liberalismo e idolatria...
2. Explico. Quanto ao "liberalismo" - nesse caso, o "liberalismo" teológico, porque o liberalismo teológico não tem nada a ver com o liberalismo filosófico, muito menos com o liberalismo político. Uma das pernas do liberalismo teológico - um Schleiermacher, por exemplo, dissolvido em água com açúcar - é a noção consciente de que as argumentações metafísicas não sustentam mais a Teologia, logo, a fé. Assim, é necessário constituir outro fundamento, outra garantia, para a crença. E ei-la: a experiência. Dissolvido em água com açúcar, esse princípio "liberal" da Teologia européia do século XIX foi transportado por bacilos teológico-catequéticos para a América, extraída de seu contexto crítico-filosófico (Iluminismo e Romantismo), e aplicada na veia das massas, algumas vezes por enfermeiros absolutamente ignorantes, outras vezes, por hábeis estrategistas... Resultado: a massa evangélica, a esmagadora massa evangélica, é, inteiramente, liberal, a começar pelos seus campeões contra-liberais, teólogos de ponta da apologia da Norma...
3. A cada domingo, a cada culto, "experimentam" Deus, sentem-lhe nas carnes, na alma, choram... Cuidam que isso seja "místico", que isso seja "fé" - e, em parte o é - mas, na condião de "garantia" da fé, ah, isso é plenipotencialmente liberal. De modo que um evangélico típico, que nunca leu Schleiermacher, e provavelmente morrerá sem o fazer, acorda liberal, almoça liberal e dorme liberal. E, entre uma coisa e outra, morre de medo de liberais, e os queima em fogueiras, e lhes põe o dedo à cara... Não seria divertido, não fosse trágico?
4. Quanto à idolatria. Paul Tillich escreveu num livrinho que qualquer um lê entre a Páscoa e o jogo do Flamengo, que "Deus é símbolo para Deus", estabelecendo, ainda, aí, a clássica posição metafísica, mas resguardando - serafim da ontologia! - a inacessibilidade ontológica de Deus por meio da distinção entre Deus-enquanto-Deus-mesmo e "Deus"-enquanto-eu-o-concebo, posição clássica do protestantismo esclarecido, alguma coisa entre "tá, eu sei que não, mas, vá lá, que seja". Para Tillich, então, a minha crença em Deus - isto é, "Deus", na forma de minha doutrina, de minha fé, é simbólica, representativa, mediada. "Deus" - o da fé - não é Deus - o verdadeiro. O Deus da fé é simbolo do Deus verdadeiro.
5. Na seqüência, ele assevera: toda fé que trata seus símbolos literalmente, é idolatria. Está lá, no Dinâmica da Fé. Ora, se a fé que trata seus símbolos literalmente é idólatra, eu tropeço em idólatras a cada passo, quando esbarro com evangélicos clássicos. Sim, porque, para a massa evangélica, Deus é tal qual ela, a massa, e tal qual cada um deles, evangélicos, crê que é, porque a sua crença é conhecimento. Acusa-se o católico de idólatra, mas, na prática, que diferença há entre um "ídolo" de gesso e um "ídolo" de pensamento? No final das contas, ambos constroem para si ídolos. Só o material de que seus respectivos ídolos são construídos é que muda... Não se trata, aqui, de condenar a idolatria, mas de assinalar que o evangélico que a acusa no outro é o mais idólatra de todos.
6. Assim, vou-me divertindo. Aí, quando paro de rir, fico triste, porque percebo que cem anos de Evangelho no Brasil produziram pouca libertação - se produziram alguma. Se não aprendemos a pensar, não aprendemos a nos libertar. E vamos caminhando, agrilhoados, equanto cantamos uma liberdade que, a rigor, é tão real quando a nossa sanidade.
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
2. Explico. Quanto ao "liberalismo" - nesse caso, o "liberalismo" teológico, porque o liberalismo teológico não tem nada a ver com o liberalismo filosófico, muito menos com o liberalismo político. Uma das pernas do liberalismo teológico - um Schleiermacher, por exemplo, dissolvido em água com açúcar - é a noção consciente de que as argumentações metafísicas não sustentam mais a Teologia, logo, a fé. Assim, é necessário constituir outro fundamento, outra garantia, para a crença. E ei-la: a experiência. Dissolvido em água com açúcar, esse princípio "liberal" da Teologia européia do século XIX foi transportado por bacilos teológico-catequéticos para a América, extraída de seu contexto crítico-filosófico (Iluminismo e Romantismo), e aplicada na veia das massas, algumas vezes por enfermeiros absolutamente ignorantes, outras vezes, por hábeis estrategistas... Resultado: a massa evangélica, a esmagadora massa evangélica, é, inteiramente, liberal, a começar pelos seus campeões contra-liberais, teólogos de ponta da apologia da Norma...
3. A cada domingo, a cada culto, "experimentam" Deus, sentem-lhe nas carnes, na alma, choram... Cuidam que isso seja "místico", que isso seja "fé" - e, em parte o é - mas, na condião de "garantia" da fé, ah, isso é plenipotencialmente liberal. De modo que um evangélico típico, que nunca leu Schleiermacher, e provavelmente morrerá sem o fazer, acorda liberal, almoça liberal e dorme liberal. E, entre uma coisa e outra, morre de medo de liberais, e os queima em fogueiras, e lhes põe o dedo à cara... Não seria divertido, não fosse trágico?
4. Quanto à idolatria. Paul Tillich escreveu num livrinho que qualquer um lê entre a Páscoa e o jogo do Flamengo, que "Deus é símbolo para Deus", estabelecendo, ainda, aí, a clássica posição metafísica, mas resguardando - serafim da ontologia! - a inacessibilidade ontológica de Deus por meio da distinção entre Deus-enquanto-Deus-mesmo e "Deus"-enquanto-eu-o-concebo, posição clássica do protestantismo esclarecido, alguma coisa entre "tá, eu sei que não, mas, vá lá, que seja". Para Tillich, então, a minha crença em Deus - isto é, "Deus", na forma de minha doutrina, de minha fé, é simbólica, representativa, mediada. "Deus" - o da fé - não é Deus - o verdadeiro. O Deus da fé é simbolo do Deus verdadeiro.
5. Na seqüência, ele assevera: toda fé que trata seus símbolos literalmente, é idolatria. Está lá, no Dinâmica da Fé. Ora, se a fé que trata seus símbolos literalmente é idólatra, eu tropeço em idólatras a cada passo, quando esbarro com evangélicos clássicos. Sim, porque, para a massa evangélica, Deus é tal qual ela, a massa, e tal qual cada um deles, evangélicos, crê que é, porque a sua crença é conhecimento. Acusa-se o católico de idólatra, mas, na prática, que diferença há entre um "ídolo" de gesso e um "ídolo" de pensamento? No final das contas, ambos constroem para si ídolos. Só o material de que seus respectivos ídolos são construídos é que muda... Não se trata, aqui, de condenar a idolatria, mas de assinalar que o evangélico que a acusa no outro é o mais idólatra de todos.
6. Assim, vou-me divertindo. Aí, quando paro de rir, fico triste, porque percebo que cem anos de Evangelho no Brasil produziram pouca libertação - se produziram alguma. Se não aprendemos a pensar, não aprendemos a nos libertar. E vamos caminhando, agrilhoados, equanto cantamos uma liberdade que, a rigor, é tão real quando a nossa sanidade.
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
Um comentário:
Oi, Osvaldo
O pior cego é o que não quer ver.
Porém, quanto as pessoas simples que não sabem nada de Schleiermacher ou Tillich, temos que ter o maior carinho e paciência. Mas, em relação aos "entendidos", ah, em relação a esses, nada de paciência. São míopes mesmo. Não tem desculpa.
Estudaram, estudaram e, infelizmente, não perceberam (ou fizeram que não perceberam) seu auto-engano.
É pra rir e chorar mesmo.
Ah! Morin...
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