quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

(2010/130) Da persistência da memória na dor cotidiana


1. Há personalidades prontas para determinadas espiritualidades. Há personalidades prontas para um kardecismo que explica pecado e dor como modus vivendi assumido nas negociações pré-encarnacionais - pecado e dor estão sobre a mesa, e são renegociáveis, sempre. Há espiritualidades prontas para assumir a condição do pecado e da dor como pagamento de dívidas atuais e passadas, tanto mais remissão quanto mais pecado e dor houver - pecado e dor tornam-se, por assim dizer, quase-gozo. Há personalidades que assumem dor e pecado como destino - pecado e dor tornam-se a areia da ampulheta. E há aquelas espiritualidades que vêm em pecado e dor a insuficiência, a falta, a culpa, a derrota de uma vida para sempre estragada, a mancha de uma folha a ser escrita, e, por isso, inutilizada para sempre. Para essas espiritualidades, o protestantismo funciona muito mais como um amplificador da consciência de culpa do que um amortecedor de sentimentos. Ser protestante, aí, não é opção - mesmo alheio às doutrinas, essa alma é, no todo, profundamente, inapelavelmente, inexoravelmente protestante. Nesse sentido, noções como perdão, doutrinárias, não conseguem apagar, jamais, o calor do fogo a calcinar a alma. Talvez por isso eu deteste tanto Agostinho. É-me um co-irmão de culpas. Talvez a diferença seja que, nele, corpo e mente capitularam. A minha, inutilmente, rebela-se...










OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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