domingo, 31 de janeiro de 2010

(2010/121) Se a vida fosse - mesmo - um jogo


1. Assim que foi lançado, eu comprei o Civilization IV oficial. Na prática, você pode jogar quase tudo na versão pirata - alguns você joga até para testar e, porque é, de fato bom, você acaba comprando. Com Civilization IV, não - eu já sabia que ia ser estupendo... E é.

2. Civilization IV é um jogo que simula "civilização". Você começa controlando um pequeno grupo de nômades quase pré-históricos (toda sessão começa em 4.000 a. C), e chega, depois de horas de jogo, é claro, até a era espacial.

3. Você pode optar pelo nível de jogo - desde o mais "mole", uma barbada mesmo, até um praticamente impossível de agüentar, de tão difícil. Já a vida, a vida, não. Tudo depende de onde você vai nascer - o que é pura loteria. Se você nasce no Canadá, tem mais chances de sua vida ser mais fácil, do que, por exemplo, se você nasce na Etiópia. Mas mesmo em se tratando do mesmo país - se você nasce no bairro dos Jardins, em São Paulo, terá muito mais chances de viver uma vida mais fácil do que se nascer no Jardim Romano, por exemplo. Em Civilization IV, você escolhe o nível de dificuldade - você decide. Na vida - alguém (Deus?) joga você no cenário e, agora, a coisa é contigo... Logo vem um sacerdote com histórias, mas, na prática, cuide-se...

4. Em Civilization IV, você pode salvar o jogo a qualquer momento. Se você dá um comando, e na jogada seguinte, algo de ruim acontece, ou você dá de ombros, e segue em frente, ou, como é o meu caso, você "reloga" o jogo, e recomeça onde havia salvo. Assim, na prática, você nunca "erra", porque, se erra, apaga o erro e tenta de novo. Na vida, não. Na vida, se você diz uma palavra, não dá pra apagar. Se você faz alguma coisa, não dá pra apagar. Se você não diz, não faz, não dá pra apagar. A vida é uma desgraça. Ah, aí a gente aprende... é... tínhamos que arrumar uma justificativa... Os animais também "erram", mas, na prática, nunca sabem disso, ou, ao menos, a vida segue em frente como senada tivesse acontecido...

5. Em Civilization IV, há guerra. Você pode escolher entre rodadas mais ou menos violentas, mas, sempre, haverá guerras. E você sempre correrá riscos de perder aldeões, soldados, expedicionários. Eu odeio perdê-los. Usando o recurso de salvar, se eu perco um soldado, volto o jogo. Não aceito perder um único missionário... Na vida? A vida é uma história de perdas - até os ganhos: antecipam perdas. Amar - é preparar-se para a dor... E não há salvação, salvo aquela de imaginarmos um céu de memórias (se bem que eu não saiba de que modo a memória dará paz à gente, no céu - lembrar-se é remoer-se).

6. Em Civilization IV há religiões - sete ao todo. Quando eu jogo, eu envido todos os esforços para que a minha civilização tenha todas as religiões. Detesto a idéia de uma única religião imperar na minha civilização. Jogo durante muito tempo no módulo que me permite criar missionários, converto todas as cidades a todas as religiões e, então, estabeleço o regime de liberdade religiosa. Na vida? As grandes religiões monoteístas são egoístas, como grandes sistemas viróticos. É patética a sede das religiões de conquista, e mais patética ainda a facilidade com que seus adeptos se entregam ao jogo de poder e conquista, tudo regado a discursos de amor e orações...

7. Não sei por que Deus fez a vida do jeito que ela é. Se ela fosse como Civilization... Se eu pudesse apagar e recomeçar... Eu sei que isso implica em questões de liberdade, porque, se eu apago o meu minuto, apago o de todo mundo, o minuto de seis blhões de pessoas. Inimaginável. Mas - entendam meu desabafo - por que a vida é tão difícil?, por que não há jeitos simples de consertarmos os nossos erros?, e por que essa maldita memória nos condena tanto?

8. Deus, por favor, reloga, vai...


OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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