quinta-feira, 8 de outubro de 2009

(2009/527) Graduação em Teologia - a hora e a vez de um novo paradigma


1. A Revolução Francesa fez seu ducentésimo aniversário e pôs aí mais dez por cento - 220 anos. Inventaram-se as repúblicas modernas. Separou-se o novo Estado da velha Igreja. Quer dizer, do lado de cá do mundo, e, ainda assim, não totalmente. Aqui e ali, a relação permaneceu ativa. Em alguns lugares, dominante.

2. A Teologia permaneceu na Universidade. Na Europa, a "secularização" sequer foi levada tão a sério. É tudo um grande exagero, quando se escreve sobre secularização na Igreja. Quer a Igreja, quer a Teologia - e isso também na Universidade - são fortificações medievais inexpugnáveis. Não podem ser invadidas por fora. Uma flecha aqui, um obus ali, um aríete na porta, vá lá. Mas não passa disso.

3. Não? Ah, fala sério! O máximo que se viu, depois da "seculização", da "emancipação", foi a Teologia Liberal - e olhem a minha expressão de encantamento com ela:



4. Tão rápido quanto nasceu, foi morta - ela era um desmancha-prazer na búlica das crianças animadas. A Teologia na Universidade permaneceu, então, "privilegiada". Como se as Ciências Humanas não tivessem chegado lá - e não chegaram, mesmo... Nas Universidades européias (nem falo nas estadunidenses!), a Teologia continuou olhando para os céus e vendo Deus, falando com Deus e ouvindo Deus. A fé permaneceu viva. Os doutores em teologia são os missionários universitários. Ou doutores de Deus - doutores em divindade...

5. Quando tiver passado a Era das Repúblicas, e se uma nova onda obscurantista, ops, teológica, voltar a varrer o Ocidente, não terão sido as Igrejas as guardiãs da sã doutrina - mas os doutorados em Teologia nas... Universidades! As Igrejas vão destroçando, à conveniência dos xamãs do calendário, os mágicos das efemérides, a sã doutrina. Nas Universidades, elas vão sendo depuradas, tornadas "científicas", transformadas em "racionalidade". Vai-se preparando, assim, a sua preservação, como que e formol. As Universidades teológicas, seus doutorados, preparam a "luz" neo-teológica, depois das "trevas" do hiato moderno...

6. Também no Brasil. Um tanto quanto - se diz - positivista, a Universidade brasileira não gostou de brincar de Teologia. Assim, ficamos com a Igreja dando as cartas por uns setenta, oitenta anos. Em meados da segunda metade do século XX, contudo, por força e graça da tradição alemã - faz todo sentido! -, a Teologia ingressou no MEC, usando o elevador privativo. Entrou pela Pós-Graduação estrito senso - mestrado e doutorado.

7. Alguma radical transformação ela, a Teologia, sofreu? Que eu possa indicar, não. Que a Igreja tenha reagido aqui e ali, isso fala mais da condição fundamentalista da Igreja do que de que da condição científico-humanista da Teologia que entra no MEC. Não falo de Exegese, que essa, assim, a depender de alunos e professores, rompe radicalmente com o paradigma platônico-metafísico e confessional-normativo. Mas a Teologia, com "T" maiúsculo, das sistemáticas - ah, quem há de dizer que essa não se fez e faz igualzinho a que se fez e faz nas Univrsidades pelo mundo, espelho "racionalizado" da fé homilética dos púlpitos?

8. A Teologia da Pós-Graduação me parece, com todo o respeito que devo aos meus companheiros, uma extensão da catequese. Está bem que, nas Universidades, a retórica é "acadêmica". Mas, se você sacode o livro, se você assopra a poeira dos gestos pedagógicos, fica o "núcleo" incontestável - a "fé", a favor da qual, ontem, teólogos, companheiros meus de caminhada, apelavam - deixem a fé!, deixem a fé!, Teologia é fé!, Teologia é fé!... Catequese de luxo. Penso que não peco, se digo que a CAPES não conseguiu transformar a Teologia - antes, serviu de clareira para a sua auto-proteção, para seu isolamento...

9. E essa é a questão de fundo. Quando, em 1999, a Teologia entrou no MEC, agora, pela porta de serviço, por onde entram as ciências comuns, ela viu-se pressionada por todos os lados justamente pelas "irmãs mais velhas" - as mesmas que haviam saído de casa, porque a mãe era madrasta (do tipo de madrasta má, naturalmente, porque há as boas madrasta - mas não era o caso). Na Graduação, não é possível para a Teologia enfiar-se num mosteiro e desenvolver suas teses teológicas, próximo-reveladas, próximo-catequéticas. Na Graduação, não é a Telogia que fala do Homem - é a Antropologia, é a Biologia, é a Paleontologia, é a História. Na Graduação, não é a Telogia que fala da mente - é a Psicologia, são as Ciências Cognitivas. Na Graduação, não é a Teologia que fala do Universo - é a Física, é a Astrofísica, é a Microfísica, é a Química, é a Geologia. Na Graduação, não é a Teologia que fala dos homens - é a Sociologia, é a Fenomenologia. Do que é mesmo que a Teologia fala, na Graduação?

10. Anotem, para eventualmente ter como dizer que estou errado: na Graduação, a Teologia é obrigada - sim, obrigada - a ouvir. E ela não tolera nem uma nem outra coisa: ser obrigada a alguma coisa e ouvir. A Teologia gosta é de dar ordens e de falar. Receber ordens e ouvir? Não ela, a Teologia...

11. Por isso a Gradução é a hora e a vez. É a Graduação que pode - e só ela - levar a Teologia a querer tranformar-se. Só a Graduação pode pôr a Teologia em ciúmes, reduzindo-a a um discurso sem fundamento, exigindo dela uma reavaliação de si mesma, de seus estatutos epistemológicos, de seu objeto, de seus métodos. Só a Gradução. A Pós-Graduação teve sua oportunidade, e a desperdiçou. O que é um mau sinal, porque, geralmente, os gestores das Graduações, seus professores, são os mesmos da Pós... A Pós não qis, até uma, uma Teologia verdadeiramente científica. E a Teologia precisa querer transformar-se.

12. Se ela vai querer? Bem, se "ela" pronunciar-se por reitores e coordenadores de cursos ideologicamente alinhados com a política teológica de Igrejas - duvido. As Igrejas não estão engajadas em rotinas de conhecimnto, mas de catequese e conquista de almas. Teologias a ela atreladas tão-somente refletirão esse phatos - como até hoje (sempre ressalvadas honrosas e raras exceções). Vejo-os, já, em movimento (para isso sempre há recursos,) em articulações, em pressões... A Teologia, que é tão divina, nessas horas, sabe fazer o jogo do mundo.

13. Meu coração está agitado. Depois do PARECER CNE/CES 118/2009, um recuo seria desastroso. Os deuses continuarão a dar aulas no MEC - e, agora, no andar de baixo. E isso não será exatamente uma "honra" para as Ciências... Muito menos para a Teologia - mas "honra" é uma coisa que falta à Teologia desde que assenhoreou-se do mundo...


OSVALDO LUIZ RIBEIRO

Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Sobre ombros de gigantes


 

Arquivos de Peroratio