terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

(2009/020) Crítica e dialética - sobre coisas tênues, mas vitais


1. Leio, agora, um artigo de Karl Popper - O que é Dialética (Karl Popper, Conjecturas e Refutações, 2 ed. Brasília: UnB, 1982). Mais uma vez, encontro bem formulado aquilo que, em minha experiência, "pressinto" quase que intuitivamente. Popper considera que o principal risco da dialética é a transformação das contradições em componentes naturais do processo de conhecimento, ao passo que a crítica pensa as contradições como denúncia da reflexão em face de incoerências relativas presentes na tese.

2. Nos dois casos, a contradição não é escamoteada. Contudo, para a dialética, a contradição é a outra parte, a alma gêmea da "tese", o que, ao cabo, termina por dar à contradição um caráter de aparente e pressuposta neutralidade - se a contradição é intrínseca ao processo, ora, então o processo não distingue mais entre "verdadeiro" e "falso", já que "verdadeiro" e "falso" são, apenas, nomes antigos para o que, agora, dialeticamente, sabe-se tratar-se, apenas, de premissa a e premissa b, e a crítica, então, tende a ser substituída por um abraço caloroso e metodológico a tudo quanto se apresente na ágora, uma vez que, não importa o que lá se apresente, que espantalho, que simulacro de "saber" peça a palavra, é antítese?, co-tese?, então seja bem-vinda! Aquilo que é necessário combater, pela crítica, acaba o filme como namorada do mocinho!

3. Popper alerta que essa atitude pode, simplesmente, inviabilizar o progresso crítico do conhecimento. Concordo. Sinto o mesmo cheiro nas teorias recentes de metáfora - tudo é palavra, logo, valem pelo que produzem, e não pelo que dizem, a rigor, sobre a realidade -, de "tradição" - eu sou isso porque em mim está tudo o que vem antes de mim, como se eu fosse a fossa séptica do mundo! Não, alto lá... A tradição pode até despejar em mim seu esgoto, mas tenho cá minhas estações de tratamento, ora bolas!

4. Desgosto de toda retórica, toda atitude, toda prática, que escamoteie a crítica dos discursos, das atitudes e das práticas - assim como desgosto, também prostaticamente, dos discursos críticos de fachada, de uma gentinha politiqueira de quinta categoria. Não se trata dessa crítica. Trata-se de olhar no olho de cada conjunto de valores e imposições que me passa pela frente, pára (permitam-me despedir-me aos poucos desse querido acento) e me quer fazer escravo seu. Crítica epistemológico - é disso que falo, e não da maledicência programática e pornográfica de algumas políticas de esgoto - domésticas até.

5. Obrigado, Popper, por ter feito com que mais um pedaço de mim viesse à tona de meus olhos.


OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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