1. Acho que o que marca minha caminhada pelo campo da religião e da Teologia (e mais recentemente, das Ciências das Religiões), é a pesquisa do Antigo Testamento, que gosto mais de tratar como Bíblia Hebraica.
2. No fundo, o que me levou a ir para o Seminário, estudar Teologia, foi uma frase escrita em hebraico em um quadro de giz de uma sala do campus avançado de Mesquita do Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil. Descobri por causa daquilo que a Bíblia fora escrita em hebraico, ao menos o AT, e que havia lugares em que pessoas "especialmente escolhidas" podiam estudá-la. E lá fui eu.
3. Isso foi em 1987. Eu era um fundamentalista religioso cristão batista na época. Mas eu era apaixonado pela Bíblia, e acho que amava mais a Bíblia em si do que o que me disseram dela, porque quando comecei a ter contatos muito, mas muito tímidos que fossem, com a crítica, progressivamente abandonei o fundamentalismo e até a religião, conquanto isso tenha demorado duas décadas pelo menos. O fundamentalismo levou dois anos para ir para o inferno, mas a religião e a fé, muitos anos.
4. Foram-se a fé e a religião, mas não a paixão pela Bíblia. Mas não é que eu ame a Bíblia dos púlpitos. Não. A Bíblia dos púlpitos não é a Bíblia, é a interpretação cristã denominacional da Bíblia. Não gosto disso mais. Eu gosto é da Bíblia tal qual seus autores, há séculos, mais de dois milênios, escreveram, e me dedico a essa tarefa. E ela está soterrada debaixo de dois mil anos de pregações cristãs... Acredite: o Antigo Testamento não tem, historicamente falando, nada, absolutamente nada a ver com a fé cristã. É outro mundo. Se você o lê e se sente em casa, não está lendo de fato.
5. No Brasil, há bem pouca gente que realmente se dedica a isso. Na maioria esmagadora dos casos, o trabalho com a Bíblia está atrelado à Teologia e à Igreja, ainda que em ambientes progressivos, e onde a Bíblia está a serviço de algum projeto que não ela mesma, esquece, não se vai chegar onde se é preciso, mas vai ficar-se voejando em torno da "utilidade" social dela. Os fundamentalistas fazem a mesmíssima coisa, conquanto os valores, confessemos, sejam diferentes à beça entre fundamentalistas e progressistas. Mas a Bíblia é meio para ambos.
6. Eu fico contente de poder olhar no espelho e dizer para mim mesmo que eu adoraria ter-me encontrado comigo mesmo, esse que agora sou, quando era jovem estuante de Bíblia. Eu me tornei aquilo que aquele jovem de vinte e dois anos queria. Eu o teria ajudado a economizar uns vinte anos de cabeçadas, de traduções ruins da Bíblia, de comentários baseados em traduções ruins. Fico feliz de ter-me tornado quem me tornei em Exegese. Mas eu posso dizer isso: me tornei quem eu gostaria profundamente de ter encontrado no começo de minha carreira. Isso deve significar alguma coisa, 32 anos depois.
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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