quinta-feira, 22 de maio de 2014

(2014/485) Um upgrade no fundamentalismo


O sujeito é crente novo, e, como todo crente novo em igreja evangélica, faz-se fundamentalista. Nessa fase, se está escrito que Jesus ressuscitou a filha de Jairo, então ressuscitou...

Passa um tempo. Ele estuda um pouco. Estuda muito. Mas não negocia sua fé interior. Não me perguntei o que é isso e o que isso tem de diferente do estágio anterior, mas ele interpretará essa sua nova fase como "libertação" do fundamentalismo. 

Sabe nada, inocente...

Mas, ele, achando que sabe, faz como os filósofos gregos: vai procurar sentidos ocultos na mitologia velha. E ele encontra - claro! Se é ele mesmo que inventa, então é claro que encontrará... 

E inventa sentidos éticos, morais, "espirituais" (que ele começa a distanciar de "religioso", porque, agora, ele é uma nova criatura e religião é coisa de gente menos iluminada). Esses novos sentidos, ele diz e quer que todos digam, porque é o óbvio, está no texto, é sagrado, faz parte de uma dimensão profunda da narrativa...

Ahn-ham...

Ele podia ter tomado outro caminho. Podia ter lido as centenas de testemunhos de ressurreição em todas as culturas, desde o Egito e Grécia até as ameríndias, todos os mitos, curas, milagres, maravilhas, poderes, porque a literatura religiosa do mundo nada mais é do que uma explosão de sobrenaturalidades fantásticas... E, então, humildemente, ele entenderia que se trata de uma coleção antiga de mitos, que podem ser acessados e atualizados na forma de narrativas mágicas, mas que não acontecerão, porque não acontecem...

Mas não. Isso complicaria sua "espiritualidade" - ele até perderia a vontade de ir à igreja. Tudo desmontaria...

Assim, o máximo da evolução é a transposição do tipo de fundamentalismo que se verá ali: de um fundamentalismo grosso, duro, literalista, para um fundamentalismo refinado, líquido, metafórico.

Mas tire um Raio X de um e de outro e verá a mesma coleção de ossos...

Que pena.

Qual dos dois fundamentalismos eu prefiro? Bem, o primeiro é mais honesto: ele é fundamentalismo porque é ignorante e cabeça dura. O segundo, porque fez contas.






OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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