domingo, 15 de dezembro de 2013

(2013/1418) Quando temos a suspeita, mas, ainda não, a coragem

Estava lendo Losurdo agora há pouco. Losurdo é impiedoso com Nietzsche e com sua recepção ingênua - será mesmo 'ingênua'? - no século XX pelos filósofos da transformação e reforma pelo caminho do meio. Que tal ajeitarmos as coisas sem revolução, hã?, eles dizem. E as coisas vão, sem serem ajeitadas...

Em Democracia ou Bonapartismo, mais uma vez, e por várias vezes, Losurdo menciona Nietzsche e sua radical posição anti-democrática. A certa altura, ele lembra o leitor sobre o discurso de Nietzsche sobre os intelectuais de esquerda de seu tempo. Losurdo se refere a Assim Falava Zaratustra e à seção das tarântulas.

Ao ler a declaração de Losurdo - Nietzsche tratara os intelectuais de esquerda, libertários, como tarântulas -, minha cabeça teve todos os fios de cabelo encrespados. Ora, eu li isso, há alguns anos. A despeito de ter lido quase tudo de Nietzsche, eu nunca o havia tomado como um anti-democrático, um aristocrático para quem o povo é gado, instrumento que fala, nada mais. Se Nietzsche chama os intelectuais de esquerda de tarântulas, eu não me dei conta? Como pude ter lido e não percebido?

Fui em meu velho Zaratustra, já despencando de tantas leituras antigas e pela ação do tempo e dos ácidos. Procurei a seção. Achei. E sorri. Aprendi mais uma coisa sobre mim e sobre os nossos processo de leitura...

As quatro páginas têm anotações que remontam há dez anos ou mais. Justamente nas seções em que Nietzsche fala claramente que os pregadores da igualdade são tarântulas, eu pintei de cor e anotei meu estranhamento. Numa página, julgo ter me reconciliado, fazendo a leitura de acomodação que se faz - ainda hoje, na alta filosofia. Mas, na página seguinte, orgulho-me de ter escrito o que vai na nota 1, sobre a página. Não tive a coragem suficiente de concluir o que já podia ter concluído, mas não capitulei à lambeção afetiva do ídolo: "não te compreendo, meu amigo".

Minha leitura de Nietzsche foi dirigida por libertários que o torceram, que o deturparam. E eu gostei tanto da deturpação que eu mesmo lia Nietzsche atrás e através dessa deturpação - que eu não entendia como tal, achava que era a expressão de sua própria vontade de liberdade para todos. Mas não - canalha, não pretendia a liberdade de todos...

Seguem as páginas.

Que aprendamos a ser honestos conosco mesmos. A honestidade por si só não é suficiente, às vezes, para realmente entendermos o que lemos (talvez sempre precisaremos de Losurdos!). Mas, ao menos, não teremos vergonha de ter enfiado a cabeça no traseiro de alguém, para adulá-lo, a despeito do que nossos olhos leem...

Nietzsche, Assim Falou Zaratustra








OSVALDO LUIZ RIBEIRO

Um comentário:

Al disse...

Século das Luzes, início da tematização do Homem como sujeito e objeto do conhecimento. Kant sintetiza esse movimento. O Sujeito Transcendental nivela os limites das faculdades humanas...

Nivelação das potencias da vida pelos limites transcendentes de uma forma de Homem.

Nietzsche completa a crítica de Kant dizendo não bastar sua crítica já que é insuficiente razão criticar a razão, é preciso um elemento mais vital, imanente: a vontade de potencia como princípio criador da vida; a vontade de potência é o elemento genético e criador da vida múltipla, como pode então a vida se submeter a uma forma Igual, que nivela todos os homens?

Sobre essa falsa igualdade, se sustenta uma Democracia que nunca foi real, nunca se efetivou...a historia desmonta os postulados. A Democracia sempre foi a gestão de uma elite.

Losurdo é um tarado...

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