sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

(2013/004) De infância, crescer e aprender o que é a fé

1. É curioso pensar em como se podem tomar axiomas inadvertidamente...

2. Meu caso. Fui criado em ambiente eclético - os temas das conversas de minha mãe com seus amigos variava de parapsicologia a ficção científica, passando, naturalmente, por religião.

3. Neste quesito, vivi grande parte de minha adolescência e infância tardia em centro de Umbanda (no Rio, mas próxima do Candomblé do que em outras partes, mais próximas do Catolicismo).

4. Nos cultos, as pessoas incorporam os orixás. Não é nada silencioso, muito pelo contrário: atabaques, cantos, palmas, pés arrastando no chão do barracão.

5. Não posso dizer que havia "racionalidade" à minha volta... Se você já se pegou deitado, olhando para o céu, e pedindo aos marcianos que viessem buscá-lo, ou olhando para um pregador de roupa, tentando movê-lo com a força da mente, ou sem saber direito o que era aquela sua mãe incorporada de um preto-velho, então você deve imaginar de onde vim...

6. Hoje, minha experiência com essas questões - todas elas - tem duas expressões: uma fúria racional e rigorosa sobre tudo e todos e um silêncio recatado sobre o Mistério (se é que há e o que quer que seja). 

7. Não somos simplesmente o desdobramento bruto e mecânico da infância. Salvo, contudo, se alguém disser que somos, mas, às vezes, amamos e repetimos aquilo e, às vezes, odiamos e rechaçamos...

8. Mas eu adorava aquilo. Havia momentos ruins, como dormir em esteiras até de madrugada, quando minha mãe ia às festas de santo. Ainda hoje, acordo, às vezes, com aquela sensação de desconforto...

9. Mas não há nada naquilo que eu posso dizer que tenha odiado. Nada. 

10. E, todavia, meu modo de pensar hoje é absolutamente diferente de todo aquele mundo...

11. Talvez haja apenas uma ligação: um desejo de verdade... Lá, e também na igreja batista, aos 18 anos, a verdade é o que dizem pra você que ela é, e você vai na onda...

12. Mas, aí, você aprende a fazer as perguntas. O desejo de verdade permanece - isso eu acho. O que mudou é que não pergunto mas à minha mãe, à mãe de santo, minha tia, ao pastor, ao Uri Geller, ao médium, a Blavatsky...

13. No problema da verdade, nenhum de nós tem uma posição privilegiada.

14. Se me desespera a questão, desespera a eles, igualmente. E, se eles criaram suas respostas-tampões, bem, isso é com eles: aprendi que no campo da metafísica não há respostas possíveis para além do teatro da fé.

15. Posso viver com isso.

16. Ou melhor - posso viver "sem" isso...



OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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