terça-feira, 17 de julho de 2012

(2012/574) Duas pequenas parábolas singelas sobre dívidas e pagadores de dívidas

1. José não conheceu João. Mas João assinou uma nota promissória há uns seis mil anos, contados e pesados segundo as contas e os pesos de Armagh James Asher. Não pergunte por que, mas quem tem que pagar essa nota é José. Paulo garante.

2. José ouve falar que Manoel tem dinheiro, porque ele é dono da cidade onde moraram João e José. José, dizem para ele, pode pedir a Manoel para pagar a nota de João, que ele não assinou, mas que vai ser cobrada é dele. Se ele pedir, Manoel paga. Se não pedir, José pagará a dívida... E, senhores, a dívida é impagável... Paulo garante.

3. José não conheceu João. Mas João assinou uma nota promissória há uns seis mil anos e tal e coisa. José não sabe, mas, se soubesse, não faria a menor diferença, mas é ele quem vai pagar a nota que João assinou. Tá ferrado...

4. José não sabe, mas Manoel, o dono da cidade em que moraram os dois, tem dinheiro que é uma coisa de doido. Sem que José saiba, nem da dívida, nem do pagamento, Manoel pagou a dívida para José, e está tudo certo - estão todos quites... Não há mais dívida alguma. Nem para José. Nem para João. Nem para ninguém. Manoel pagou. Tá pago.

5. Como se vê, as duas histórias são quase iguais. A diferença é que a primeira quer que o sujeito "levante a mão" e peça Manoel para pagar a dívida...

6. Bem, se for para escolher uma das duas historiazinhas, que são o que são, histórias singelas sobre dívidas e pagadores de dívidas, escolho a segunda...

7. Os que gostam da primeira história não se conformarão. Não estão, de fato, interessados em que a dívida seja paga, mas em que eu faça o que eles querem, que eu escolha a história deles - e acabarão desejando, no fundo da alma, que Manoel não pague minha dívida e eu me veja na condição de devedor eterno...

8. Assim caminha a compaixão dos contadores de histórias...

9. Há que encher o teatro.

10. Há que lotar a plateia...

[heresia de arremate: não acham que Jesus poderia ter contado essa pequena alegoria de histórias singelas de dívidas e de pagadores de dívidas?, ele, que disse àquela mulher, apócrifa é a passagem, alegam os eruditos - e também os confessionais! - que ele não a condenava?]



OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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