terça-feira, 27 de março de 2012

(2012/326) Não, isso não é "educação" - sobre a castração crítica nos Cristianismos (texto pesado, melhor não ler)

1. "Se quisermos escravos, é tolice educá-los como senhores". Quem disse isso foi Nietzsche, (Crepúsculo dos Ídolos, Incursões de um Inatual, 40). Ele o disse com a autoridade de um escravagista e anti-democrático. Sob a sua ótica, ele está certíssimo: se ele quer escravos - e os quer! - não é inteligente dar-lhes conhecimento.

2. De certo modo, a máxima vale para exércitos. Trata-se de uma força armada poderosa. É preciso, pois mantê-los com as rédeas curtas, com os freios bem montados. Não seja o caso de a armada virar-se contra a costa. Assim, treinamento exaustivo, ocupação, inculcação de doutrina militar, de autoridade militar - que a massa de homens esteja pronta a ser dirigida: para a direita, direita, para a esquerda, esquerda, marcha soldado, cabeça de papel, se não marchar direito...

3. Todavia, não há outro lugar onde a "educação" é mais cínica do que nos ambientes dos cristianismos - e vou resguardar alguma possibilidade de exceção mais por uma questão de consciência, do que, propriamente, de fato.

4. É cínica, a educação cristã, porque, na prática, ela é uma mistura de escravagismo das ideias e de militarismo religioso. E, na prática, não se quer "senhores" (de si) como resultado do processo, mas ovelhas obedientes: logo, de forma surpreendentemente nietzscheana, a educação cristã, como não quer senhores, mas escravos ("de Deus"), de fato educa suas ovelhas para a escravidão heterônoma, a isso chamando de "liberdade" e "fidelidade".

5. Não se ensina o homem a pensar. Ensina-se a repetir as linhas e os conteúdos de pensamento da ortodoxia - seja ela qual for, porque há milhões de ortodoxias, cada uma parecendo heresia aos olhos da outra. Assim, cada aluno de educação religiosa é inculcado servilmente nos limites de determinada ortodoxia.

6. Há uns 12 anos, fui indicado pelo Pastor Luiz Roberto dos Santos, responsável (um dia, ele disse que era o "irresponsável") por meu ingresso na cátedra do Seminário do Sul, em Nova Iguaçu, 1993 e na Sede, 2001 (ele não apenas fez uma, mas duas vezes - e ia fazer a terceira! [obrigado, Luiz, serei sempre grato a você]) me indicou para a direção do Instituto Batista de Ensino Religioso - IBER, para lecionar Antigo Testamento.

7. Fui à entrevista. Era professor do Batista do Sul, coisa em si já "perigosa", a diretora deixou "escapar". Mas era indicado de confiança, também me disse, olhando dentro dos meus olhos, eu, rã, de charco... Dirigiu-se à estante, tomou um livro nas mãos, e me disse que eu deveria ensinar por meio daquele livro, e me apresentou o sumário - era dele que as alunas deveriam aprender. Era um livro  conservador e reacionário, sobre o Antigo Testamento. Um crime pedagógico.

8. Eu poderia sorrir, fingir que aceitava as condições, usar o livro e, lentamente, implodir com ele. Mas simplesmente agradeci, saí e nunca mais voltei. Não para lecionar livros de encomenda, de "educação para o serviço".

9. É o mesmo em todo canto: abafar a consciência das pessoas. Mandar que leiam livros destrutivos, castradores, manipuladores, falsos, mentirosos, sonegadores de informação, deturpadores, aviltantes - e a isso se chamar por essas palavras odiosas: espiritalidade, fé, devoção, fidelidade, missão (a pior de todas - se há uma palavra-crime na fé é essa: missão).

10. Não, a fé - e nisso os cristianismos são inalcançáveis, a despeito dos esforços contemporâneos de grande parte do Islã - não educa para a liberdade: educa para a escravidão. É cínica, todavia, porque não chama a escravidão de escravidão, chama de liberdade. A fé não vê os crentes como senhores de si - desenha-os como "escravos de Deus", e eles acabam sendo escravos dos donos de Deus.

11. Elisa, minha amiga, disse que hoje há "concorrência", que os fiéis da igreja de cinco siglas podem ir para a igreja nova, de dezoito siglas. É como trocar McDonald's pelo Bob's. É como trocar de senhor, de senzala. Porque numa e noutra não se querem senhores, querem-se escravos - e a educação aí será o útero de uma ninhada de pequenas e bovinas criaturas de amém.

12. A isso se chama educação cristã.

13. Talvez seja o medo de que os crentes saiam dos trilhos da moral. O Evangelho tem horror à imoralidade - o diabo veste roupas imorais. É como se a mãe e o pai temessem que o filho caia escada abaixo. Então, arrancam-lhe as pernas e os braços. Que ele cante, cante, até chorar de alegria, nosso filhinho querido...



OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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