quinta-feira, 4 de agosto de 2011

(2011/463) Reflexos pós-noturnos de uma conversa acadêmica de véspera - ou da mariposa de Darwin


1. Riram de sua teoria: é um louco esse homem!, e, no entanto, em Madagascar, batia as asas e esticava seu longuíssimo probóscide darwiniano (sherlockiano!) a especializadíssima e predita Xanthopan morganii praedicta.

2. Eu conhecia a história um pouco diferente - o mesmo Darwim, a mesma mariposa, a mesma orquídea. Mas os detalhes me chegaram de outro modo. Todavia, James Batman, um dia, apresentou a Darwin um exemplar de orquídea de Madagascar (e de outras poucas regiões da África): Angraecum sesquipedale - uma das pétalas transformara-se num longo tubo, de trinta centímetros, no fundo do qual havia depósito de néctar.

3. A assertiva de Darwin foi direta: tem de haver, na ilha - onde ele nunca teria ido! - uma mariposa com um probóscide de 30 centímetros, de modo que a relação "simbiótica" entre a mariposa e seu probóscide de 30 cm e a orquídea e seu tubo nectarino de 30 cm permitisse a fertilização da flor através do ato de alimentação do inseto...

4. Mas parece que riram dele... Todavia, não por muito tempo. Talvez uma implicância por conta de sua hipótese evolucionista - e, a gente sabe, tem muita gente que salta da cadeira: filha de macaco, não!, eu não! No outro canto da sala, balançavam a cabeça: uma bizarra mariposa com uma tromba de 30 centímetros... só faltava essa agora! O que virá depois - peixes com sua própria central elétrica? O próprio Darwin teria exclamado, ao escrever para um amigo: "Deus do céu, que inseto sugará isso?"

5. Darwin morreu e nunca foi a Madagascar. Nunca viu sua mariposa. Todavia, morreu certo. Se ele a tivesse visto ou se ele não a tivesse visto, em tese, teria dado no mesmo - porque, independentemente de ele a ver ou não, ela estava lá... ela esteve sempre lá.

6. Em 1903, foi identificada. Depois disso, foi filmada, catalogada, o Google está cheio de imagens dela. Os senhores certinhos, risonhos e divertidos, estavam, mais uma vez, errados: a saga de um homem só contra 200, contra todos, acontecia sem alardes, sem sensacionalismos, um homem encarando - por intuição e cálculo, por observação e analogia, por reflexão e crítica, a "verdade". Olhou, previu... Simples assim. Sim, os certinhos de hoje talvez se riam da verdade, mas, no fim das contas, a rainha tem seus bobos da corte...

7. Trata-se da Xanthopan morganii praedicta ("praedicta" justamente em honra de ter sido "prevista" por Darwin!). Ela adora enfiar sua tromba no tubo de néctar da orquídea de Madagascar, e, em troca, já que, para o fazer, acaba esfregando a testa nas regiões de pólen da flor impudica, quando vai noturnamente lamber as intimidades de outras orquídeas, deixa lá os pólens que recolheu cá, e as orquídeas fazem seu sexo intermediado...









7. Por favor, senhores - um pouco de bom senso... Não é por que Darwin disse que deveria haver lá uma mariposa assim que passou a haver lá uma mariposa assim: não sejamos tolos! Isso seria magia! Não seria - tampouco - por conta dos risos que Darwin suportou que deixaria de haver uma tal mariposa lá, se lá houvesse. Darwin nada fez, tampouco os senhores risonhos-certinhos, quanto à existência ou não da Xanthopan. Ao contrário do que algumas correntes de pensamento pretendem, não é ao fato de o homem dizer que se deve a verdade... Darwin apenas reconheceu - antecipadamente, indiciariamente - a verdade: o que Darwin disse estava certo, era verdadeiro. Ponto. Nossa "Morgana das fadas noturnas" sempre esteve lá, lambendo o sexo das suas orquídeas preferidas, esfregando a face em suas intimidades, e trocando prazer por prazer, vida por vida... Sempre estiveram lá as duas, a orquídea e a mariposa. Mesmo se nem Batman, nem Darwin nem nós a víssemos, assim, tão linda, ainda assim ela teria estado lá, ela estaria lá... Parece que depois de matarmos Deus, desejamos tornarmo-nos nós mesmos os "criadores" da verdade...







OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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