sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

(2010/619) Sobre acasos, intenções, sorte e destino - ou será sobre "Deus"?


1. Aqui, o fato. Filipinas. Um homem está na fila da Loteria. Chega a sua vez. Ela vai comprar um bilhete. Antes que possa aproximar-se do balcão, u'a mulher entra abruptamente na sua frente e passa-lhe a vez. O homem respira fundo, retorna ao seu lugar. A mulher compra um bilhete. Na seqüência, o homem compra o bilhete seguinte. Quando sai o resultado, eis que o homem terminara por comprar o premiado, o maior pêmio da Loteria nas Filipinas, U$ 17 milhões (cf. BBC Brasil).

2. Aqui, a reflexão. Pois bem, se a mulher não furasse a fila, o homem não teria ganhado o prêmio, porque compraria o bilhete não-premiado, já que o bilhete premiado era o seguinte. Para ele, foi bom não ter tomado seu lugar da mulher, que o roubara...

2. Se a mulher tivesse furado a filha depois do homem, e não antes dele, teria comprado o bilhete. Acabou comprando um bilhete não-premiado, e só ganhou tempo com o lance, já que não perdeu tempo na fila. A sua ação não a ajudou a ganhar o prêmio - mas ajudou o homem aparentemente prejudicado, aquele de quem ela tirou a vez.

3. A pessoa que estava atrás do homem de quem a mulher furou a fila acabou deixando de comprar o bilhete que, pela ordem da fila, seria dele. Se a mulher não tivesse furado a fila, o homem à sua frente teria comprado o bilhete que, na prática, a mulher comprou, e o bilhete premiado, que o homem da frente acabou comprando, seria comprado por ela, a pessoa que estava atrás do homem premiado. No fundo, o fato de a mulher ter furado a fila tirou desse homem a sorte que lhe acenava.

4. Acaso? Sorte? Destino? "Deus"? Estamos diante do quê? Se de Deus, que modo curioso de ação, não? Usar uma fura-fila... Mas, como assim, "usar"? Deus faz das pessoas marionetes? As ações erradas de alguns são o efeito da vontade divina para benefício de outros, e prejuízo e outros ainda terceiros... Bom Deus, esse - tem suas próprias leis e regras...

5. Sorte? De quem? A sorte de um é o azar do outro... A pessoa que estava atrás do homem que comprou o bilhete premiado - agora entramos no mundo dos "e se" - pode ter se atrasado, porque o motorista do ônibus fez corpo mole no trabalho, demorou a sair do ponto, paquerando uma morena...

6. E quanto à instrução evangélica de dar a outra face...? Ela fez muito bem ao homem que acabou comprando o bilhete: a ele acabou cabendo o bilhete premiado. Mas isso só ocorreu porque a vez da pessoa atrás dele foi alterada. Caminhar a segunda milha foi bom para o primeiro, mas péssimo para o segundo.

7. E mais - agora que saiu a notícia, quando revelada a identidade do homem, se a pessoa que estava atrás dele, na fila, e que efetivamente compraria o bilhete, processar a lotérica, porque a fila foi quebrada? Há implicações de direito aí?

8. De concreto, alguém ganhou alguns minutos no dia - talvez, até, segundos, apenas; alguém ganhou 17 milhões de dólares; e alguém ganhou a desagradável condição de fazer parte das estatísticas dos azarados. E quem decide o que cabe a quem?


OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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