(2010/388) Da esperança, da vida, e de trocadilhos trocados

1. "Bom é ter esperança, e aguardar em silêncio a salvação de Yahweh" (Lm 3,26). Acho inspirador esse verso. Mas ele só diz alguma coisa a quem já esteve na condição de lhe restar apenas a esperança. Não resta mais nada, só esperar - ou desesperar. Nesse momento, alguém diria ao esperançado que ele é um tolo, e que desesperar-se revelaria toda a sua dignidade. Mas há situações em que não resta mais nada, sequer a dignidade, esvai-se o ser de tal modo, que resta apenas uma janela - esperar, ter esperança...

2. Ouve-se aqui e ali: enquanto há vida, há esperança. Mentira. A vida não tem psiquê. Quem tem esperança é a alma, a psiquê humana, a gente de carne e carbono. Logo, há condições em que a vida ainda está naquele corpo, mas a esperança, não mais, ela se foi. Eis ali, deitado, um corpo. Ele espera apenas o último suspiro, para ir-se, e não se vai antes por absoluta falta de energia até para a derradeira ação absolutamente humana - matar-se. Onde há suicídio, ainda há vida determinante, ainda há atividade, há alguém ali dentro daquela casca desesperada. Mas há situações em que sequer matar-se é possível, porque, para matar-se, é preciso, ainda, se estar vivo...

3. Invertamos a fórmula: enquanto há esperança, há vida. Agora, sim, as coisas se encaixam. Não há fundo do poço, se você tem esperança. Não há tempestade suficientemente aterradora, se você tem esperança. Enquanto você pode ter esperança, a vida está de pé, aberta. Há dor, mas há esperança? Então há vida. Enquanto a pessoa tem esperança, ela é humana. É quando ela desespera, que ela morre, e, aí, a vida acaba. Mas, enquanto ela for capaz de esperar, de ter paciência, de ter esperança, a vida está ali, latente, como a semente. Uma, duas gotas d'água, e ela verdeja, viceja, vinga, vira carvalho sagrado.


OSVALDO LUIZ RIBEIRO