domingo, 7 de junho de 2009

(2009/336) Nossos professores


1. Falo de modo geral, professores, homens, e professoras, mulheres. Fanuel me fala deles, agora há pouco, e me fez pensar neles - e, indiretamente, em mim, professor, em nos, professores. Será que somos aquilo que gostaríamos que nossos professores tivessem sido?

2. Teologia é um curso diferente dos demais. Mexe com as tripas. O que está nas tripas, às vezes, sobe para a cabeça... Às vezes sai pela boca... Ouve-se de tudo. Às vezes, parece um circo. Às vezes, uma missa. Outras, uma batalha. Ainda outras, um cemitério. Aquelas, ah!, aquelas - essas são como que afrodisíacos cognitivos, u'a mão a arrancar a gente de dentro de nós mesmos...

3. Isso, já na Graduação. No Doutorado era para ser diferente, mas não é tão diferente. Porque, se você tem um professor que entra no assunto que interessa a você, mas entra por outra perspectiva, entra por outro pressuposto, com outra epistemologia, Deus do céu!, é uma confusão, uma improcedência - é como se cada um da sala estivesse numa sala diferente, e ninguém se dá conta... Cuida0-se que o "Espírito" vá dando o sentido, vai ver...

4. É que, na Teologia, a boca fica torna, como que usasse cachimbo por cem anos. O sujeito passa pela Graduação, avança pelo Mestrado e mergulha de cabeça no Doutorado - baseando-se em doutrinas! A isso ele chama "Teologia" - confissão, "fé", tradição. Ele pega isso tudo - que é uma e a mesma coisa - e faz com isso um alfarrábio, que guarda na cabeça. Isso vira uma espécie de filtro: tudo tem de passar por aí, dos quarks às super-novas, e, naturalmente, o corpo e a alma de todos os seres humanos... Ai, que desânimo... Ainda se espera que você, aluno, tenha o mesmo vício. E, se não tem, ai!

5. Mas, no meio dessa perdição epistemológica, esse anacronismo absurdo, há, contudo, momentos extraodinários. O meu chama-se Haroldo Reimer. Não há comparação possível entre o que foi aquele encontro... O que havia de especial era o zelo, o cuidado, mas, sobretudo, a abertura crítica e a nudez de Haroldo. Eu "sentia" que também Haroldo estava à porta - também ele olhava possibilidades: era fantástico vê-lo, também ele, construindo-se entre nós... Minto, meu amigo? Mas o que era - e é - apaixonante, é que não parava à porta. Sua cabeça sempre falou mais alto, nesse sentido, do que seu coração - se o coração tinha medo, a cabeça dizia: vai... E íamos... Magia pedagógica aquilo...

6. Saudades... Abaixo de Haroldo há uma série de mestres marcantes. A Graduação em Teologia, em Nova Iguaçu, abriu-me a mente para as Ciências Humanas. Posso dizer que a minha formação mais profunda, minha determinação em assumir a crítica, nasceu ali. Talvez decisivamente no terceiro ano. Alguns professores foram marcantes. Alguns - que se consideram "gênios vivos", e distribuem despeito por onde passam -, desses não fui aluno (Deus é bom!).

7. Mas eram muito, muito diferetes de como eu sou. Não "abriam o jogo". Não o escondiam, contudo. Uns mais, outros menos, apontam possibilidades, uns muito timidamente, quase como que pedindo desculpas... Pegar-me pela mão, abrir a janela, e mostrar-me a dureza da vida, e a nudez da Teoliogia, não. Isso eu tive de fazer sozinho, Bel e eu, em casa, pelas madrugadas, entre beijos e discussões intermináveis... Algumas vezes, a Lua nos fazia companhia, até dar bom dia ao Sol e ir admirar-se de japoneses a colher cerejas... Se eu fora a Lua, fazia o mesmo...

8. Não, nenhum dos meus professores da Graduação tem culpa de quem eu sou. Não posso dizer - foi ele. Não, não posso. Posso lembrar-me de momentos específicos, aulas específicas, que me despertaram a curiosidade. Mas nenhum deles me fez a cabeça. Por isso tenho me dedicado a não fazer a cabeça de ninguém, a dizer, publicamente, que não quero seguidores de nenhuma espécie. Quero, sim, oferecer ajuda a quem quer encontrar-se e a seu róprio caminho, e ir, só, como eu, no meu.

9. Não, nao repito os gestos tímidos e controlados de meus mestres. Em sala, derrubo a parede com murros, e tento fazer ver aos alunos o que há lá fora. Às vezes, é violenta a nudez. Não sei ser comedido, refinado. Não sei negociar discursos. Comedir. São graduandos, não novos-convertidos. E mesmo se fossem! É sua carne que deve ser exposta ao Sol e ao sal. Não há lugar para cuidados extremos nesse espaço de partos. A pedagia deve ser tão violenta quanto o é um parto... Faz força, mulher, empurra! Grita! Respira! Unhemmmm... Carinho pedagógico? Corrente em pé de mesa...

10. Eu não sei o que teria acontecido comigo se um professor da Gradução tivesse me pego pela mão, me arrastado pelo chão e me mostrado o que está escondido de mim desde a "conversão", quantas "verdades" escondidas, e tantas "verdades" reveladas. Não sei mesmo. O que eu sei é que, quando entro em sala de aula para dar aula, despejo todos os meus diabos sobre quem quer que ali esteja. Se não suportarem, saberão pedir arrego. Se não pedirem, das duas uma - ou é porque gostam e querem exatamente isso, ou é porque estão tão desarrumados por dentro que mal conseguem perceber que, ali, decide-se quem nós somos e seremos, independemente de quem nós fomos. O passado é gasolina - não estrada. Vruuummmm...


OSVALDO LUIZ RIBEIRO

2 comentários:

Robson Guerra disse...

Oi, Osvaldo...

Realmente, o curso de Teologia vira a gente do avesso. É como se fosse uma câmara de maturação. Oi se sai maduro daí ou... sei não... Acho que não amadurece nunca mais. Claro, se o curso for como o que nós temos no STBSB. É que tens uns cursos de Teologia por aí...

Encontrei-me neste curso. As coisas foram desnudadas diante de mim. Minha mente se abriu como nunca antes.

Como professor, você é para mim, penso eu, o que o Harolodo foi para você.

Escancaraste as portas para mim. Sem medo. Foi dureza. Mas, foi ótimo. Necessário. Agora, tenho de procurar e seguir meu próprio caminho. Vamos lá, viajar...

O Dusilek disse que devemos ser gratos àqueles que nos ajudam a corrigir nosso pensamnto.

Por isso MUITO OBRIGADO.

Robson Guerra.

Peroratio disse...

Bem, Robson, quando eu li o que você escreveu, ia imediatamente dizer que não devia agradecer. Mas, aí, pensei em Haroldo, e, se é verdade o que você disse, eu entendo a necessidade de gratidão.

É um marco. Uma porta. E você disse a verdade: a porta abre, você passa, e vai...

Eu tratei de amarrar Haroldo aqui em Peroratio, porque moramos longe demais. Foi um jeito de ficar perto.

Mas você e eu ainda temos - eu acho - um bom tempo juntos.

Um abraço,

Osvaldo.

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