quinta-feira, 21 de agosto de 2008

(2008/004) Para aonde iremos nós?


1. Os ventos do XIX foram sim impetuosos. Minaram-se para todo o sempre as tão seguras bases do edifício político-teológico cristão do Ocidente. A fides quaerens intellectum não mais conseguiu manter sob suas teias os diques incontidos de uma razão que decidiu por si mesma não ilustrar os velhos sapatos daqueles que ainda insistiam em caminhar com a fides ecclesiae. Os ares de emancipação derribaram as portas do palácio e encontraram um velho rei nu. Constrangido e temeroso, o pequeno homem enrolou-se nas frágeis toalhas confeccionadas pela tradição, e, estremecido pela insegurança de vestimenta tão frágil, revestiu-se com cordões que o levaram às sendas umbilicais de um monoteísmo político sacerdotal da tradição hebraica, que livraram – uma vez mais – seus pés do abismo e seu frágil corpo do vento frio que soprava sobre a face do seu rosto pálido. O pequeno homem agarrou-se com a força de uma vida em suas vestes, e, encontrou nelas e nos cordões que a sustentavam, o único lastro de toda confecção teológica dos 2000 anos de cristandade: a “auctoritas”. É nela, e só nela, que vai se apoiar a instância fundamental da teologia cristã, tanto protestante quanto católica, na elaboração do mais político dos conceitos engendrados pela lógica do saber teológico: o depositum fidei.

2. Como já foi muitíssimo bem demonstrado pela exegese bíblica – vide a vastíssima produção intelectual de meus companheiros blogueiros – esse imbróglio teológico político de orientação sacerdotal tem seus inícios nas primeiras formatações canônicas das tradições do segundo templo de Jerusalém, onde uma classe sacerdotal vai pintar os primeiros cenários de uma política religiosa que vai programaticamente estabelecer um monoteísmo político sob administração de sacerdotes. Não bastasse esse fundamento inconteste da gnoseologia teológica cristã ocidental, o platonismo cristão veio dar as últimas amarras nos trapos de toalha do pequeno homem, dando a estes um brilho transcendental, fazendo com que o homenzinho fraco se tornasse sisudo e confiante. Assim, foram postas as bases da metafísica cristã; elaborada a arquitetura teológico-política do Ocidente; lançado os lastros políticos, metafísicos e epistemológicos da civilização cristã ocidental; eis aqui – timidamente – a traditio fidei, as bases fundamentais do depositum fidei. Não foi gratuitamente que o velho Borges, em seu perspicaz “Sobre Chesterton”, escreveu que o genial cristão inglês – Chesterton - “submeteu suas perguntas e contradições fundamentais à imaginação monoteísta da teologia judaica, submetida ao logos de Aristóteles e Platão”.

3. Impossível não sentir-se tentado pelo aconchego e a calmaria do palácio – “miseráveis homens que somos, quem nos livrará do corpo dessa morte?”. Mas eis que um dia o pequeno homem foi inspirado por esse vento impetuoso que arrebata portas e cancelas, e desse dia em diante, não quis ser mais rei. Deixou para trás seus pequenos trapos; nu e com seus pés descalços, foi levado pelo vento, e, diante do abismo balbuciou com lágrimas sua mais sincera oração, que tal como o vento, não consegue se explicar de onde vem, e nem mesmo, para onde vai.

JIMMY SUDÁRIO CABRAL

Um comentário:

Alessandro disse...

Olá Jimmy, Osvaldo e Haroldo. Achei muito bacana (inclusive "prazeroso" como o velho Baco poderia sugerir)a iniciativa de vocês, um blog a muitas e boas mãos é fantástico. Certamente me tornarei um visitante frequente (um quase de casa) e sempre que possível um comentarista.
Adorei a iniciativa,
Alessandro.

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