sábado, 28 de março de 2020

(2020/043) As igrejas praticam o método confessional em teologia bíblica?

À primeira vista, as igrejas de modo geral aplicariam o método confessional em teologia bíblica. Quero aqui dizer que essa consideração é equivocada. É correto afirmar que as igrejas são organismos confessionais. Cada igreja tem sua própria confissão doutrinária, e ela se expressa o tempo todo a partir dessa confissão. Logo, toda igreja é confessional, e todo crente é confessional. Mas ser a igreja confessional não significa que ela leia a Bíblia, confessadamente, por meio do método confessional.

Vou explicar o que estou querendo dizer. Tomemos um autor e teólogo confessional - Gerhard Hasel. Ele publicou um excelente livro na década de 70, que foi publicado pela antiga editora batista, JUERP (de tristíssima memória), livrinho chamado Teologia do Antigo Testamento - questões do debate atual. No capítulo dois, descrevem-se cinco métodos de teologia bíblica. O segundo método que Hasel apresenta é o método confessional.

Hasel é um teólogo conservador, confessional. Mas não e típico. Ele não sonega informações da pesquisa crítica. Via de regra, teólogos confessionais portam-se desonestamente no mercado da literatura teológica. Pode-se dizer que grassa a mentira nesse mercado. Mas em Hasel se pode confiar. 

Sua apresentação do método confessional é honesta. Nos termos desse método, a teologia bíblica, isto é, a leitura teológica da Bíblia deve ser feita pelo prisma da fé - isto é, da doutrina. A teologia bíblica é, para esse método, uma ciência teológica cristã e, além disso - mas tudo isso é a mesma coisa, no fim das contas - a leitura da bíblica se deve dar, segundo o método confessional, com base em pressupostos teológicos.

Pois bem. Eu sou um leitor histórico-descritivo da Bíblia, para usar como referência o primeiro método que Hasel apresenta naquele mesmo capítulo. Uma vez que sou um teólogo descritivo em termos de teologia bíblica, não pratico e nem me interesso pelo método confessional, que acho totalmente inútil. Todavia, ele é honesto. O método confessa que não tenta ler a Bíblia em termos históricos. O método confessional - ele confessa - lê a Bíblia teologicamente. E, considerando-se que cada igreja tem sua própria teologia, cada igreja lê a Bíblia de acordo com seus próprios conteúdos teológicos.

O procedimento, a despeito de a meu ver ser inútil, já que você vai na Bíblia encontrar o que já tem antes de ir lá, ou seja, a doutrina que você já confessa, o procedimento é honesto, porque o método confessa que é isso que ele está fazendo. Um teólogo bíblico confessional honesto (mas há tão poucos desse tipo!) não engana a igreja dizendo que a doutrina que ele prega está na Bíblia. Dizer isso é mentir. Ele dirá que a doutrina que a igreja encontra na Bíblia é doutrina da própria igreja, e se a igreja fosse outra, encontraria outra doutrina, porque cada igreja encontra na Bíblia apenas a sua própria doutrina.

Pois bem: nenhuma igreja, exceto a católica, ensina que a sua doutrina é fruto de sua tradição, e que encontrá-la na Bíblia é uma questão de ler a Bíblia por meios teológicos, controlando a leitura pela doutrina. Desconheço casos. Na prática, as igrejas dizem que a confissão que elas encontram na Bíblia, que é a confissão doutrinária dessa mesma igreja, está na Bíblia. Isso é uma deslavada mentira. Na melhor das hipóteses, pura ignorância.

Em cada púlpito, cada igreja, a despeito de pregar doutrinas diferentes, diz que essa doutrina é bíblica, está na Bíblia e é o que a própria Bíblia diz. Por outro lado, o método confessional reconhece que não, que a doutrina confessional controla a leitura da Bíblia e, na prática, coloca a doutrina lá. Logo, para que se pudesse dizer que as igrejas empregam o método confessional na leitura bíblica, as igrejas, primeiro, teriam de parar de mentir. 

Confissão, doutrina, fé - isso é única e exclusivamente resultado da Tradição. A Bíblia não tem nada a ver com isso. Para poder ter, o leitor tem de confessar - se é honesto - que é ele, leitor, é ela, a igreja, quem retroage a sua Tradição até as páginas da Bíblia.

Uma igreja que assim agisse poderia ter meu respeito, porque ninguém pode dizer que uma igreja não tem o direito de projetar sua Tradição nos textos. Ms uma igreja que ou se engana, achando que a sua doutrina está na Bíblia, ou mente deslavadamente, dizendo o mesmo, precisa de urgente tratamento.

Só a Tradição salva a doença ética da igreja.







OSVALDO LUIZ RIBEIRO


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