Em 2006, em uma das disciplinas de meu doutorado, tive uma discussão com o professor de uma disciplina sobre João 1. Ele alegava que a referência a João batista, aí, devia-se à memória da comunidade, e a sua presença deveria ser reservada, então, à camada "original da tradição da fé. Minha posição era outra - se João, o batista, era tão importante para o Evangelho de João, a ponto de abrir o livro com referências polêmicas ao monge-profeta, isso deveria indicar a presença de João, o batista - isto é, de uma comunidade de fé - no horizonte de produção da narrativa - final do século I, início do II, uma comunidade que lembraria aquela mencionada em Atos, de redação bem anterior. Em lugar das duas teorias serem acatadas, ao menos, em pé de igualdade, a minha foi tratada como absurda.
Não me submeto à autoridades acadêmicas, quaisquer que sejam. Submeto-me a argumentos. Assim, ainda que minha teoria tenha sido tratada como absurda, para mim permanece como plenamente plausível - e tanto que os judeus, colocados ao lado de João, o batista, nesse mesmo capítulo 1, estão presentes no horizonte de produção da narrativa - aceita-se como fato que a comunidade joanina tenha se constituído a partir da expulsão da sinagoga!
Escrevi artigos sobre João 1, desde então. Não é minha área de interesse direto. Mas a ideia não me sai da cabeça.
Na graduação, em 1989 e 1990, um professor de História da Igreja dizia-nos que havia uma igreja de João batista no Iraque. Não, não era uma igreja cristã, que adora Jesus, mas dedicada a João Batista. Não, era uma igreja de cristãos de São João, que tinhas João, o batista como messias, não Jesus. Ou seja, cristãos, têm Jesus, cristãos de São João, João, o batista, e muçulmanos, Mohamed.
Para mim, de alguma forma, o que se indica no personagem João, o batista, em João 1 deve ter alguma ligação com esses cristãos de São João. Tenho investigado o tema, nas horas vagas.
Acabo de adquirir dois livros - um deles, caríssimo, U$ 0,79, sobre Mandaísmo, uma tradição religiosa que, no século XVI, foi descrita, por missionários carmelitas descalços como "cristãos de São João", em Basra, no Iraque. Vou aprofundar as leituras e escrevei um artigo "absurdo".
Penso que a comunidade joanina, em alguma parte de seu desenvolvimento histórico, enfrentou, ao mesmo tempo, dois adversários: judeus da sinagoga e "cristãos de São João", discípulos da tradição de João, o batista, que o tinham como messias, e não Jesus.
Para mim, essa comunidade esquecida e tratada como mera memória antiga, é a chave para a criatividade da comunidade joanina - eles diziam que João, o batista, era o verdadeiro messias, porque era mais velho do que Jesus. Para rebater a essa crítica, para mim a raiz do Evangelho de João e a chave da Cristologia alta, roubaram da sinagoga a doutrina centenária do Verbo Encarnado - a Torá, aplicaram-na a Jesus, fazendo-o um ser desde sempre celeste e, por isso, mais velho do que João, o batista...
A resposta fez sucesso e é repetida até hoje pelo Ocidente, que desconhece a sua origem.
Mas a comunidade do batista riu-se dos ladrões e permaneceu em sua crença original. Carmelitas descalços encontraram-nos bem, obrigado, mil e seiscentos anos depois, no Iraque, onde, hoje, ainda são, parece, um grupo entre cinco e sete mil pessoas - um fóssil vivo.
Se eu não estava certo, acho que fui tão criativo quanto a comunidade joanina - e sem roubar a ideia de ninguém...
Ma ainda acho que minha "absurda" leitura faz todo sentido...
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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