
2. Deus pôs a mulher no almoxarifado de seu povo.
3. Está nos Dez Mandamentos, que, contaram-me, ele escreveu com o dedo. Bem, se não mentiram para mim, claro... Na verdade, parece que as primeiras foram quebradas, dado um ataque de nervos do intermediador, que as teve de escrever ele mesmo, depois, de castigo, o que lhe fez perder a cabeça do dedo, e, quem sabe?, ele não andou alterando o que estava escrito? Não sei. Seja como for, se alterou e Deus deixou, é conivente...
4. E lá está escrito assim:
Não cobiçarás a casa do teu próximo, não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem coisa alguma do teu próximo (Ex 20,14).
5. Veja - almoxarifado. Na rubrica estão as coisas de que o homem é dono: o jumento, o boi, a casa, qualquer outro objeto, o escravo, a escrava e, naturalmente, a mulher - "objeto de cama e mesa".
6. Isso durou praticamente para sempre. Só ontem, quando, não faz duzentos anos quase, inventamos o Estado Democrático de Direito, ficou constrangedor tratar mulheres como objetos e propriedade - chegar no aeroporto e pesar mala e esposa, para ver se há excesso de peso... Então, alforriamos esse objeto e passamos a considerar - às vezes - que sejam pessoas...
7. Não sei o que Deus pensou disso. Mas muitos de seus filhos discordam veementemente do que fizemos - não lá atrás, mas ontem, libertando-as do jugo...
8. Falar em alforria, jugo, vale a pena ver uma fotografia de 1864. É de uma casa de venda de escravos em Whitehall Street, Atlanta: NEGRO SALES, está escrito no letreiro. Quer comprar um jumento?, prefere um negro? Temos...
9. Terra de crentes...
10. Almoxarifado. Gente tratada como objeto, como coisa. Veja a data: 1864 - quase cem anos depois da Revolução Francesa. O país da "liberdade" - direito à propriedade, à expressão, inclusive, de vender e matar negros... Que beleza...
11. Quando nós, brancos e crentes, decidimos fazer as coisas ao nosso modo, segundo nossos valores concretos, defendidos em nosso grupo e bando, a pessoa pode ser tanto propriedade nossa, disponibilidade nossa, que, ainda em 1916, se podia amarrar um preto a uma árvore e, depois de torturá-lo, queimá-lo. Observe o riso de prazer nos dois sujeitos à direita...
10. Almoxarifado. Gente tratada como objeto, como coisa. Veja a data: 1864 - quase cem anos depois da Revolução Francesa. O país da "liberdade" - direito à propriedade, à expressão, inclusive, de vender e matar negros... Que beleza...
11. Quando nós, brancos e crentes, decidimos fazer as coisas ao nosso modo, segundo nossos valores concretos, defendidos em nosso grupo e bando, a pessoa pode ser tanto propriedade nossa, disponibilidade nossa, que, ainda em 1916, se podia amarrar um preto a uma árvore e, depois de torturá-lo, queimá-lo. Observe o riso de prazer nos dois sujeitos à direita...
13. Tudo isso - mulheres tratadas como coisa-objeto-propriedade, negros tratados como coisa, como não-homens, como menos do que nada - são coisas feitas à sombra e à ordem de Deus. O povo crente, de ontem e de hoje, usam Deus - sempre! - para perpetrar as barbaridades de que gostam, de que sentem necessidade e prazer.
14. Não podem chegar a público e dizer: não gosto deles, não os quero, ou, antes, quero aproveitar-me, eu, eu mesmo, e, então, apelam para Deus e justificam em Deus a sua desgraça de alma e miséria ética.
15. É por isso que Deus ainda legitima a caça aos gays. Nenhum homofóbico crente terá a coragem de dizer que é ele, ele mesmo, que os detesta até a alma - e, então, mais uma vez, como há séculos e séculos se faz, para bem e para mal, jurará e mentirá, para si mesmo e para nós, que é Deus... Ele não é um pária ético - ele é um servo do Deus Altíssimo!
16. Mas ele sabe que eu sei que ele sabe que é Deus coisa nenhuma: é a sua alma, a sua maldade, o seu estado de miséria ética.
17. Nada mais...
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
Um comentário:
Que dizer? Nada a acrescentar.
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