domingo, 31 de março de 2013

(2012/383) ALMA - no deserto de Atacama, no Chile, o maior "radiotelescópio" do mundo


1. Foi finalmente inaugurado o complexo astronômico ALMA (Atacama Large  Millimeter / Submillimeter Array), complexo internacional, a 5.000 metros de altura, em que se projetou e construiu o maior - sistema de - radiotelescópio do mundo, constituído por um complexo previsto de antenas 66 antenas (nem todas ainda estão funcionando), com hiper-sensibilidade e capacidade de processamento de imagens superior a qualquer sistema astronômico até agora construído. As antenas parabólicas da rede ALMA, 54 de 12 metros de diâmetro e 12 menores de 7 metros, trabalham em conjunto como se fossem um único telescópio.

2. Para se ter ideia da precisão da captura de imagens, ALMA permitiu identificar moléculas de açúcar - sim, açúcar - em um berçário de estrelas. A identificação é possível pelo filtro do espectro de luz - e cada elemento químico possui uma assinatura específica... Extraordinário!

3. O funcionamento do sistema é relativamente simples - trata-se de captar ondas de rádio de diferentes comprimentos através de cada uma das antenas e processá-las. No conjunto, diz-se equivaler o resultado ao de uma única antena que tivesse a dimensão de inacreditáveis 16 km de diâmetro! Os sinais são transmitidos através de fibra ótica para o "correlacionador" (o supercomputador que processa os sinais e elabora a imagem final). Informações detalhadas encontram-se na página do ALMA (cf. aqui).


4. O ALMA possui uma página em inglês e espanhol. Uma apresentação breve, feita pela BBC Mundo, em espanhol, encontra-se disponível. No vídeo abaixo, uma montagem belíssima com os dias em que as antenas estiveram em funcionamento, desde 2011 - uma obra de arte -, ao mesmo tempo que um vídeo esclarecedor sobre ALMA.



5. Aqui, você pode assistir a um vídeo de 12 e 13 de março de 2013, com o evento de inauguração de ALMA.


6. Aqui, o filme oficial do ESO (EuropeanSouthern Observatory), um dos parceiros do Projeto. Você pode optar pelo formato HD e incluir legendas em Português.


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OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/382) O Universo quando era ainda um pequeno "feto" de 380.000 anos



Dados do ovo cósmico foram obtidos pelo telescópio espacial Planck, da Agência Espacial Europeia


"O mapa mais pormenorizado de como era o Universo 380 mil anos depois do Big Bang foi divulgado esta quinta-feira. A luz desses tempos, que agora nos chega sob a forma de microondas – e que se chama radiação cósmica de fundo –, permite ver pequeníssimas diferenças de temperatura no Universo. Foi nas regiões ligeiramente mais quentes que mais tarde nasceram as galáxias, grandes ilhas de concentração de matéria.

Este novo mapa do “ovo cósmico”, obtido pelo telescópio espacial Planck, lançado pela Agência Espacial Europeia em Maio de 2009, revela agora de forma mais refinada as diferenças de temperatura da radiação cósmica de fundo. Diferenças essas que vão permitir aos cientistas entrar numa máquina do tempo e viajar até pouco depois do Big Bang, que originou o Universo como o conhecemos.

A azul, surgem as regiões ligeiramente mais frias, e a laranja as mais quentes que são as sementes das futuras galáxias. Numa delas, na Via Láctea, estamos agora nós a olhar para tudo isto.

“Com o Planck, temos agora um mapa de alta precisão e o mais detalhado até hoje da radiação mais antiga no Universo. Com o estudo desta radiação e as diminutas variações da sua temperatura em diferentes direcções no céu, podemos inferir como o Universo nasceu, como é no presente e de que é feito, bem como qual será o seu futuro e prever a sua morte”, diz-nos a cosmóloga portuguesa Graça Rocha, do Laboratório de Propulsão a Jacto da NASA, na Califórnia, e da equipa nuclear do Planck. “Estas manchas quentes e frias nos mapas do Planck revelam as sementes que germinaram, resultando em estrelas, galáxias, enxames de galáxias que vemos hoje à nossa volta no firmamento.”

Uma das conclusões é que Universo nasceu há 13.820 milhões de anos, sendo assim cerca de 100 milhões de anos mais velho do que pensava. A idade geralmente apontada era a de 13.700 milhões de anos, quando o Big Bang se deu e se formou o Universo.

Além de acrescentar 100 milhões de anos à idade do Universo, o Planck trouxe outras novidades. O Universo tem um pouco mais de matéria escura (26,8% em vez de 24%), que não se vê mas se sabe existir pelos seus efeitos gravíticos. Tem um pouco mais de matéria “normal” (4,9% em vez de 4,6%), aquela que detectamos. E tem um pouco menos de energia escura (68,3% em vez de 71,4%), uma energia que contraria os efeitos da gravidade e ajuda o Universo a expandir-se".





OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/381) Multimídia: gráfico interativo sobre onde gays podem se casar nos Estados Unidos da América


1. Clique na imagem para ir ao site da Multimédia P... No gráfico, você pode interagir com as cores hachuradas e informar-se sobre o histórico e a geografia da causa gay nos EUA.








OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/380) O "nascimento" de uma cigarra


1. Na verdade, não é seu nascimento - é apenas o momento em que ela se transforma e passa da fase de ninfa para a de inseto adulto. O que você encontra nas árvores, de vez em quando, seco e duro, é o exoesqueleto da cigarra, que, tornada adulta, está agora pronta para voar, acasalar, pôr seus ovos e morrer, fechando, assim, o ciclo da vida...



2. O ciclo de vida de uma cigarra dura 17 longos anos, a maioria dos quais ela passa enterrada na terra. A cigarra fecundada, põe seus ovos dentro da casca das árvores. Os ovos eclodem em larvas. As larvas lançam-se no chão, cavam e se enterram. Vão passar 17 anos lá. Depois desses 17 anos, desenterram-se na forma de ninfa, sobem na ou numa árvore, fixam-se e eclodem de seu exoesqueleto na forma da cigarra adulta...


3. Quando ouvir uma cigarra cantando, entenda - ela esperou por isso por 17 anos... Se não foi comida, antes...












OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/379) Com vocês, os Membracidae - mas podem chamar de viuvinhas, cigarrinhas, mochilinhas, soldadinhos e, por que não?, vaquinhas de formigas


1. São muito pequenos esses insetos, e apenas quem lida com plantas os conhecem. Eles nutrem-se da seiva das plantas, nas quais espetam seu tubo sugador de seiva e da qual extraem o líquido da vida. Estão, da mesma forma, associados a formigas, porque as formigas vivem nas plantas das quais eles se alimentam e, digamos assim, para que não sejam devorados por elas, as formigas, eles, os membracídeos, desenvolveram a produção de "mel", na verdade, uma substância adocicada, com a qual pagam aos donos do pedaço pelo direito de servirem-se de seus acres de "terra".

2. A planta, que se serve das formigas para a sua proteção, as cigarrinhas, que se alimentam da planta, e as formigas, que protegem a planta e se servem dos membracídeos, construíram um pequeno e bem resolvido ecossistema...

3. O que chama atenção é o formato dos membracídeos. A parte superior da cabeça deles desenvolve-me em formatos os mais bizarros que se possa imaginar, e chegam a mimetizar a forma "perfeita" de insetos. Alguns cientistas dizem que estão imitando outros animais para livrarem-se de predadores, mas há quem diga que, na verdade, mimetizam a forma dos animais que lhes servem de "protetores" e a quem eles pagam o preço da proteção e do direito de colheita - no caso abaixo, uma formiga.


4. O caso acima seria apenas um superdesenvolvimento de casos mais comuns, como a abaixo, em que falsas antenas se projetam da parte traseira do membracídeo, mimetizando a "face" de uma formiga, com a qual a outra pensa estar "trocando" substâncias químicas.


5. Bem, eu não sou um entomólogo. Apenas gosto dos insetos, e a Internet é uma maravilha para nós, leigos, porque podemos aprender como é diversificada, curiosa e interessante essa extremamente bem sucedida categoria de seres vivos, os insetos.

6. Com vocês, os surpreendentemente curiosos membracídeos.


 
 
 


 
  


"_ Hora de pagar a o imposto!"

          
" _ Tomara que eles pensem que eu sou um espinho..."





OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/378) Sobre ser o pensamento filho do mundo


1. É óbvio que a percepção psicológica das coisas não pode ser a própria coisa percebida. Também não é possível que a percepção seja constituída pelo mesmo "material" da coisa percebida. Isso é óbvio, mas, acredito, é pouco levado a sério em muita argumentação idealista e, hoje, de tendência pós-moderna...

2. O mundo físico constitui-se dos elementos da Tabela Periódica e, mais abaixo, das partículas que constituem esses elementos - mas, registre-se, no nível da interação espécie humana - mundo físico, é o mundo atômico e molecular, não o mundo subatômico e quântico.

3. A vida não é outra coisa que Tabela Periódica em organização "orgânica" - minha carne é feita do mesmo material que o diamante que ainda não dei a Bel: o que diferente entre o carbono de meu dedo e o carbono do diamante é - apenas - a organização molecular.

4. O pensamento constitui fenômeno orgânico, cerebral, resultado de um estado das sinapses que, tendo atingido um ponto crítico, adquirem nova propriedade - nesse caso, a computação não apenas do corpo e do meio-esterno, mas, a partir desse estado crítico de complexidade, a computação da própria computação.

5. O pensamento não é feito de matéria física e orgânica, é emerge dessa matéria, mas é linguagem e, por extensão, consciência simbólica. Assim como a carne é física, mas é pós-física, o pensamento é carnal, mas pós-carnal: são, carbono, carne e pensamento, três estágios de uma história da matéria, história que, todavia, desdobra-se em momentos transformadores de si mesma, alcançando novas formas de existência e expressão.

6. Assim, a vida interagiu com o mundo pré-vivo no nível da estrutura celular - molecular. A celular alimenta-se de elementos químicos: potássio. O mecanismo de comunicação da célula com o meio se dá nesse nível e os mecanismo de prospecção desse meio atendem a esse nível de realidade. O mecanismo que a célula dispõe para identificar o íon de potássio não é da mesma natureza que o íon de potássio, porque já atende a mecanismos orgânicos que, todavia, tem em vista exatamente aquele íon de potássio. O modus operandi não é da mesma natureza que o íon de potássio, mas é estabelecido em função dele, é compatível com ele e é eficiente para identificá-lo. Qualquer tentativa de estabelecer um abismo epistemológico entre o íon de potássio, o fenômeno vivo de modo geral e o elemento vivo celular peca por princípio - o sujeito opera a partir de a prioris platônicos subjacentes a uma cultura dualista e idealista.

7. O cérebro faz o mesmo que a célula, mas em um nível de complexidade imensamente maior. Assim como as células dispõe da membrana citoplasmática, com a qual se comunicam com o meio, perscrutando-o, atrás de íon de potássio, por exemplo - e os encontra! -, da mesma forma o cérebro projeta-se para fora por meio dos tentáculos sensoriais: olhos, mãos, ouvidos, boca, nariz, pele... Não são os tentáculos que interpretam o meio: é o cérebro: para o que se utiliza dos órgãos sensoriais.

8. Ora, os órgãos sensoriais se estabeleceram no meio ecossistêmico em estreita interação de dependência, evoluindo lenta e gradualmente por milhões e milhões de anos - mais, bilhões de anos, se pensarmos nos primeiros organismos vivos do planeta. A necessidade da vida de manter-se obriga-a a desenvolver mecanismos de varredura do real - e, senhores, esses mecanismo precisam ser e são compatíveis com o meio. Todavia, o registro vivo-cérebro-mental dessa varredura não é da mesma natureza que o mundo físico, porque se dá no nível da interpretação e da linguagem. Linguagem que, todavia, é desenvolvida em função do meio, é compatível com ele e é eficiente em prescrutá-lo.

9. No Extremo Oriente, a relação do Homo sapiens com o meio físico foi interpretada como "ilusão" - maya. Bilhões de anos de evolução adaptativa e perfeita - tanto assim que a vida é um mecanismo extraordinariamente bem-sucedido na Terra - torna-se nada, mentira, ilusão, por força da má vontade religiosa e filosófica em face da vida: talvez se justificassem mazelas políticas, escravidão, castas,m privilégios, com essa retórica...

10. Na Grécia, Platão parece ter se apropriado dessa tradição - o mundo físico e vivo são ruins e há incompatibilidade entre a "alma" e a vida... Os cristãos gostamos desse quadro - e eis a nossa Filosofia...

11. Desde Descartes, começamos uma caminhada nova, mas ainda não chegamos lá. Ainda trabalhamos com o registro epistemológico da incompatibilidade entre pensamento e matéria, a despeito de o pensamento ser fruto direto dela: ainda não estamos de todo convencidos.

12. Mas é preciso que reconheçamos que o nível de interpretação que temos do real corresponde à consciência que, por sua vez, emerge como sistema linguístico e simbólico: ora, a linguagem, o nome de uma pedra, a própria palavra "pedra", não é a mesma coisa que a pedra, pelo amor de Deus! Isso é óbvio - mas temos de nos convencer de que não apenas posso ver a pedra no meio do caminho, posso tropeçar nela, posso tomá-la nas mãos, posso identificar sua histórica, de onde veio, do que é feita, qual a sua idade e em que categoria de estrela foram construídos os átomos que a compõem... Se isso não é a prova inescusável de que a consciência, o cérebro e a vida constituíram-se em perfeita sintonia com a matéria, bem, só pode ser má vontade e religião...

13. Quanto ao "sentido" da vida, bem, o sentido não é algo que esteja na própria matéria: o sentido é um conceito criado pela nossa própria consciência, quando, percebendo-se a si mesma como agente de um ser vivo teleológico, intencional, e observando a vida ao seu redor, ela, ainda que sub-consciente, também ela, intencional, aplicou ao Universo as suas próprias características. Nesse ponto, é bom admitirmos, não são nossos tentáculos tentando varrer o mundo - é nosso cérebro projetando sobre ele a sua gosma bio-psicológica...




OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/377) Como as tradições bíblicas se apropriam das tradições culturais de sua época - uma hipótese: o descensus ad inferos de Cristo e as mulheres na ressurreição


1. Nos mitos relacionados aos deuses que morrem e ressuscitam, comuns no Antigo Oriente Próximo e na grande bacia do Mediterrâneo, ao Deus (da vegetação), morto no inverno, corresponde a jornada da deusa ao mundo dos mortos - descensus ad inferos - para o resgate do Deus/marido morto.

2. Cito dois casos: Ishtar, que deve ir ao mundo dos mortos, resgatar Tamuz (esse plano encontra-se, provavelmente, "atualizado" no Livro de Ester, que, aliás, tem o mesmo nome da deusa) e Cibele, que deve ressuscitar o amante morto, Attis - sucesso que obtém em três dias...

3. Não são apenas esses dois. O motivo é comum e representa, na forma do mito, a morte da vegetação, no inverno gelado, e seu retorno, na primavera.

4. Pergunto-me se, dado o fato da absoluta impossibilidade de os primeiros cristãos copiarem tais mitos em detalhes, dada a auência de uma deusa-consorte, não acabaram traduzindo esse mito na forma da descida que ele mesmo, Cristo, faz aos mundos inferiores...

5. Talvez, a figura da deusa que é responsável pela ressurreição do deus morto esteja presente na tradição de que foram as mulheres - mulheres! - as primeiras "testemunhas". Que essa tradição vá ser praticamente apagada pelo clero que logo se forma nos primeiros anos do Cristianismo nada diz sobre as origens da tradição, mas sobre seu destino: para todos os efeitos, podem-se encontrar os motivos do mito do deus morto e ressuscitado, transformado na tradição de Jesus.

6. Parece que há uma fôrma mais ou menos obrigatória, uma espécie de leito sobre o qual as tradições de uma época se vêem obrigadas a correr. A negociação talvez se dê na forma de adaptar o detalhe ao novo contexto, como, por exemplo, o arco-íris no dilúvio - no mito babilônico, é a diadema de Ishtar, chorando seus filhos mortos na praia, mas, quando os judeus copiam o mito, mas não podem pô-lo (mais) sobre a cabeça de uma deusa, transformam-no no sinal da aliança.


7. O resultado da tradição é, assim, o fruto de uma sobredeterminação cultural, adaptada, em contexto de conflito e interdições traditivas locais: copia-se tudo o que se pode e adapta-se o que seria constrangedor...





OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/376) Com licença? Este é Attis - vocês já foram apresentados?


1. Este é Attis.

2. Nasceu no solstício de inverno.

3. Creia-me, de uma virgem...

4. Ele foi morto, no tronco de uma árvore, um madeiro...

5. Mas não se preocupe, posso apresentá-lo, vivo, porque ele ressuscitou no equinócio de primavera, a primavera - claro, do Hemisfério Norte.

6. Seu culto existiu desde pelo menos 1.200 anos antes de Cristo e seu corpo representava o pão - já que era considerado o deus da vegetação, que morre e ressuscita a cada cilo de inverno/primavera... Ele é o bom pastor... Ele chegou a ser salvador e garantidor de imortalidade aos iniciados.

7. Dizem que a estrutura de interpretação aplicada a Jesus de Nazaré, depois de morto, foi retirada do culto de Attis. De fato, o que se conta sobre Jesus é praticamente o que se conta de Attis - nasce em dezembro, de virgem, crucificado no madeiro, ressuscita e é o pão da vida, o bom pastor, o salvador...

8. Não sei se os primeiros cristãos helênicos aplicaram a Jesus esse pano de fundo comum no Mediterrâneo. O que sei é que são iguais - sem tirar nem pôr. Também não se deve esquecer que sempre houve muitas variantes de mitos - e no caso de Attis não é diferente. Em cada região, detalhes e porções mais ou menos importantes do mito são alterados. Não há uma versão, mas muitas, e o que você ouve de um iniciado em Roma não é o mesmo que ouvirá de um iniciado na Grécia. O mesmo, obviamente, vale para Jesus - em cada lugar do Império, cada iniciado contava sua história, uma história diferente. E se contaram tantas e tão diferentes que, no século IV, decidiu-se assumir uma e somente uma como "a" versão. Nesse momento, não apenas os mitos antigos dos quais se serviram os cristãos se tornaram histórias mentirosas e diabólicas, mas, ao mesmo tempo, tudo o que mesmo um cristão dissesse de Jesus, desde que diferente do que os representantes da classe sacerdotal de Roma decidiram, seria igualmente falso e demoníaco. Anos mais tarde, com a Reforma, o mesmo ocorrerá - mentira não é só o que católicos dizem, mas tudo que qualquer um que não seja de "nossa" igreja diz...

9. Por outro lado, ouve-se uma outra espécie de argumento. Quando cultos ocorrem ainda após a era cristã, altera-se a retórica para acusar o culto de ter copiado aspectos da liturgia do Cristo... E eis a extraordinária nudez da apologia cristã, reduzida a uma soberba inamovível: a) se é o cristão a copiar dos outros, o que é dos outros é falso, e o do cristão, que copiou do falso, é verdadeiro, e, ao contrário, b) quando são os outros a copiar do cristão, o dos outros, que copiaram do cristão, é falso, mas o do cristão é verdadeiro. A coerência cristã é: eu e só eu - você, nunca - salvo se você repetir o que eu digo. O cristão sofre do pecado da presunção, da megalomania do eu. Para que a sua flor viceje, tem de pisar a flor de todo mundo...

10. Voltando a Attis, penso que, se essas coisas fossem ensinadas aos crentes e cristãos em geral, seriam menos soberbos, menos prepotentes, menos insensíveis, e evitariam aquele pecado que seu Jesus lhes aponta, em Marcos 7,22, como o fruto de um coração contaminado - a soberba...

11. Não conheço muita gente mais soberba do que um cristão...

12. Se conseguissem viver sem soberba, sabendo que tudo que aplicam a si foi copiado dos outros, talvez conseguissem mesmo ser ótimas pessoas, e talvez os mitos que copiaram de tanta gente servissem, finalmente, para fazer delas boas pessoas cristãs...

13. Nesse dia, eu acredito, haveria singela alegria no coração humilde e grato pela herança que herdou dos povos...

Cibele e Attis, em carro puxado por leões.
Attis, observe-se, tem o cajado do "bom pastor".
Selo romano (séc. I a III EC)
Civico Museo Archeologico, Milano, Italy



14. Para os aspectos técnicos, cf. Giulia Sfameni Gasparro, Soteriology and Mystic Aspects in the Cult of Cybele and Attis.





OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/375) Jesus, Hermes, Asclépio, Perseu, Dionísio - Justino sabe das coisas: da metade delas, você também...


1. O dia de comemorar a tradição cristã faz o Cristianismo entrar em festa. Eu compreendo. Podia, mesmo, ser ocasião de festa e alegria... E é, para tantos, para quase todos...

2. Mas eu não faço festa. Fico, apenas, pensando, refletindo...

3. É que seu sei de coisas...

4. Quando você sabe de coisas, vê as mesmas coisas que todo mundo vê, mas com outros olhos.

5. Por exemplo, fui à estante e peguei meu volume de Justino, um dos primeiros teólogos da Igreja. Em Apologias I, ele tenta convencer Roma de que a religião cristã merece um voto de confiança. No parágrafo 21, ele trata dos deuses greco-romanos que tiveram as mesmas experiências que Jesus - que eram Filhos de Deus, que ressuscitaram, que subiram ao céu. E enumera-os...

6. Fala do Verbo dos Verbos, Hermes (aliás, a palavra Hermenêutica deriva do nome desse sublime  Deus), fala de Asclépio, hoje, símbolo da medicina, um curador como Jesus teria sido, e que sobe aos céus igual a ele. Fala de Dionísio, esquartejado e assunto aos céus. Fala de Héracles, dos Dióscoros, de Perseu...

7. Justino faz Roma ver que não há nenhuma novidade no que os cristãos pregam e proclamam: tudo que ensinam de seu Jesus, os romanos e os gregos já haviam ensinado dos seus...

8. Justino emprega de retórica... Como Paulo, no areópago, apontando o lugar do "Deus Desconhecido" e projetando sobre ele o seu próprio Deus, Justino aponta os deuses gregos e romanos, suas histórias iguais às de Jesus, mas, ele sabe, no caso deles, são demônios, mas não no seu.

9. Cedo demais, os cristãos esqueceram a lei evangélica: agir com os outros como gostariam que agissem com eles. Muito cedo, aprenderam a tratar seus mitos, que copiaram deles, como verdadeiros, e os deles, de quem copiaram, falsos.

10. Acharia mais honesto considerar tudo verdadeiro ou tudo falso...

11. Mas quando, depois de copiarmos tudo deles, tratamos a eles como a enganados do diabo, e a nós, que copiamos tudo deles, como santos de Deus, isso só pode indicar algum desequilíbrio ético muito grave, que dura, aliás, até hoje...

12. Por isso, quando todos se alegram, eu fico triste. Porque a alegria se dá sobre a insensibilidade e a redução do outro a nada, a objeto de conquista e a enganados do diabo.

13. Não posso compactuar com essa alegria.





OSVALDO LUIZ RIBEIRO

sábado, 30 de março de 2013

(2013/374) Órbita excêntrica - ir sempre e voltar toda vez


1. Sinto-me como um cometa em órbita excêntrica em torno de mim mesmo...

2. Sinto que, a cada cumprimento da elíptica, meu apoastro se distancia, vou mais longe, para o cada vez mais escuro e infinito...

3. Mas, excêntrica ou não, é órbita, e caio de volta, em direção a mim mesmo, para, então, lançar-me outra vez...

4. Paradoxo: esse movimento de ir e de voltar, sempre, é da ordem da identidade, da manutenção daquele núcleo "eterno", enquanto é chama, que se guarda a si mesmo na transformação ininterrupta das elípticas...

5. Lanço-me a mim mesmo cada vez mais longe, mas sempre volto, porque, a despeito da imensidão lá fora, sei quem sou: eu sou essa coisa de lançar-se e querer voltar, de saber o caminho e ir sempre além, de querer ir embora e de voltar sempre para casa...

6. Acho que sempre desdobrei-me de mim mesmo - e que as oposições que me habitam são eu mesmo, síntese dos contrários que me constituem...

7. Dois deles, os nomeio: a racionalidade inegociável do Real e a mística feérica do Inefável.

8. A racionalidade - ou será a mística? - me lança para o meu cada vez mais longe apoastro, ao passo que a mística - ou será a racionalidade? - me trás de volta, sempre, para meu mais íntimo periastro. Cada vez mais longe e, todavia, ou, por isso mesmo, mais perto...

9. Olhar para os dois abismos - o de fora e o de dentro - promovem-me a vertigem suficiente para viver, eu, a animar-me, Ogro e Mago: Ogro, a devora-me a alma mística, Mago, a encantar-me a mandíbula de Ogro... O Ogro devora o Mago que encanta o Ogro que devora o Mago que encanta o Ogro...

10. Tao.







OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/373) 250.000 visualizações de página



1. Nesse domingo, 31/03, Peroratio chegará à marca de 250.000 visualizações de página.

2. É uma marca histórica.

3. Peroratio não propõe o óbvio: não escrevo para agradar, não aceito adsense, para ter remuneração, justamente por isso: para não escolher o que vou escrever em função do público. Escrevo sob risco de ser incompreendido e ofendido, porque faço críticas radicais, aprofundando muitas vezes, para irritação de muitos, a crítica politicamente correta, mas insuficiente...

4. Esses 250.000 representam um público pequeno e fiel. Alguns, porque acostumaram-se a ler as provocação ácidas que produzo. Outros, porque não conseguem dormir sem ler a blasfêmia osvaldiana do dia - que é como esses classificam meus textos, sem os quais não podem mais viver - de outro modo não se explica que não saiam de Peroratio...

5. Agradeço a todos. Agradeço a todas. A vocês que acompanham fielmente Peroratio, meu muito obrigado.

6. Tem sido um prazer.

7. É mais prazer do que vocação, do que missão.

8. O que dia que perder a graça, o dia em que eu perder o prazer, paro.

9. Ainda não chegou o dia...

10. Se você gosta de Peroratio, divulgue a seus amigos e amigas.

11. E que os 500.000 cheguem em breve...




O B R I G A D O






OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/372) Se não são os pretos de África os malditos, quem são eles, então?


1. Você até se acha um crente legal, porque, diferentemente do Feliciano, não acredita que os pretos de África são os descendentes malditos de Cão, não é?

2. Mas, meu bom cristão, diga-me uma coisa - sobre qual povo você jogará de volta essa bíblica maldição?

3. Não basta dizer não a Feliciano.

4. Há que dizer não ao próprio texto bíblico






OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/371) Judaísmo e Cristianismo - onde são iguais


1. Na forma como montaram suas respectivas bibliotecas.

2. A base é a mesma - o Tanak (Bíblia Hebraica), que é o Antigo Testamento da Igreja, ainda que esta tenha adotado a cânon considerado como que da Septuaginta. Em todo caso, simplifiquemos a questão - a base sobre a qual as bibliotecas vão operar é o Tanak.

3. A ele, tratado então como Antigo Testamento, os cristãos reúnem uma série de rolos que findarão por constituir o Novo Testamento.

4. O mesmo farão os judeus. Ao lado do Tanak, constituirão uma série de rolos que virão a constituir a Mishná.

5. Assim, cristãos têm AT e NT e judeus têm Tanak e Mishná.

6. Os judeus, como os cristãos, não param interpretar suas Escrituras. Avoluma-se tanto o conjunto dos comentários à Mishná que compõem a Gemará Finalmente, decidindo-se por não mais escrever tratados normativos, reúnem Mishná e Gemará e compõem o Talmude.

7. Os cristãos, tanto quanto os judeus, continuam sua interminável série de interpretações dos textos sagrados. Convocam concílios, redigem atas, credos, encíclicas. Reunido o material constitutivo das decisões conciliares, grande parte das quais é a base de fé de todos os cristãos, mesmos os protestantes e evangélicos, teríamos um material tão volumoso quanto o Talmude.





OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/370) Marcos, Gadara, Paulo - porque ainda não entendo a relação entre Paulo e os Evangelhos


1. Não estou interessado nas respostas da catequese, prontas desde sempre, ao jeito de seus senhores. Estou interessado nas respostas históricas e, permito-me dizer, nas respostas verdadeiras. Se a catequese as tem - e nem sempre ou quase nunca -, de qualquer modo chegarei a ela. Se não as tem, não perdi meu tempo...

2. Pois bem, considerando-se que as cartas paulinas são anteriores aos Evangelhos (exceptuem-se as deutero-paulinas, mas, mesmo aí, quase todas são anteriores a João e uma ou outra seriam anteriores ou a Mateus ou a Lucas, ainda que não necessariamente a Marcos), uma questão me persegue há muito tempo: por que parece que os Sinóticos desconsideram Paulo, ao passo que Paulo desconsidera os sinóticos? 

3. Uma vez que os Sinóticos são posteriores a Paulo, seriam escritos reativos? Seriam programaticamente não-paulinos?

4. Se minha tese de que Lucas usa seu Evangelho e Atos para enterrar as pretensões das gerações de testemunho ocular, isso soaria como uma resposta a Marcos? Lucas, que, por quatro vezes, faz das testemunhas oculares como gente lerda de entendimento, pessoas que não teriam entendido nada do que Jesus teria dito e feito (os discípulos não acreditam na ressurreição [Lc 24,12 é uma glosa!], os discípulos de Emaús estão apalermados, os discípulos interrogam Jesus sobre a restauração do Reino e os anjos que insistem em que Jesus mandou-os esperar em Jerusalém), e faz entender que somente em Pentecoste, com a "descida do Espírito", todos os discípulos, inclusive Pedro, se tornaram "lúcidos", parece estar enterrando as prerrogativas das primeiras testemunhas na lama da ignorância e sustentando o poder das comunidades na figura do Espírito - de que Paulo se beneficia diretamente - e, com  efeito, é o herói de Atos. Lucas e Atos seriam uma reação "paulina" ao Marcos jerosolimitano?

5. Nesse sentido, se de fato está relacionado à comunidade de Jerusalém, com a referência à Gadara e ao fato de um endemoniado liberto ter sido o "missionário" na Decápolis, de que faz parte Damasco, a "Medina" de Paulo, Marcos estaria respondendo à "acusação" da comunidade paulina de que Paulo aprendeu por si mesmo, em Damasco, sem a interferência de Jerusalém? Estaria Marcos, indiretamente, fazendo Paulo depender das tradições primitivas dos primeiros discípulos?

6. Se as cartas de Paulo circulam com tanta força nas comunidades, e se o próprio Paulo vai a Jerusalém, o descompasso teológico tão gritante entre Marcos e Paulo seria proposital? E, se é proposital, Marcos estaria recusando a leitura teológica paulina? Gálatas é um momento desse confronto?

7. Penso que o Cristianismo que acabou por se tornar a linha mestra do Cristianismo, a teologia paulina, estava longe de ser única e, quem sabe até, a principal. Acho mesmo que muitas correntes sobreviveram, por muito tempo, mesmo depois de Paulo. Acho mesmo que o Islã tomou Jesus como um profeta, mas não como um Deus, inclusive por meio de cristãos não-nicênicos, representantes estes de tantas correntes sobreviventes, mas não hegemônicas no Ocidente.

8. Penso, sobretudo, que a rotina confessional de ler como uma unidade essa série de documentos neotestamentários soterra as evidências - que me parecem gritantes - de que Paulo e os Sinóticos constituem mais um dos muitos campos de batalha da fé cristã - violenta desde o início.




OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/369) A Igreja procurará o louco a que culpar



1. A Alemanha logo tratou de fazer de Hitler um louco psicopata. Assim, a alma alemã, protestante e branca, podia sair ilesa de uma culpa inexpiável...

2. Podem anotar: quando a ignorância e a maldade homofóbica passar, a Igreja procurará os loucos a culpar...

3. Mas não, toda ela é má, da alma à pele.

4. Má, a sua liderança, manipula a Bíblia a seu bel prazer, em conformidade com seus interesses - sejam de dinheiro, sejam de vaidade, sejam de glória, sejam de mimos e paparicações...

5. O povo, porque se deixa levar pelos comandos perversos da liderança, como quando gostava de crer que pretos eram divinamente escravos...

6. Quando passar essa onda de horror, não vai haver um louco a quem culpar - e cada qual terá de olhar no espelho a face da culpa...

7. Mas que todos tentarão escusar-se, tentarão...

8. É sempre o segundo pecado da alma.




OSVALDO LUIZ RIBEIRO

(2013/368) O Pompeii worm - o segundo ser vivo mais resistente a altas temperaturas - e esse você pode ver a olho nu


1. O Pompeii worm [verme de Pompéia] (Alvinella pompejana) está no planeta há milhões de anos, mas nós os encontramos somente no final do século passado. Ele é um extremófilo policelular - um animal que sobrevive em condições extremas, nesse caso, de temperatura. Ele habita regiões próximas a fontes termais do solo marinho, e resiste a tempetaruras de até 80º C - o que faz dele o segundo ser vivo mais resiste a altas temperaturas, perdendo apenas para dos tardígrados.
2. Chegam a medir 13 centímetros de comprimento e possuem um colorido muito bonito.
3. Foram encontrados em próximos a fendas termais em Galápagos e na Costa Rica. Talvez sejam sondas-vivas de Satanás, preparando a tomada do planeta... Ou talvez sejam apenas seres vivos aprendendo a viver em lugares onde, pelo menos não haverá vizinhos chatos...












OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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