quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

(2013/066) "Pela fé"... de por que não abro a guarda...


1. Hoje de manhã, assistimos à conferência/aula do Prof. Dr. José Adriano Filho aqui na Unida. É a Semana de Conferências Docentes, e cada professor está apresentando conferências públicas. José Adriano falou sobre Hebreus 11. Enquanto ele lia o texto, fiquei pensando sobre o que me era proposto pelo "autor sagrado"...

2. O autor sagrado me propõe crer que "pela fé Abel ofereceu um sacrifício melhor do que Caim. Graças a ela foi declarado justo"... Refletirei sobre essa declaração do autor sagrado...

3. Como assim? O autor quer me fazer crer que a história deva ser tomada ao pé da letra? Se o autor sagrado estivesse aqui para ouvir-me, eu diria a ele duas coisas:

a) primeiro, que se trata de uma ficção narrativa;

b) segundo, que a narrativa está carregada de ideologia sacerdotal, que recuso veementemente..

4. Diria ao autor sagrado que quem escreveu a narrativa tem um projeto: dizer aos ouvintes das leituras públicas que ele faria que Deus não quer (mais) sacrifícios agrários, mas (agora, quer) sangue, que Deus quer que seja derramado sangue de animais no culto de Jerusalém. Camponeses, flor de farinha, como diz Almeida, azeite, cevada... não, essas coisas Yahweh não quer... mais... quer, agora!, sangue, carne e gorduras. Ora, como você não se dá conta de que se trata de uma narrativa de justificativa do culto sacerdotal em Jerusalém?, culto de matar carneiros, bodes, cabras, ovelhas, passarinhos?

5. O camponês que ouve uma passagem dessas vai acreditar que Deus não quer mais os sacrifícios que ele, o pai dele, o avô dele, os antepassados dele faziam há séculos - grãos, librações, vegetais... Que Deus, daqui pra frente, quer que ele vá ao templo e pague o sacrifício de um bicho vivo...

6. Mais ainda: o camponês que pensar em recusar a narrativa, faz-se como Caim, recusado em sua oferta e assassino. Bom é Abel. Caim, não. Bom é quem faz o que Deus quer. Caim é mau, porque não faz. E o que Deus quer é que se matem bichos...

7. E vem o autor sagrado, agora, me propor que eu finja que não entendo o jogo, que eu entre, ingenuamente, no espírito da narrativa, e tome a atitude de Abel como fé? Ora, ou é muito ingênuo, ou muito "pastoral"... Que "coincidência" formidável, não? que o "bom" seja justamente aquele que encena o rito do Templo e que o "mau" seja, que coisa!, justamente o que encena a oferta popular do campo...

8. Não. Não há fé em Abel - há um programa de representar o "modelo" formal de culto agora aceito por Yahweh. Ele é um programa, uma ordem unida. E a mesma coisa se diga de Caim, mas com toda a carga negativa...Abel é o modelo, Caim, o contra-modelo.

9. Se eu tiver que escolher, escolho Caim. Digo não ao sacerdote. E se Deus não quiser minha oferta, não terá tampouco a que o sacerdote me manda fazer...

10. Mas, como posso escolher, digo não ao autor sagrado de Hebreus 11. Não, meu amigo, não. Abel não tinha fé - é a apenas um boneco na mão do autor, usado para me fazer fazer coisas que o autor quer que eu faça, usando Deus para me fazer fazer coisas que ele quer que eu faça... Deus escolhe Abel, o sacrificador, não Caim, o camponês teimoso. Sou, então, camponês e teimoso.

11. Se o autor sagrado defende o projeto do Templo, estou do lado contrário dele.

12. Fé... Faz-me rir...

13. Pelo visto, o padrão retórico homilético não mudou muito desde há dois mil anos: só se você não pensar funciona...





OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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