terça-feira, 3 de abril de 2012

(2012/353) Mas quem é o Brasil?

1. Li um pequeno texto Alexandre Vidal Porto de no blog Quando o Cristianismo não faz Sentido e dele extraio a seguinte declaração: "O Brasil é um país diverso. E quer continuar a sê-lo". Como assim "o Brasil"?

2. O texto chama-se "O Brasil não é Regido pela Bíblia". A presença do termo Brasil no título não é inadequada. Brasil, aí, é um país regido pela forma própria dos Estados Democráticos de Direito, um país cuja constituição preconiza o seu caráter laico, constituindo-se na forma de separação entre Estado e Religião. Quem rege o país, então, não é, mesmo, a Bíblia, é a Constituição.

3. O artigo trata da perigosa infiltração da religião nas coisas do Estado e do risco que isso traz. Fala do nascimento da República e do caráter não-religioso na nação. Teme pela manipulação da fé por interesses políticos.

4. Até aí, tudo bem.

5. Todavia, quase no final do texto, Porto declara: "O Brasil é um país diverso. E quer continuar a sê-lo". Bem, há um equívoco enorme aí.

6. Brasil, aí, não pode ser a grandeza jurídica - a nação republicana. Por quê? Porque essa nação não quer nem pode querer nada. Ela é uma abstração. Um sujeito jurídico, sem existência psicológica e moral. Uma entidade de forma organizacional e legal - mas que não tem vontade, gosto e saber, expressando-se tão somente na forma da expressão majoritária de seus componentes sociais.

7. Ora, esse "Brasil" não quer nem pode querer coisa alguma.

8. Quem eventualmente quer e pode querer são os brasileiros, esses, sim, seres reais.

9. Ora, digamos, por um minuto, e que Deus nos livre dessa tragédia, que os brasileiros, ainda que manipulados por meia dúzia de pastores, queiram justamente o contrário - uma Teocracia. Pois bem - o que aquele Brasil de papel pode fazer?

10. Ora, se se trata de uma Democracia, cujo jogo é o voto, se a maioria cristã simplesmente desejar uma Teocracia, mudar a legislação e a Constituição, tal ato será moralmente reprovável, eticamente criminoso, mas, para todos os efeitos políticos, legítimo. Naturalmente que eu me envolveria em toda sorte de campanha contra essa loucura. Mas com o risco legítimo de perder a briga.

11. Não há nenhum Brasil acima de nenhum brasileiro. Há brasileiros que podem, pelo voto, por-se sobre o pescoço de outros - isso há. Mas um Brasil de papel, não.

12. Assim, o Brasil não quer nada nem pode querer. Porto pode querer um Brasil laico e, por isso, diverso. Eu quero um Brasil laico e diverso. Mas se 120 milhões de brasileiros desejarem uma Teocracia, nem o Brasil a que Porto se refere nem o próprio Porto nem eu poderemos fazer coisa alguma.

13. A não ser, claro, que deixemos de ser democráticos justamente no momento em que a democracia não nos servir mais.

14. Deus me livre de um Brasil evangélico. Deus me livre de uma Teocracia de pastores. Mas, cá entre nós, Deus não tem nada a ver com isso. Se o povo decidir, até o diabo pode ser o rei do Brasil. Porque não há nem Deus nem diabo nesse questão - só o interesse de pessoas, laicas ou religiosas, e a imposição de sua vontade.

15. Até aqui, contra a vontade da fé, impusemos a vontade laica.

16. Até quando? Oxalá que até que os religiosos aprendam boas maneiras... Porque, se tomam o poder hoje, desgraça feita. E, talvez, amanhã, mais educados, já não queiram o poder...



OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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