domingo, 6 de março de 2011

(2011/138) Do Ensino Religioso nas escolas


1. Quer eu queira, quer não, não tenho mais como fugir do tema. Primeiro, porque minha profissão docente em Ciências das Religiões jogou-me de corpo inteiro sobre a questão, e, segundo, porque no Estado do Espírito Santo, onde me encontro, o Ensino Religioso está regulamentado nas escolas públicas - talvez eu mesmo seja contratado para apresentar um curso de formação para professores da rede pública, segundo soube. Tomara!

2. Mas tenho medo. Confesso que tenho muito medo. Conheço bem de perto os religiosos - conto-me entre eles, mas, quero crer, atravessei aquele limite até onde o sujeito deixa-se levar pela "fé". Já há algum tempo que faço questão de controlar as coisas que me deixo crer - razão pela qual alguns há que me considerariam um não-religioso, e justamente pelo fato de que, para um religioso típico, religioso é outro igual a ele, que repete as mesmas coisas, que faz as mesmas coisas, que crê nas mesmas coisas, sejam elas as mais estapafúrdias e tresloucadas - nos termos desse critério, há muito deixei de ser...

3. Mas não é verdade. Acabo de me ver tomado de profunda emoção ouvindo K. D. Lang e Hallelujah - penso que, se as igrejas cantassem assim, teria delas uma idéia menos crítica - mas há muitos anos que não se canta mais assim nas igrejas - o barulho é ensurdecedor, as vozes, um horror, o resultado, péssimo. Cantar, há vinte anos, era pedagógico - hoje, é catársico. Há alguma coisa de profundamente estética em minha espiritualidade, em minha religiosidade. A repulsa ao estado de coisas religioso atual é somática...

4. Quando eu disse que conhecia os religiosos, falava daqueles que estão a serviço inquestionável da fé: são tarrafas vivas, a pescar tudo e todos. Compreendo-as. Todavia, temo-as. No fundo, essa coisa de ensino religioso nas escolas é coisa programática de cristãos, os quais, cuidando fazer um serviço a Deus e à humanidade, querem evangelizar os alunos, filhos dos outros, que não vão às igrejas. Não são professores, apenas, não professam fé, apenas, são pescadores - subrepticiamente, e com o aval do Estado.

5. Mas, já que o Ensino Religioso aí está, penso que há que se transformá-lo em lucidez, antes que um instrumento de sujeição dos cidadãos a sistemas intolerantes de fé e racionalização fundamentalista. Há que se ensinar científico-humanistamente a religião, enfraquecê-la em sua força de conquista, torná-la civilizada, educá-la. Educar, em sentido amplo, de modo plural, de modo perspectivista, mostrar como todas as religiões têm seus pontos fortes e fracos, seus dias bons e dias maus.

6. A catequese não pode ser tolerada - sob nenhuma alegação. Não no Estado. Catequese já chega nas Igrejas! Nas escolas públicas, se Ensino Religioso lá vai haver, deve ser para a abertura da consciência, para a lucidez - e isso se obtém pela formação humanista, científico-humanista.

7. Mas estou de olho. Oxalá eu me engane - mas sinto um cheiro de estratégia no ar... Deus nos ajude...



OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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