1. Enquanto passam de sessenta as ocorrências de "filhos de Adão", são apenas seis, em cinco passagens, as ocorrências de "filhos de homem" na Bíblia Hebraica - os primeiros, "bene 'adam", os segundos, "bene 'ish". Se eu estiver certo, a tradição fez uma confusão dos diabos: o que me parece ser os "bene 'adam", ela diz ser os "ben 'ish". O artigo está disponível para ser lido, ainda não publicado formalmente em revista indexada: Osvaldo Luiz RIBEIRO, Bene 'ish - os "filhos de homem" na Bíblia Hebraica (16/05/2009). Depois de o ler, pode-se ler, também, o anterior: Bene 'adam - os "filhos de Adão" na Bíblia Hebraica (11/05/2009).
2. É impressionante como a tradição agiu nesses casos. Salvo melhor juízo, ela - tanto a tradição judaica quanto a cristã, tanto a medieval quanto a moderna - assumiu (desde Maimônides e Calvino) que "bene 'ish" são os nobres e que "bene 'adam" são os pobres, e essa definição inexorável pulula a hegemônica e inexorável maioria das publicações. Resinto-me de uma consulta aos alfarrábios histórico-críticos "imperialistas" (fui chamado assim, uma vez) alemãos, aqueles das estantes empoeiradas, para ver se um deles disse a mesma coisa que estou dizendo. Não consigo crer que uma evidência tão à sperfície tenha passado despercebida.
3. O que eu faço é ir a todas as ocorrências e analisá-las uma a uma, segundo os contextos semântico, fonético, poético e pragmático. É meio que nadar contra a corrente, mas me parece bastante historiográfico e arqueológico. Foi assim que descobri que os serafins são representações da serpente de bronze - Nehushtan. Foi assim que descobri que "criar", na Bíblia Hebraica, é "construir". Foi assim que descobri, agora, que "bene 'adam" são os nobres, e não, os plebeus, e que "bene 'ish" são os plebeus, e não, os nobres. Quer dizer, se é que descobri mesmo.
4. Não pense que se trata de tema "menor". Não estou interessado em "ir para a frente" com ele. O que eu quero está "lá atrás", já disse, é o 'adam de Gn 1,26 - para mim, o rei. Mas os mesmos termos estão na base da identidade de quem Jesus de Nazaré dizia ser quando empregava o título "Filho do Homem" para si - ou quando a tradição lhe aplicou, tanto faz. O Filho do Homem dizia de si ser ou "pobre", ou dizia de si ser o Rei? Ora, a tradição fez dele tanto um carpinteiro, e aí ele não é um "nobre", quanto lhe deu um epitáfio real: "et imposuerunt super caput eius causam ipsius scriptam: 'hic est Iesus Nazarenus Rex Iudaeorum" (Mt 27,37).
5. Confesso que não me interessa esse desdobramento, conquanto ele seja relevante. Interessa-me a identidade do "Adão" de Gn 1,26-31, que a história da interpretação fez aproximar-se do "terroso" agricultor de Gn 2,7, mas que, aposto minhas fichas todas, trata-se, antes, daquele que, assentado sobre o trono de Jerusalém, "domina" sobre toda a criação (cf. Sl 8). Quando descobri que a criação em Judá é a própria Judá, caiu-me a ficha. Ou vi miragens. Hum?
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
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