segunda-feira, 24 de novembro de 2008

(2008/61) Santa paciência!


1. Agora, sim, John Lenon pode "dormir em paz". Bento XVI - a Igreja - acaba de perdoá-lo (estamos melhorando, foi mais rápido do que com Galileu!). Coitado(s), devia(m) estar preocupadíssimo(s) com isso... Aguarda-se, todavia, o dia em que há de se perdoar a Igreja...

2. Sei que devemos compreender uma afirmação desde a sua base de sentido - as pessoas vivem em seus próprios mundos-de-sentido. Para Bento XVI, eu sei, faz todo sentido conceder perdão, porque a Igreja - da qual ele é o Pontífice Máximo, se considera, a si mesma, representante de Deus - e Bento, da Igreja. Assim, uma vez que Jesus Cristo teria ficado chateadíssimo com a fala de Lenon, e como, sabemos, a Trindade é de um extraordinário poder vingativo, era natural que Lenon devesse ser perdoado - para isso existem os sacerdotes, como aquele Elias, que revela a culpa da viúva, é o que ela mesma diz!, mata o filho dela, e, depois, vai curar a criatura...

3. Essa história, contudo, de tolerar discursos pela sua base levaria, por exemplo, à tolerância ao racismo, à xenofobia, à misoginia, ao nazismo, ao assassinato e ao roubo - basta que se aceite a base de argumento de um adepto da K.K.K., por exemplo, para que todo o sentido de sua prática racista venha à tona.

4. Assim, considerarei a fala de Bento XVI no mesmo nível - um arroubo do mundo-de-sentido de Bento XVI e de sua Igreja, um solipsismo teológico - a rigor, milhões de pessoas tiveram sua fé renovada por esse ato político! Em pleno século XXI, depois de duzentos anos de Romantismo (não me venham com Barth, Vaticano I e The Fundamentals, solipsistas até a próstata! - meu juízo, a teologia é pura pirraça), um ser humano considerar-se "sacerdote" - é patológico, se não for de todo apenas cálculo político - nesse caso, então, a patologia é de quem lhe dá ouvidos...


OSVALDO LUIZ RIBEIRO

2 comentários:

Felipe Fanuel disse...

Professor Osvaldo,

Lendo este post me lembrei do que o Pondé, em uma de suas colunas semanais, um dia desses disse: "Faltam bons sacerdotes". Intriga-me a proposta de combinação deste substantivo com aquele adjetivo. Será que o ofício sacerdotal — do qual, diga-se, eu mesmo faço parte — permite um julgamento tão último? Onde está a bondade e (logo) a maldade de ser sacerdote?

Minha impressão é de que é esquisito classificar sacerdócio como "bom" e/ou "mau". Só consigo entender isso pelo viés ético-político. Uma coisa só é boa ou ruim se passar pelo critério da ética que considera todos nós como bons e ruins ao mesmo tempo. A depender da situação, podemos oprimir ou ser oprimidos. Como agimos com o poder que temos em mãos? Para oprimir ou transformar uma situação de opressão?

Por isso, como um jovem pastor, entendo que a religião, antes de ser um chão sagrado, é um chão de poder. E sempre preciso perguntar qual é o meu lugar e o que faço neste lugar politicamente. Acho que isso não é só para a religião, mas para tudo na vida.

É sempre bom vir aqui!

Um abraço.

Peroratio disse...

Felipe, amigo, entendo perfeitamente sua colocação - é perfeita.

Há um problema, contudo. O conceito, em si, de sacerdote: é aquele que intermedia as relações entre o "povo" e o "sagrado". Depois de Marx, o conceito é, em si mesmo, negativo.

Mas há, eventualmente, a "função social" - cura d'almas. Essa, sim, na figura "pastoral", parece-me relevante. Um cura d'almas, contudo, que se sinta sacerdote, hum, tenho cá minhas reservas.

Mas a vida é uma roda - passa todo tipo de água por ela. Penso que daqui a mil anos ainda haveremos de ter sacerdotes entre nós, bons e ruins. Como pessoas. Como termo, cá entre nós, uma lástima.

Um abraço,

Osvaldo.

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