sexta-feira, 14 de junho de 2013

(2013/588) Sobre a conferência de José Pedro Luchi no I Congresso Internacional Unida/UFES


1. A conferência de encerramento do Congresso da Unida foi, a meu juízo, um ponto alto do Congresso. Uma das melhores, dentre todas - e talvez devesse ter sido a primeira: daria informações preciosas aos participantes do Congresso.

2. Luchi, professor de Filosofia na UFES, descreveu o pensamento de Habermas e Casanova sobre sociedade secular e pós-secular. Um trabalho muito bom e informativo. Apreciei com detalhes.

3. Ao fim, confessou que fez uma apresentação "mais sociológica", furtando-se a uma abordagem "mais filosófica", na qual, então, teria, aí sim, apresentado sua própria perspectiva sobre o tema.

4. E sua própria perspectiva sobre o tema revelou-se, todavia, nas conclusões. O ponto principal delas: a "ciência" nos traiu um tanto, não cumpriu o que prometeu, de modo que é a religião onde encontraremos a condição de segurança de que necessitamos...

5. Hum...

6. Primeiro problema, que apontei em minha pergunta pública: quando Luchi vai demonstrar, por meio de ilustrações, que sua declaração de que a ciência não cumpriu o que prometeu, os casos que pinçou fora, todos, da tecnologia: as máquinas dão defeitos (hospitais, bancos, equipamentos eletrônicos), volta e meia ficamos sem luz, sem água - e pensar a nossa existência sem luz e sem água, que coisa terrível! Bem, tecnologia não é ciência - é a sua aplicação. Não me parece adequado ilustrar a falha da ciência com casos de tecnologia...

7. Se máquinas dão defeito, corações param de bater! A grande "Natureza" - na linguagem subterraneamente teológica da fé - o "Grande Deus" -, sapientíssimo, construiu uma máquina bem repleta de defeitos: doenças, defeitos genéticos, aleijões. Ora, se o problema da fiabilidade tecnológica é a prova de que a ciência não seve, vai-se correr para debaixo da batina do padre, agente de um Deus tão bom quanto a ciência, nesse quesito? Esse que aqui está prefere a geladeira e o pen-drive...

8. Além disso, se é verdade que a ciência não cumpriu o que prometeu - verdade? (Luchi disse isso usando microfone, numa sala erguida com tecnologia de engenharia, com ar condicionado, ali tendo chegado por meio de automóvel) [mas, repito, tecnologia não é ciência, exatamente!] -, em que a religião o fez?

9. A religião prometeu paz e criou guerra, prometeu vida e criou morte, prometeu segurança e gerou insegurança - nos países em que não vigora a condição laica, vá ver se a religião gera segurança! Quando a Revolução Islâmica instalou-se no Irã, vai ver o que houve com islamitas e adeptos Bahai... Vai ver a história da Igreja...

10. Isaías, visionário do ópio, disse que o leão e o cordeiro se assentarão juntos: só se ele pensava na promíscua relação entre os cristãos e Roma, homologada como plataforma civilizatória no século IV, porque, até hoje, o leão - religioso, inclusive - só faz comer ovelhas...

11. Nao acho que se esgotaram, ainda, os "recursos" de defesa da religião, nem os "recursos" de ataque à ci~encia e à sociedade moderna - mas os que ouvi não me convenceram. Talvez haja outros, melhores...

12. Ou talvez eu é que seja um espírito de porco...

13. A despeito dessa fundamental discordância minha das conclusões a que Lucho chegou, achei-o um comunicador admirável, gostei tremendamente de 95% de sua exposição (ainda que os 5% com que discordo sejam o cerne de seu próprio pensamento). Se eu tivesse ido ali para apenas me informar sobre o que é sociedade secular e sociedade pós-secular, e se me tivessem sido cobrados 500 reais para isso, estaria satisfeito com a mercadoria entregue.

14. Quanto à perspectiva de Luchi a respeito da religião e da ciência, bem, Luchi é padre... Isso tanto explica muita coisa, quanto pede a mim alguma condescendência.




OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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