quinta-feira, 22 de outubro de 2009

(2009/554) Quando Deus fez o homem


1. Quando Deus fez os homens, o primeiro e todos os segundos e terceiros da longa série da geologia antropológica que ele fez e criou, fazendo-nos todos os homens como nos fez, homens assim, dese jeito assim, naquele dia, obra de suas mãos, obra de artista exímio, de escultor de dentes postiços, que os faz, de tão perfeitos, com defeitos, deus criador de criaturas criadoras, ele nos olhou bem dentro de nós, nós, os homens que ele fez, ele olhou para nós, para dentro de nós, ele olhou e viu... e como sinto esse olhar perscrutador até dentro dos ossos!...

2. E, quando viu, viu que seríamos deicidas, porque logo descobriríamos as ciências, que ele, enquanto criador de criaturas barulhentas, criava criadores da solidão e do silêncio tumulares. Viu-nos nus, por dentro, e soube que o mataríamos em breve...

3. E nos amou de tal modo que nos fez uma mulher, uma para cada um, se não somos cruéis e déspostas, e as fez primorosas e deliciosamente esculturadas, e nos deu a sorte de perambularmos pelas savanas, e darmos de cara com seus corpos e suas almas. Nessa ordem.

4. E ele disse, naquele dia. Pronto. Quando me matarem, as minhas criaturas, estará tudo bem, porque ter-lhes-ei dado um pedaço de mim, u'a mulher a que amarem, a quem entregarem a dor de sua tragédia.

5. E foi assim a manhã e a noite que interessam. As outras, a memória há de apagar.








OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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