1. Penso que se pode "enquadrar" a Teologia Liberal no seguinte esquema de tópicos: a) aceitação da crítica filosófico-epistemológica do século XIX (fator determinante); b) tentativa de harmonização entre a sociedade cristã moderna/emancipada do século XIX e a "tradição" cristã, operada em torno das imposições limitadoras de "a" e a manutenção de um mínimo fundamental, obrigatoriamente histórico, da tradição crista; c) adoção de Jesus de Nazaré como "centro" da fe cristã, significando isso que a pregação da Igreja deve ser a mesma pregação de Jesus, e não Jesus como conteúdo da pregação da Igreja- Jesus pregava o Reino de Deus e a vida eterna: a Igreja deve pregar o Reino de Deus e a vida eterna (Adolf von Harnack); d) instrumentalização da "experiência" pessoal do crente como "legitimação" da "fé" (Schleiermacher) (observação: é do fato de considerarem Jesus o centro, e, conseqüentemente, classificarem Paulo como parte, já, da História da Igreja, e não como fundamento, que surge a expressão clássica brasileira de refrir-se à teologia liberal como tendo afirmado que a Bíblia "contém" a Palavra de Deus, argumento raso da apologia "ortodoxa").
2. Isso implica dizer que, de um lado, não há teólogos liberais no Brasil - não, confessos; não, que tenham escrito algo "liberal", no sentido de Harnack. Aliás, no século XX, o único que se aproximou de Harnack foi Dietrich Bonhoeffer, mas o mataram. Recentemnte, é provável que Hans Küng e Edward Schillebeeckx pudessem ser aproximados a essa particularidade da teologia liberal (cf., respectivamente, Teologia a Caminho e Jesus, história de um vivente).
3. Mas isso implica, por outro lado, dizer o oposto: que todo teólogo brasileiro, evangélico/protestante quero dizer, chega a ser liberal, quando define a experiência pessoal como legitimação da fé - aliás, discurso que seminaristas em crise berram pelos corredores, "ameaçados" pela informação histórica, negada a eles a vida toda. De um lado, é divertido ver o liberalismo salvar a fé de vítimas da tradição coercitiva e perversa. De outro, é triste, profundamnte triste: o que não se pode fazer com a cabeça de um sujeito, em nome de Deus! Acho que a situação dos seminaristas é como a síndrome de Estocolmo...
4. Pois bem, Karl Barth, aluno de Harnack, levanta-se como guerreiro e destrói esse arcabouço teológico-liberal. Devolve a revelação, lógico, fazendo-a subsumir-se à doutrina cristã - leia-se: Nicéia. Afirma que Deus e o transcendente estão revelados na Palavra - a Bíblia protestante, de modo que se pode chamar a teologia de Barth, a teologia dialética, de teologia da Palavra. Para Barth, toda a Bíblia é central para a fé, e não apenas Jesus de Nazaré. A História é mero palco, mas o ator é Deus, revelado. A Igreja, única, toda ela, deve adotar a doutrina "ortodoxa", isto é, "correta", porque só há uma doutrina, uma fé, uma verdade - a da Palavra (Barth não aprofunda a questão hermenêutica, claro, porque isso derrubaria seu aparentemnte sólido castelo de cartas; depois da fase "existencial" [Bultmann], uma fase hermenêutica prepararia o terreno para a fase Moltmann e Pannenberg dessa mesma corrente neo-ortodoxa). Barth é uma beleza para a teologia confessional. Não é à toa que, depois do Vaticano II, que mandou-os ler a Bíblia, teólogos católicos tenham corrido para Barth - é um jeito (nada elegante, é certo) de dizer-se ortodoxo e bíblico ao mesmo tempo, o que não é exatamente correto, claro.
5. O que mais se tem de parecido com Barth, mas que, paradoxalmente, consideram-no "insuficientemente crente", é a teologia fundamentalista (cf. The Fundamentals e James Orr) estadunidense. Aliás, ao lado do Vaticano I, a teologia de Karl Barth e o movimento estadunidense, The Fundamentals, constituem reação ao Romantismo "inaugurado" por Kant e aprofundado no século XIX (que o liberalismo dissera aceitar): o Vaticano I, dando certeza pela voz papal; Barth, pela Palavra, e os funamentalistas, pela repetição a-crítica das doutrinas. Isso tudo junto dá uma boa perspectiva para a teologia brasleira: "bento que bento é o frade, frade, na boca do forno, forno, tudo que seu mestre mandar, faremos todos, e se não fizer...", mais uma bibliolatria fundamentalista atrelada a uma política denominacional (não restrita aos batistas, absolutamente!) e mais uma confusão alguma coisa entre negligente e irresponsável entre Palavra de Deus e Declaração Doutrinária. Tinha que dar no que deu - subjetivismo fideísta voluntarista transformado em racionalidade...
6. Quer-me parecer que o quadro é simples. Duro é reconhecer-se nele. Aí dói. Mas é como nascer. O buraco é apertado demais. Quer ficar lá dentro? Tudo bem. Mas acho que vai apodrecer. Seja você, seja o útero, seja a mãe... se entendem o que digo...
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
PS1. para algum batista nervoso, sugeriria a leitura, agora, vai lá, rápido, do último capítulo dos Princípios Batistas. Isso resovlerá a crise de ira... salvo se ela for tanta que o levar a picar o documento histórico...
PS2. dadas as definições acima, não me considero nem liberal, nem barthiano. Se fosse obrigado - e não sou - a escolher, escolheria Harnack, e não Barth. Mas não o escolhi. Defino-me melhor pelo projeto implícito em Teologia a Caminho, de Hans Küng, nao operacionalizado, como o de Dietrich Bonhoeffer, mas que opero, a meu tempo e modo.
PS3. estou como que no alto da clina, aguardando que o século XX da telogia, seu túmulo medieval disfarçado de moderno, desabe, para eu descer e ajudar a recosntruir. O que está aí, em termos tológicos, é assombração. Não dá sequer pra pôr uma viga, como quem escora bananeiras de cachos abençoados.
2. Isso implica dizer que, de um lado, não há teólogos liberais no Brasil - não, confessos; não, que tenham escrito algo "liberal", no sentido de Harnack. Aliás, no século XX, o único que se aproximou de Harnack foi Dietrich Bonhoeffer, mas o mataram. Recentemnte, é provável que Hans Küng e Edward Schillebeeckx pudessem ser aproximados a essa particularidade da teologia liberal (cf., respectivamente, Teologia a Caminho e Jesus, história de um vivente).
3. Mas isso implica, por outro lado, dizer o oposto: que todo teólogo brasileiro, evangélico/protestante quero dizer, chega a ser liberal, quando define a experiência pessoal como legitimação da fé - aliás, discurso que seminaristas em crise berram pelos corredores, "ameaçados" pela informação histórica, negada a eles a vida toda. De um lado, é divertido ver o liberalismo salvar a fé de vítimas da tradição coercitiva e perversa. De outro, é triste, profundamnte triste: o que não se pode fazer com a cabeça de um sujeito, em nome de Deus! Acho que a situação dos seminaristas é como a síndrome de Estocolmo...
4. Pois bem, Karl Barth, aluno de Harnack, levanta-se como guerreiro e destrói esse arcabouço teológico-liberal. Devolve a revelação, lógico, fazendo-a subsumir-se à doutrina cristã - leia-se: Nicéia. Afirma que Deus e o transcendente estão revelados na Palavra - a Bíblia protestante, de modo que se pode chamar a teologia de Barth, a teologia dialética, de teologia da Palavra. Para Barth, toda a Bíblia é central para a fé, e não apenas Jesus de Nazaré. A História é mero palco, mas o ator é Deus, revelado. A Igreja, única, toda ela, deve adotar a doutrina "ortodoxa", isto é, "correta", porque só há uma doutrina, uma fé, uma verdade - a da Palavra (Barth não aprofunda a questão hermenêutica, claro, porque isso derrubaria seu aparentemnte sólido castelo de cartas; depois da fase "existencial" [Bultmann], uma fase hermenêutica prepararia o terreno para a fase Moltmann e Pannenberg dessa mesma corrente neo-ortodoxa). Barth é uma beleza para a teologia confessional. Não é à toa que, depois do Vaticano II, que mandou-os ler a Bíblia, teólogos católicos tenham corrido para Barth - é um jeito (nada elegante, é certo) de dizer-se ortodoxo e bíblico ao mesmo tempo, o que não é exatamente correto, claro.
5. O que mais se tem de parecido com Barth, mas que, paradoxalmente, consideram-no "insuficientemente crente", é a teologia fundamentalista (cf. The Fundamentals e James Orr) estadunidense. Aliás, ao lado do Vaticano I, a teologia de Karl Barth e o movimento estadunidense, The Fundamentals, constituem reação ao Romantismo "inaugurado" por Kant e aprofundado no século XIX (que o liberalismo dissera aceitar): o Vaticano I, dando certeza pela voz papal; Barth, pela Palavra, e os funamentalistas, pela repetição a-crítica das doutrinas. Isso tudo junto dá uma boa perspectiva para a teologia brasleira: "bento que bento é o frade, frade, na boca do forno, forno, tudo que seu mestre mandar, faremos todos, e se não fizer...", mais uma bibliolatria fundamentalista atrelada a uma política denominacional (não restrita aos batistas, absolutamente!) e mais uma confusão alguma coisa entre negligente e irresponsável entre Palavra de Deus e Declaração Doutrinária. Tinha que dar no que deu - subjetivismo fideísta voluntarista transformado em racionalidade...
6. Quer-me parecer que o quadro é simples. Duro é reconhecer-se nele. Aí dói. Mas é como nascer. O buraco é apertado demais. Quer ficar lá dentro? Tudo bem. Mas acho que vai apodrecer. Seja você, seja o útero, seja a mãe... se entendem o que digo...
OSVALDO LUIZ RIBEIRO
PS1. para algum batista nervoso, sugeriria a leitura, agora, vai lá, rápido, do último capítulo dos Princípios Batistas. Isso resovlerá a crise de ira... salvo se ela for tanta que o levar a picar o documento histórico...
PS2. dadas as definições acima, não me considero nem liberal, nem barthiano. Se fosse obrigado - e não sou - a escolher, escolheria Harnack, e não Barth. Mas não o escolhi. Defino-me melhor pelo projeto implícito em Teologia a Caminho, de Hans Küng, nao operacionalizado, como o de Dietrich Bonhoeffer, mas que opero, a meu tempo e modo.
PS3. estou como que no alto da clina, aguardando que o século XX da telogia, seu túmulo medieval disfarçado de moderno, desabe, para eu descer e ajudar a recosntruir. O que está aí, em termos tológicos, é assombração. Não dá sequer pra pôr uma viga, como quem escora bananeiras de cachos abençoados.
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