domingo, 30 de novembro de 2008

(2008/77) Tradição e Teologia - de volta ao "MEC"


1. Não me restam dúvidas - Teologia (enquanto sistema doutrinário, fechado e institucionalizado) é Tradição. O Protestantismo, sua mais lastimável "mentira" (para si também ou apenas para os outros?), é dizer-se "bíblico" - nada é mais falso do que a afirmação política (como a "iluminação") de ser-lhe "a Bíblia" regra de fé e prática. A regra é a interpretação institucional, a teologia normativa, o dogma, ainda que disfarçado pelo nome de outro nome. Teologia é sistema de doutrina, fechado ao real, coercitivo, opressor e repressor, ainda quando é de amor e "por amor" que fala.

2. Gosta-se disso, como o disse Don Cupitt, que chama a isso "terrorismo cosmológico": "por exemplo, as maiores e mais poderosas organizações religiosas hoje em dia, sejam cristãs ou islâmicas, parecem atrair as pessoas exatamente por serem autoritárias. Elas parecem confirmar a tendência muito comum de equacionar religião com a alegre submissão ao domínio, e, dentro delas, continuam surgindo os movimentos revivalistas, que são ainda mais autoritários. O poder espiritual, é o que parece, está sempre exigindo cada vez mais de si mesmo - mais puritanismo, mais repressão, mais crueldade. Assim, o vírus da ãnsia de poder espiritual transformou as religiões redentoras em máquinas de destruição do espírito humano. E, nos novos movimentos religiosos (...), que costumam ser popularmente descritos como cultos (...), exatamente as mesmas características continuam aparecendo repetidas vezes" (Don CUPITT, Depois de Deus, p. 110, grifos meus).

3. "Máquinas de destruição do espírito humano" - nisso transformou-se a Teologia/Tradição. Mesmo quando moderada - falsamente moderada, como querem os evangelicais em face dos fundamentalistas - a liberdade de pensamento do sujeito limita-se a reorganizar as peças da linguagem, quando muito, mas as peças, as mesmas, as mesmas peças contrabandeadas para dentro das Escrituras, têm de ser instrumentalizadas - diagnóstico meu: porque são elas que hipnotizam as massas, e, se, a rigor, o jogo depende da hipnose, que se imploda/exploda com a metafísica!, mas, pelo amor de Deus, não mecham em nosss palavras mágicas... Que cena epistemológica mais deplorável, mais triste - "como não vos condói isso?" - ouvir diálogos de religiosos "modernos": os mais ignorantes, pobres criaturas, perdidos em mitos institucionais estéticos/políticos, os mais cultos, posando de inteligentes, quando, a rigor, sequer aceitam perguntar-se sobre as condições de seu discurso - inteligência não é certeza, é, antes, a certeza de que se pode estar errado, a consciência metodologicamente eficiente da self deception. Isso, "visão" político-metafísica (agora também político-metafórica) é Teologia. Qualquer livro de Teologia - ontológica ou metafórica - o comprova sobejamente.

4. O que pode fazer a Tradição na Academia? Destruí-la. Mal nasceu, mal aprendeu a caminhar, sequer está profundamente convertida às suas próprias regras, acabou de construir conceitos de transdisciplinaridade, metacola cujo propósito é unir os fragmentos epistemológicos da caça ao real, e, eis, fitando-a, em plena sala, trajada de barroco e carmesim, mãos postas e autéola sobre a cabeça, "Bíblia nu'a mão e jornal na outra", a Santa e Culta Teologia, vestida de toga, mas com cilício nos lombos. O que um sistema de doutrina, fechado, autoritário, pronto para encontrar Deus - há de o reconhecer entre um trilhão de deuses, já que o fabrica a cada segundo -, o que essa Tradição fará diante das "informações" que o sistema de teorias, sistema aberto, autofágico, da Academia lhe arrostar? Permitirá que apenas aquelas que lhe interessam, que lhe mantêm "viva", entrem. As demais, com um gesto de mão, lançará sob a mesa (que o comam os cachorrinhos), e com dez mil palavras, contra elas imprecará do púlpito - aos domingos, a prevenir que as almas ovinas se apascentem ali.

5. Hipercrítica de minha parte? Que se apresente, então, a contra-crítica. O máximo que vi, até agora, foi a confissão de que Teologia é confissão, sim, e, a despeito disso - qual o problema?, retruca-se -, deve estar na academia, ou a defesa da idiossincrasia da Teologia, logo, sua des-necessidade de estar na Academia, porque ela se basta a si, ela, sozinha, sabe, é saber racional público, tem Deus por informante (ou um jogo metafórico mais ou menos cínico, e dá no mesmo). Gostaria - imensamente, Haroldo, acredite-me - que alguém, honestamente, me apresentasse uma contra-crítica que se sustentasse nas próprias pernas - diante da crítica (apelas para o próprio umbigo não vale, condescender com o solipsismo epistemológico é trapaça. É como quando comprei imediatamente Tratado de Ateologia, de Michel Onfray, acreditando, piamente, que leria, pela primeira vez, um Tratado sério sobre ateologia. E o que eu encontrei lá?, um amontoado de lugares-comuns que não fariam a uma ameba sentir-se propriamente invadida por informações novas. Até eu já fiz serviço melhor contra a do que aquele livrinho preto. Saramago, então, nem se fala. Vomitar no papel a a partir da qual se move não é a melhor maneira de dialogar. Não se dialoga através das idéias, mas através dos argumentos que sustentam as idéias - como dialogar com a Tradição, cujo princípio número um é não-dialogar, mas engolir, "evangelizar", capturar, "destruir o espírito humano"?

6. "Tradição"-com-T-maiúsculo, sistema de informação fechado, doutrina - Teologia. Já é um câncer no planeta - mas na academia!?


OSVALDO LUIZ RIBEIRO

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