quinta-feira, 15 de março de 2012

(2012/286) Uma resposta ao Luciano, que reagiu ao post anterior

1. Em reação ao post anterior, Luciano deixou um comentário que merece mais do que uma resposta nos comentários.

É interessante como vamos observando que o que falta ao homem para conseguir usar eficazmente os olhos que tem na cara são necessárias algumas balizas que lhe orientem os passos. Veja que digo orientem os passos, e não lhe definam onde vai pisar. 
Essas questões todas que decorrem da crítica em relação ao resultado da pragmática política adotada pela Igreja eu as pressentia há muito tempo, mesmo quando militando em outras searas mítico-metafísicas, mas, buscando saídas, fui dar à teologia da libertação inicialmente, e, mais recentemente, a Ricardo Gondim e cia. 
Agora, lendo esse post, quando você se referiu a "aqueles que se julgam 'progressistas'" dizendo que eles ensinam as mesmas doutrinas através das mesmas práticas políticas, então eu consegui entender porque tinha a sensação sempre, apesar do ar de renovação que encontrava, de estar trocando seis por meia dúzia. 
Dia desses ia me dirigindo a uma livraria no centro do Rio para comprar um exemplar do livro "Do terror de Isaac ao Abbá de Jesus", do teólogo espanhol Andrés Torres Queiruga, quando, no meio do caminho, me ocorreu que ele, não obstante dizer o contrário do que dizia a ortodoxia da Igreja Católica, ainda partia da mesma base epistemológica mítico-metafísica, e que seria mais ou menos a mesma decepção sua com o Lévinas... fui direto para o trabalho. 
Grande abraço!

2. Interessa-me a última parte, em que Luciano confessa ter deixado de comprar Queiruga.

3. Eu concordo com sua análise geral. Não há nenhuma novidade teológica nesses neoteólogos, admirados pela ala progressista da teologia. O regime discursivo é o mesmo que o de todas as Teologias - alguém se mete a falar de Deus, a dar conta dele, a dizer como ele é, vive, julga.

4. Há quem diga estar a fazer poesias - e prega em velhos púlpitos. Estranha poesia, essa. Lembra-me a dos hinos nacionais... Marcha soldado, cabeça de papel...

5. Nesse caso, Luciano, acho que você está certo: não vale a pena perder tempo com essas leituras. Melhor ler Epistemologia, Biologia, Literatura, Política. Esse tipo de Teologia - mistificação pura.

6. Todavia, há um grau de diferença entre essa Neoteologia e as Teologias verdadeiramente clássicas: há um constrangimento ético em seus discursos. No fundo - quem desmentirá? - o homem é, aí, tomado como critério, mas a fôrma é ainda a velha retórica de falar sobre Deus, como que de Deus. Mas, caso a ser estudado, a Ética já se transformou em critério para a validação da verdade, do divino.

7. Você não encontrará um neoteólogo que fale sobre Deus algo que venha a ferir a Declaração Universal dos Direitos do Homem - claro, só os ortodoxos, pintados de moderninhos, mas com cheiro de naftalina. Quanto aos neo(esquerdistas)teólogos, não vai. Um bom leitor já sabe onde chegarei com meus argumentos. E é aqui: onde a Ética humana tornou-se critério para a verdade de Deus, aí já não há nem mais Deus nem mais verdade. Deus, aí, é uma peça de retórica, uma coisa translúcida, sem conteúdo próprio, uma projeção mítica e feuerbachiana - grande Feuerbach!

8. Nessas teologias novas, Deus não existe de fato. Não é. É apenas um instrumento catalisador dos discursos humanos. E, então, eis a questão: porque referir-se a ele, e não, diretamente, aos valores em si, à Ética?

9. Acho que, primeiro, por vício de usar cachimbo - a boca fica torna. Segundo, porque se escreve para os pares e a audiência cristã. Tem-se de continuar a dizer as palavras mágicas, elas, que movem as registradoras, as engrenagens, abrem e fecham as portas.

10. Se Levinas e Queiruga afirmassem apenas o "valor" humano, seria perfeito. Mas, quando o fazem por meio do recurso a "Deus", fazem-se de meninos, e, a nós, de crianças. Não fica bem nem a eles nem a nós.


OSVALDO LUIZ RIBEIRO

2 comentários:

Anônimo disse...

A impressão que passa é que esses caras olham para o edifício metafísico-mitológico e constatam que algo ali está errado.
Chegados a essa conclusão fundamentam o erro na visão que os construtores daquele edifício têm de Deus, e, ato contínuo, imprimem a este outra visão para lançar as bases de outro edifício.
O problema é que, cavando lá e cá, a sapata e as colunas são feitas do mesmo material - mitos.

A sua leitura da moral e da ética a partir do aspecto natural do homem - em sua pertença à natureza - acrescido do que o diferencia desta, a consciência, me deu um insight bacana para algo que estou tentando desenvolver quando conseguir qualquer dia desses chegar ao Mestrado em Filosofia - Ética e Filosofia Política.
Espero que não se importe com a cola e que possamos trocar algumas impressões quando chegar a ora.

Obrigado pela resposta!

Anônimo disse...

Ah, e, sim, é verdade, há mesmo um constrangimento ético na fala da neoteologia.
Esse mesmo constrangimento, a partir da prática, foi o que me levou a eles, quando, militando nas hostes espíritas, desconfiava que aquele dar pão sem cessar para alcançar um estágio evolutivo espiritual não levaria aquela gente necessitava a lugar algum, como quando, já no meio evangélico, a ajuda aos "domésticos da fé" em dificuldades e os olhos presos ao céu esperando que se abrissem para sermos arrebatados também me faziam desconfiar que a indiferença em relação às demais pessoas a nossa volta em dificuldades não se coadunava com o amor cristão pregado.
Em tudo, o homem na sua condição humana é que estava sendo esquecido para que nossa ação fosse moralmente correta.
Abraços!

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