1. Aquilo que chamamos de fé é uma das coisas mais maravilhosas no ser humano. É a capacidade de maravilhar-se com algo que se subtrai aos domínios da razão, fazendo a pessoa imbuir-se de capacidade de sonhar e de resistir. Podemos chamar a isso também de transcendência. É um movimento que parte do humano, rompendo os limites da própria condição humana. Neste sentido, é encanto, é maravilhar-se, é um ter certeza das coisas que ainda não se vê.
2. Essa capacidade humana de transcender seu tempo e seu espaço, algo tão belo e profundo e polissêmico como a poesia, desde cedo passou por processos de institucionalização. Este processo é um passo (quase) necessário. Digo isso, porque a fé, partindo do interior do ser, se transforma em códigos de linguagem e aí passa a ser um fenômeno social ou coletivo. Por isso, a dinâmica da fé se insere na própria dinâmica social, coletiva, histórica. Na história, há os mais variados movimentos. Um deles é o de cooptação, que caminha de mãos dadas com a institucionalização. Neste momento ou neste processo, a fé, como expressão do sujeito, já se torna objeto de reflexão e sistematização, podendo bifurcar-se ou desdobrar-se em duas direções: manutenção ou reação/resistência. Em ambos, há a necessidade dos sujeitos articuladores do processo. Há os mitólogos. Há os teólogos. Sistematiza-se a experiência do sujeito da fé e converte-se o resultado em proposição social, objetivando o seguimento, a adesão. Corre-se e correu-se, neste compasso, o passo da ontologização do substrato da experiência. Nascia Deus. Ortodoxia e poder foram desdobramentos, nem sempre necessários, mas, em geral, sempre presentes.
3. Contudo, neste processo há espaço para um sempre novo deslumbramento, encantamento, enfim, para o maravilhar-se diante daquilo que toma o ser, daquilo que se torna figura na consciência. A experiência, coletivamente transformada, serve de novo como acesso ou motivo para a experiência.
4. A teologia enquanto área de reflexão crítica desdobra-se sobre estes multifacetados processos da história ou condição humana. Peroratio, enquanto oficina virtual, tem servido a este propósito. Especialmente o tem sido pela pena ágil e destra, como prolongamento de um pensador arguto e perspicaz, ainda sujeito às possibilidades do encanto. Refiro-me especialmente a Osvaldo Ribeiro, que tem alimentado este blog, levando-o a esta miríade de acessos. É uma riqueza haver esta oficina, que, como toda outra, não agrada a todos que a visitam, mas que certamente ajuda, irremediavelmente, no processo de auto reflexão. Aquilo que a teologia haverá de ser deve passar pelo crivo da crítica, sob risco de ser rede ilusória.
HAROLDO REIMER
Um comentário:
A CRÍTICA TB PODE SER ILUSÓRIA. SE OS MÉTODOS E TEORIAS QUE ORGANIZAM NOSSA CONSCIÊNCIA SÃO EFÊMEROS, TRANSITÓRIOS E PRISÕES CLASSIFICATÓRIAS, COMO CONFIAR EM ALGO CONSTRUÍDO COM COLUNAS, ATÉ FORTES, MAS EM TERRENO ARENOSO?
A CIÊNCIA TROUXE CRÍTICA, MÉTODOS, MODELOS TEÓRICOS, MAS ONDE ESTÁ SUA BASE? VOLTAMOS AO NADA INICIAL, ONDE O QUE NOS RESTA É A FÉ. E A ESCOLHA DE ONDE A DEPOSITAMOS.
CEZAR UCHÔA JÚNIOR
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